Gestão Anastasia

MP apura fraude no Hidroex 

Investigação do Estado aponta favorecimento a empresa de primo do ex-governador

Sáb, 30/04/16 - 03h00
Complexo. O hoje senador tucano Antonio Anastasia (centro) governou o Estado de Minas Gerais entre março de 2010 e abril de 2014 | Foto: Carlos Alberto/Imprensa MG – 2.2.2010

O Ministério Público de Minas Gerais instaurou inquérito civil para apurar irregularidades em obras públicas no município de Frutal, no Triângulo Mineiro, durante gestão do então governador Antonio Anastasia (PSDB), hoje senador e relator da Comissão Especial do Impeachment de Dilma Rousseff. A investigação, confirmada nesta sexta a O TEMPO, está sob responsabilidade do Grupo Especial de Promotores de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e segue em sigilo.

Reportagem da “Folha de S.Paulo” na edição desta sexta mostrou que uma auditoria realizada pela Controladoria Geral de Minas aponta corrupção, desvios e mau uso de dinheiro público na construção do complexo “Cidade das Águas”, centro de pesquisa e gestão em recursos hídricos instalado na cidade.

A controladoria auditou amostra de R$ 37,7 milhões da obra, 16% dos R$ 230 milhões do projeto. Dessa parte, os danos aos cofres públicos chegaram a R$ 18 milhões, 48% do investigado. As irregularidades incluem pagamentos indevidos a empresas por serviços não prestados ou em desacordo ao contratado, superfaturamento, não entrega de equipamentos, armazenagem e controle inadequado e restrição à competitividade de licitações.

Parte das irregularidades beneficiou a Construtora Waldemar Polizzi (CWP), que pertenceu a parentes de Anastasia até quatro meses antes de ele assumir o governo, em 2010.

Os relatórios ainda não são públicos, mas a Controladoria confirmou que, considerando especificamente a CWP, cujo objeto previa a construção dos prédios da biblioteca, do laboratório e dos alojamentos do Complexo UEMG – Instituto Hidroex, a conclusão foi de que houve dano ao erário no valor de R$ 9,8 milhões.

Em entrevista a O TEMPO, o controlador geral do Estado, Dany Andrey Secco, detalhou que a auditoria, iniciada em fevereiro de 2015, constatou que serviços como instalações elétricas e implantação de câmeras de segurança foram pagos, mas não realizados. Além disso, foi constatado que o processo licitatório para escolha da empresa responsável pela obra não teve a competitividade esperada.

“Para o pagamento ocorrer, tem que ter uma liquidação, que é um ateste na nota fiscal de que aquele serviço foi executado. O ateste foi dado, o serviço foi pago, e, quando a auditoria esteve lá, não havia sido executado. Como o serviço não foi prestado, nós entendemos que o pagamento foi irregular”, explicou Secco.

Waldemar Anastasia Polizzi, primo de Antonio Anastasia, afirmou à reportagem que desde 2009 não é mais proprietário da empresa e negou qualquer favorecimento pelo parentesco com o senador. “Não tenho nada a ver com isso. Depois da assinatura do contrato, fiquei um ou dois meses e não participei de nada, nem conheci a obra”, justificou. Polizzi negou ter conhecimento sobre o desvio de R$ 9,8 milhões e alegou que, após a venda, permaneceu na construtora por um ano como responsável técnico. A atual direção da empresa não foi encontrada.

A assessoria de Antonio Anastasia informou que o senador “jamais teve participação na empresa”, que “nunca sequer ouviu falar de suspeitas de irregularidades nesse projeto e não foi chamado pela Controladoria para falar sobre o complexo Cidade das Águas”. O senador defendeu que “quaisquer denúncias devam ser apuradas pelos órgãos competentes”.

Entenda. Concluído em outubro de 2015, o relatório da Controladoria foi encaminhado aos gestores responsáveis – Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior e Departamento de Obras Públicas (Deop) – para que as falhas fossem corrigidas e os danos reparados.

A previsão é que a Controladoria, de posse do retorno dos gestores, avalie se as medidas foram tomadas e conclua seu parecer em maio. “Como há um potencial dano ao erário, foram abertas três sindicâncias administrativas para verificar quem são os agentes públicos potenciais causadores do dano e três investigações preliminares para apuração de responsabilidade das empresas em face da lei anticorrupção, para avaliar seu envolvimento em atos lesivos à administração pública”, disse Secco.

Em construção

Andamento
. As obras tiveram início em 2010 e estavam paralisadas desde 2014, com prédios entre 80% e 90% concluídos. Parte foi retomada em setembro de 2015 e o restante em 2016.

Auditoria. A Controladoria ainda audita outros contratos do complexo. Segundo o controlador geral, o contrato da CWP caiu na amostra de verificação em função de seu valor (R$ 55 milhões inicialmente e R$ 69 milhões com os aditivos).

PSDB de Minas vê uso político do caso

Apesar das irregularidades no contrato com a CWP, o Estado retomou, no início do ano, com as mesmas empresas, todas as obras que estavam paralisadas no complexo “Cidade das Águas”, em Frutal.

Em nota, o PSDB de Minas disse que “causa surpresa e estranhamento a divulgação de apurações parciais e inconclusas” das irregularidades durante gestão de Antonio Anastasia (2010-2014), “exatamente na semana em que o senador assumiu a relatoria dos trabalhos da Comissão Especial”. O partido lamentou “o uso da estrutura de Estado com objetivo meramente político de causar constrangimento ao senador”, afirmando que, mesmo após identificar irregularidades, o governo manteve pagamentos à construtora.

A Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior informou que respondeu aos questionamentos da Controladoria e explicou que as obras foram retomadas, com adequações, porque o prejuízo com a paralisação seria ainda maior. Segundo a Secretaria, não há ilegalidade em retomar o processo com a mesma CWP, já que ainda não houve condenações contra a empresa.

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