Iran Barbosa

Uma estratégia maquiavélica

Minas tem o pior gasto em saúde dos últimos cinco anos

Por Da Redação
Publicado em 18 de setembro de 2019 | 03:01
 
 

“O homem esquece mais facilmente a morte do pai do que a perda do patrimônio”. Em pleno século XXI, o governo de Minas parece determinado a testar essa máxima de Nicolau Maquiavel, escrita em 1513.

Na saga para conseguir colocar os salários dos servidores estaduais em dia até o início do ano que vem, o Estado simplesmente decidiu ignorar completamente a obrigação constitucional de usar 15% do Orçamento em saúde e reduziu os gastos na área em mais de R$ 500 milhões em relação ao mesmo período de 2018. É o menor gasto em saúde dos últimos cinco anos.

Não deixa de ser estarrecedor pensar que, em 2014, quando Minas Gerais tinha um Orçamento de “apenas” R$ 51 bilhões (contra R$ 67 bilhões do mesmo período em 2019), foram investidos cerca de R$ 400 milhões a mais em saúde do que neste ano. Com um detalhe: em 2014, apenas 9,5% do Orçamento estadual tinha sido gasto com saúde – o que já era considerado pouco.

A aposta de se pagar em dia com o dinheiro da saúde vem de uma visão maquiavélica na qual se acredita que o eleitor sempre teve uma impressão ruim da saúde. Logo, seria incapaz de perceber (ou denunciar) a diferença entre um serviço de saúde ruim e outro péssimo.

Por outro lado, o ganho político em se pagar os salários em dia é enorme, pois o eleitor conseguiria ver facilmente a diferença entre um governo que não paga em dia e outro que paga.

Nesse meio-tempo, as mortes no Estado sobem assustadoramente – as causadas por dengue, por exemplo, dobraram em um ano. É o “genocídio anunciado”, que denunciei aqui há sete meses, agora se tornando realidade.

Existem várias formas de colocar os salários dos servidores em dia que, literalmente, exigiriam menos sacrifícios (humanos). No entanto, optou-se pela estratégia mais fácil (e mais danosa).

Entenda: 90% da receita do Estado é destinada a salários e aposentadorias. Então, Minas sempre teve como pagar os salários em dia. Este nunca foi o desafio. O desafio era (e continua a ser) como voltar a pagar salários em dia sem comprometer os serviços mais essenciais.

A situação atual da saúde em Minas é tão calamitosa que faltam itens básicos nos hospitais – de papel higiênico a esparadrapo. Situação que só não está pior porque a Prefeitura de Belo Horizonte mais que dobrou seus gastos em saúde para manter os hospitais da capital de portas abertas. Belo Horizonte, que antes atendia algo próximo de um terço das cidades de Minas em seus hospitais, agora abriga 68%. É o êxodo hospitalar.

O mais irônico disso tudo é que eleitoralmente o prefeito de Belo Horizonte talvez saia mais prejudicado do que o governador. Afinal, é possível que o eleitor da capital possa não ver e/ou reconhecer o esforço feito na área da saúde, pois a quantidade de pessoas que vêm do interior impede grandes saltos na qualidade dos serviços prestados na capital. É possível, portanto, que no futuro a população veja como herói quem manteve seu patrimônio, mas matou seu pai, deixando de dar valor a quem salvou inúmeros pais em Minas. Porém, isso quem dizia era Maquiavel. Eu prefiro achar que ele estava errado.