General Felício

Marco Antônio Felício é General do Exército e PhD em ciência política e estratégia

Marco Antônio Felício

Escravos, curvem-se aos poderosos

Publicado em: Dom, 13/10/19 - 03h00

Até então, imaginava-se que o sanguinário ditador da Venezuela, Nicolás Maduro, cairia rapidamente apenas pelas ameaças e pressões diplomáticas e econômicas dos Estados Unidos, apoiados por um grupo de países latino-americanos, entre eles o fronteiriço Brasil.

Entretanto, tais pressões e ameaças foram neutralizadas por Maduro, que, diante de uma crítica situação política, econômica, social e militar, mostrou-se bastante esperto aproveitando a falta de unidade de seus oponentes e o receio de uma conflagração armada de vulto incluindo forças nuclearizadas.

Sua ação diplomática conseguiu reunir o apoio de Rússia, China, Coreia do Norte e também de Cuba e Irã – todos antagônicos aos EUA e controlando com mão de ferro a situação interna.

Há que se ressaltar que, após a década de 80, as Forças Armadas norte-americanas – bem como outras tantas – elegeram em seus planejamentos estratégicos a “incerteza” como a pior das ameaças em face de um mundo cada vez mais violento e nuclearizado. Prepararam-se para tal ameaça. Aqui, passivamente, dormiu-se em berço esplêndido, embalado em um pacifismo inexistente e na ausência de inimigos em nossas fronteiras, como se não existisse um outro mundo muito maior e com conflitos diversos, pleno de incertezas.

Infelizmente, no caso venezuelano, a nação brasileira renunciou à sua pretensa liderança no continente sul-americano pela falta de visão geoestratégica e geopolítica de todos os presidentes da malsinada “Nova República”.

Há que se destacarem os criminosos governos Collor, Fernando Henrique Cardoso, Lula e Dilma, que fizeram questão de dizer que não tínhamos inimigos e, até mesmo, que não havia necessidade de Forças Armadas. Collor paralisou o programa nuclear; FHC colocou “a pão e água” Exército, Marinha e Aeronáutica e assinou tratados que limitaram – e ainda limitam – o desenvolvimento de sistemas de armas de alta tecnologia para a defesa do país. Ele deixou o Brasil sem qualquer possibilidade estratégica de dissuasão frente às grandes potências predadoras, como ocorre no momento.

A gravidade do conflito é grande, o que fez o almirante norte-americano Craig Faller, comandante do US Southern Command (responsável pelo sul da América Latina), mostrar-se preocupado com a visita de Maduro a Kim Jong-un logo após uma viagem de delegação venezuelana para negociações. Maduro informou que, em breve, estará selada cooperação militar e econômica entre os países.

Afirmou o almirante Craig que existem na Venezuela centenas de mercenários russos, devidamente equipados e prontos para a luta armada em apoio a Maduro. Estão também em solo venezuelano aviões bombardeiros com capacidade nuclear e fragatas armadas com mísseis de cruzeiro – também nucleares. Confirmou que a guarda presidencial é cubana e que há milhares de cubanos em postos-chave por toda a Venezuela. Disse que, apesar de o presidente Donald Trump ter reconhecido Juan Guaidó como o legítimo mandatário, Maduro continua em seu posto apoiado por Rússia, Cuba, China, Irã e, agora, “parece” que pela Coreia do Norte.

Surpreendentemente – mostrando-se incoerente e diplomaticamente tentando diminuir a gravidade do conflito –, declarou que “Rússia, China e Irã estão presentes na Venezuela, trabalhando em defesa de seus interesses de maneira que, em longo prazo, colaborem para a estabilidade da região.” E prosseguiu: “A China tem o objetivo de espalhar sua influência econômica na America Latina e no mundo”.

Incoerente, porque os países citados e presentes nesse conflito vivem em contínuo antagonismo com os EUA, desenvolvendo forte poderio militar – inclusive o nuclear – e preparados para qualquer incerteza plena de violência. Respaldam suas respectivas diplomacias no poderio citado, como agora o fazem nas fronteiras do Brasil diante da ineficaz e degradante política nacional de soft power.

O almirante, ciente do intocável e enorme poder militar de seu país, arrematou que o futuro do globo depende da maneira como os países de grande poder, como os presentes nesse conflito, poderão viver competitivamente, respeitando a paz! Sem dúvida, fala o almirante em nome dos donos do mundo.

Que se curvem os escravos que, irresponsáveis com suas respectivas nações, não se preparam para um mundo violento e pleno de incertezas.

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