Dois anos após assumir o governo, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) cobrou do Congresso Nacional a aprovação de uma lei que muda regras sobre punição a militares durante operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO). A medida foi uma promessa de campanha.
O Projeto de Lei 6.125/2019 foi enviado à Câmara dos Deputados com apoio do então ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro e dos principais generais que compõem o primeiro escalão do governo. No entanto, não avançou nada no Parlamento.
O texto prevê que os militares que estiveram atuando em situações extraordinárias – como, por exemplo, convocados pelos governadores quando as policiais estaduais não conseguem atuar ou manter a ordem –, tenham garantias jurídicas para evitar punições por seus atos. Nas situações de GLO passará a ser proibida a prisão em flagrante de militares e o uso da legítima defesa será ampliado.
Ao pedir prioridade para o projeto, Bolsonaro afirmou que a medida é fundamental para que a atuação das forças de segurança tenha garantias legais e o combate à violência possa avançar no país.
Os dois anos de governo Bolsonaro foram marcados por poucas convocações de GLOs em comparação com os governos anteriores. O motivo é a crítica que o presidente faz às punições aos militares em ação.
“Pretendo usar a GLO, se tiver que usar, com excludente de ilicitude. Quem assina o decreto de GLO é o presidente, que fica numa boa, e a tropa que se vire. Então, o que a gente pretende é colocar em votação para a gente ter paz para trabalhar”, afirmou Bolsonaro.
Desde que chegou à Câmara, o texto é criticado por deputados da oposição, que consideram a mudança uma “carta-branca” para a atuação de militares. “O artigo 23 do Código Penal já estabelece a legítima defesa e o estrito cumprimento do dever legal como excludentes de ilicitude, possibilidades suficientes para resguardar a ação daqueles que são obrigados a tomar medidas de força para repelir o crime. Mas o que se deseja com a ampliação é dar abrigo legal para os excessos cometidos por maus policiais”, avaliou o deputado Orlando Silva (PCdoB).
Para o deputado Cabo Junio Amaral (PSL), a medida será um avanço no combate à violência no Brasil e para garantir que os policiais possam fazer seu trabalho sem receio de serem punidos. O parlamentar afirma que a medida deveria ser estendida para a atuação de todas as forças de segurança, e não apenas para as situações de Garantia da Lei e da Ordem.
“As forças policiais estão cada vez mais intimidadas pela legislação, que vai no sentido de estimular o crime e condená-las por fazer a sua função”, diz Amaral.
O deputado afirma que na Câmara a maioria dos partidos defende o tema, que pode avançar rapidamente, mas que no Senado existem críticas às mudanças. “Que seja levado para votação. O policial precisa desse respaldo. Não estou falando do policial que faz bobagem fora da atividade ou que é criminoso – e esses existem –, mas do que vai para a rua para trabalhar e combater o crime”, finaliza.
Dado. Segundo o Fórum Brasileiro da Segurança Pública, em 2019, o número de mortes em ações policiais atingiu o ápice em termos de letalidade, com 6.357 mortes.
Especialista defende Força Nacional como alternativa
A ampliação do excludente de ilicitude e as mudanças na GLO podem ir na contramão do combate à violência no Brasil. O alerta é do coordenador do Centro de Estudos de Segurança Pública da PUC Minas, Luís Flávio Sapori, que defende como solução para as situações extremas em que as polícias estaduais perdem o controle, a utilização da Força Nacional de Segurança Pública.
“A GLO está prevista na Constituição. O uso das Forças Armadas em situações de retomar a ordem pública é muito comum. Ela é usada porque a Força Nacional, que deveria atuar nessas situações, não dá conta da demanda. A questão é: qual será a amplitude de poder por parte dos militares durante a utilização da GLO? Ampliar a exclusão de ilicitude em situações repressivas não me parece um bom caminho”, alerta o especialista.
“O Exército não é preparado para combater o crime. O ideal seria fortalecer a Força Nacional, que existe desde 2006. Quando se estruturar bem essa força, não precisaremos da GLO”, completa Sapori.