Financiamento

Fundos de investimento para o agronegócio podem captar R$ 1 bilhão em recursos

Projeto pretende permitir a criação de aplicações financeiras para custear os produtores rurais. Ideia é aumentar o dinheiro disponível e reduzir dependência do governo federal

Por Lucas Morais
Publicado em 02 de março de 2021 | 06:00
 
 
Soja será destaque da colheita de 2012/13, e café deve ter queda de 7% Foto: VALTER CAMPANATO/ABR

Mesmo com a pandemia do novo coronavírus, o agronegócio brasileiro registrou um crescimento de quase 20% no PIB no ano passado. Os dados, ainda preliminares, são da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). E para ampliar ainda mais as possibilidades de expansão, a aposta do governo federal é o Projeto de Lei 5.191/2020, que cria o Fundo de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro). A expectativa é que a proposta consiga captar cerca de R$ 1 bilhão em recursos ainda no primeiro semestre de funcionamento.

O texto-base da proposta já foi aprovado pelo Senado no último mês. Mas, antes de seguir para sanção do presidente Jair Bolsonaro, dois destaques devem ser votados pelos parlamentares – a expectativa é que as discussões aconteçam hoje. Segundo o projeto, o principal objetivo é fazer com que o setor agropecuário possa captar dinheiro no mercado de capitais, uma alternativa aos financiamentos tradicionais ou programas do governo – atualmente, um terço do crédito para o setor vem do Plano Safra.

Em troca de rendimentos, investidores nacionais e estrangeiros podem aplicar recursos em ativos ligados ao agronegócio ou até em imóveis rurais que pertencem aos fundos. Já produtores rurais vão contar com esses valores para investimentos. 

“Na medida em que evoluem os instrumentos de captação da atividade, reduz-se a pressão do setor agrícola sobre o governo federal, em termos de necessidade de crédito e subvenção ao custeio das safras”, justificou o relator do texto, senador Carlos Fávaro (PSD-MT).

Autor do projeto, o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP) ressaltou que o setor agropecuário vive um momento de dinamismo, ganho de produtividade e entrada em novos mercados. “O setor precisa de novas formas de financiamentos. Isso significa não só a busca por mais, mas por origens diferentes. Muitas vezes, o setor conviveu com a política de juros controlados, que embutiu recursos públicos para equalização, coisa que é muito difícil hoje com a crise fiscal do Estado e com a necessidade de esses recursos públicos serem direcionados para ajudar o pequeno agricultor e o agricultor familiar”, apontou.

O deputado paulista enfatizou também que os fundos também poderão ser usados por setores vinculados à agropecuária, como o de armazenamento e estocagem. 

As estruturas serão fiscalizadas pelo Banco Central e pela Comissão de Valores Mobiliários e devem ter, no mínimo, 50 cotistas.

Senador teme concentração de propriedades

Um dos pontos mais polêmicos e contestados pela oposição é a inclusão de imóveis localizados nas áreas rurais como aplicações do Fiagro. 
Para o líder do PT no Senado, Paulo Rocha (PA), a medida pode abrir o mercado nacional de terras para investidores internacionais, o que é limitado por outras leis. 

O petista alertou para o risco de aumentar ainda mas a concentração de propriedades. Por isso, um dos destaques que devem ser discutidos é o que retira esse trecho do projeto. 

Os senadores também vão debater outra emenda de destaque da senadora Rose de Freitas (MDB-ES), que reduz a tributação de rendimentos do fundo de 20% para 15%.

“O cenário que imaginamos é que daqui a um ano e meio teremos uma multiplicidade de fundos. Podemos ter um constituído para operar fazendas de produção de grãos, outro para um projeto de proteína animal”, explicou o deputado federal Arnaldo Jardim (Cidadania-SP).

“Essa legislação é um marco”, diz especialista

Para a coordenadora da Gerência Técnica da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Aline Veloso, a criação dos fundos é positiva e atende uma demanda histórica do setor. 

“Essa legislação é um marco para a possibilidade de atração de recursos para financiar as necessidades da cadeia produtiva do agro, atraindo investimentos externos ou nacionais”, afirmou.

A especialista lembra que a iniciativa já vem sendo discutida há algum tempo e melhora a oferta de crédito para o agronegócio. “Os mecanismos de financiamento já vinham sendo modificados para permitir ao produtor rural captar dinheiro, e agora a lei vem para atender as expectativas do setor. O projeto é uma alternativa possível, e por isso tem o apoio da Frente Parlamentar da Agropecuária”, disse.

Segundo a coordenadora, a proposta também pode reduzir a dependência do setor de políticas públicas, a exemplo do Plano Safra. 

"A partir do momento que tenhamos recursos do setor privado, tira a pressão das iniciativas governamentais. Há uma expectativa em torno disso, até pelas necessidades de adequação no Orçamento da União. Mas um não quer dizer que o outro deixará de existir, já que tem questões de segurança alimentar e abastecimento que precisam ser levadas em conta", acrescentou.

Já sobre a questão dos imóveis rurais que podem ser aplicados nos fundos para investidores estrangeiros, Veloso declarou que a entidade aguarda o fim da votação para se manifestar. "É um tema de atenção, mas vamos acompanhar como esse debate vai seguir e depois fazer um trabalho de divulgação das informações aos produtores rurais, para que possam participar e usar os recursos em suas demandas", finalizou.