Áurea Carolina

Áurea Carolina é deputada federal pelo PSOL-MG

Somos todos Sofia Feldman: a humanização dos nascimentos

Publicado em: Qui, 23/05/19 - 03h00
Desde a primeira edição, realizada em 2020, o projeto doou mais de 86 mil itens para o hospital Sofia Feldman | Foto: Leo Fontes - 18.6.15

Em mais uma ação da necropolítica, o Ministério da Saúde aboliu das políticas públicas o uso do termo “violência obstétrica”, demonstrando sua intenção de retroceder nos avanços que, nos últimos anos, a própria pasta vinha promovendo no campo da prevenção de violações de direitos de mulheres e bebês na gestação, no parto e no puerpério. A medida gerou fortes reações de entidades e grupos ligados à saúde e aos direitos das mulheres.

A realidade que o governo Bolsonaro pretende ocultar inclui constrangimentos de todas as ordens, assédios morais e sexuais, realização de procedimentos invasivos sem necessidade – incluindo uma verdadeira epidemia de cesarianas injustificadas – e até mutilação. Trata-se de uma realidade que mulheres de variados espectros políticos, credos, profissões e estratos sociais, muitas vindas dos campos da saúde e da assistência social, se uniram para combater nos chamados movimentos pela humanização do nascimento. O que elas buscam: um atendimento digno para as mulheres e seus bebês, com acolhimento e informação, respeito à fisiologia do nascimento e resgate da autonomia e do protagonismo das mulheres.

Parimos desde tempos imemoriais, nos recordam essas ativistas, e temos em nossa memória coletiva o conhecimento necessário para a condução do nascer. Ao contrário do que pregam seus detratores, os “movimentos pela humanização do nascimento” não se opõem à medicina, mas celebram avanços embasados em evidências científicas como instrumentos a serviço de nossa sabedoria ancestral, em uma ousada subversão hierárquica. E é isto que eles temem: a ousadia de mulheres autônomas e empoderadas que, amparadas por outras mulheres, denunciam violências e desbancam discursos dogmáticos de autoridade, redescobrindo a força individual e coletiva de gestar, parir e cuidar. É muito poder!

Belo Horizonte é um centro de debate e promoção da humanização do nascimento graças à experiência pioneira do Hospital Sofia Feldman, referência nacional e internacional tanto na assistência humanizada ao parto e ao nascimento quanto na atenção integral à saúde das mulheres e crianças recém-nascidas. O modelo de maternidade da instituição, que atende integralmente pelo SUS, foi construído a muitas mãos, em sistema de mutirão com a comunidade local. Quando ainda não integrava o SUS, o Sofia era mantido por doações e trabalho voluntário para atendimento da população do seu entorno. Atualmente, a maternidade é a maior do país em número de partos, com custo por unidade menor do que o de outras instituições que também atendem integralmente pelo SUS. Apesar de sua relevância, o Sofia atravessa uma crise de subfinanciamento sem precedentes, com déficits mensais que já chegaram à casa de R$ 1,5 milhão.

Por isso, indicamos o Sofia Feldman para receber mais de R$ 500 mil. O aporte faz parte da emenda de bancada disponibilizada aos parlamentares mineiros para incremento temporário do custeio dos serviços de assistência hospitalar e ambulatorial. Outros R$ 200 mil, atualmente bloqueados pelo Ministério da Saúde, ainda podem ser liberados à instituição até o final do ano.

Muito mais do que contribuir para mitigar o contexto de crise vivenciado pelo Sofia, o que buscamos com essa indicação é defender e reconhecer esse modelo de maternidade e os profissionais que fazem com que o hospital exista. Numa conjuntura nacional de ataque aos direitos e de subfinanciamento de políticas sociais, reiteramos, dessa forma, a importância de iniciativas que garantam o atendimento integral das gestantes, especialmente das mulheres negras e pobres.

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