Iran Barbosa

Iran Barbosa é ex-deputado estadual e escreve às quartas-feiras em O Tempo

Partido Futebol Clube: quando os políticos perdem a coerência

Publicado em: Qua, 15/05/19 - 03h00

Cortes afetam pesquisas brasileiras. Assim o jornal “El País” noticiava o contingenciamento de R$ 9,6 bilhões que o governo federal determinava ao Ministério da Educação (MEC) em 27 de setembro de 2015. Foi um corte de impressionantes 75% nas verbas de custeio das faculdades. Dilma Rousseff era a presidente, e não faltaram, naquela época, eleitores para defendê-la. Afinal, havia um déficit orçamentário vigente de R$ 77 bilhões que precisava ser coberto. “Não se gasta mais do que se arrecada. É uma questão de responsabilidade”. 

Quase quatro anos depois, o jornal “Brasil de Fato” publicava uma chamada ironicamente similar: “Corte na educação ameaça 80% das pesquisas do país”. Os fatos, no entanto, não eram desiguais. Bolsonaro, por meio do ministro Weintraub, contingenciou R$ 2 bilhões das universidades federais, o equivalente a 30% das verbas de custeio. Os que batiam em Dilma agora defendem a austeridade fiscal, e os que antes defendiam os cortes agora lutam pela educação brasileira.

O que nenhum dos dois jornais (nem os colunistas de rede social) conseguiu explicar até agora é qual a relação direta entre o corte de verbas de custeio (literalmente, gastos com energia elétrica, água, telecomunicações e serviços de terceiros variados) e as pesquisas realizadas nas nossas faculdades. É como se, nesse debate ideológico, os fatos não fossem tão importantes assim.
A incoerência, antes reservada aos políticos de palanque, agora parece ter infectado uma população que prefere “mitar” e “lacrar” a defender com coerência a austeridade fiscal de um governo ou os gastos com educação.

Lula já falou sobre a importância da reforma da Previdência quando era presidente (fez até uma minireforma em seu mandato). Dilma também. Bolsonaro, inclusive, colocou pontos defendidos pela ex-presidente na PEC que enviou ao Congresso Nacional. Em resumo, todo mundo que se senta naquela cadeira sabe que não dá para poder governar o Brasil sem uma reforma.

É unanimidade tal qual o aquecimento global – outro fato que só não aceita quem tem interesses pessoais investidos.
A incoerência não existe só na esfera federal. Ela está por todos os lados. 

Confesso que esperei com certa ansiedade para ver como o deputado Bartô, do Novo, reagiria aos gastos com jatinho da administração estadual. Parece-me, no entanto, que o eleitor que era Tigrão com o prefeito Kalil virou Tchutchuca na Assembleia. 
Aliás, não me entendam errado: sempre disse, na minha vida, que a velocidade de deslocamento do chefe do Executivo pode ser crucial para economizar e até trazer novos recursos para uma administração. Não se governa um Estado do tamanho da França andando sete horas de carro até o Triângulo Mineiro. É uma posição que tenho a vida inteira. Jamais a mudaria por votos. O duro é ver um deputado (cujo único feito, na vida, foi brigar com o prefeito de Belo Horizonte num restaurante por causa de jatinho) desistir da sua principal bandeira. Espero que isso tenha acontecido por crescimento intelectual. Seria muito ruim se fosse por qualquer outro motivo. 

Mark Twain dizia que era mais fácil enganar uma pessoa do que convencê-la de que ela está sendo enganada. Por isso, fique atento à política. Não torça para partidos. Acima de tudo, lembre-se de que ser de direita ou de esquerda não significa abrir mão de ser racional. Afinal, um carro que só vira para a esquerda ou só para a direita nunca vai parar de dar voltas no mesmo lugar. 

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