Reginaldo Lopes

Deputado federal pelo PT-MG

Reginaldo Lopes

Prejuízos concretos

Publicado em: Ter, 15/10/19 - 03h00

Os Estados Unidos não indicaram o Brasil para ingressar na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), e o fato virou até piada do programa humorístico “Zorra Total”. E não poderia ser diferente. Com Bolsonaro, inaugurou-se nas relações internacionais uma fase, baseada no amadorismo e na irresponsabilidade, que é chacota não só aqui, mas mundo afora.

O presidente brasileiro jogou no lixo séculos de construção de uma política externa soberana para assumir uma subserviência aos Estados Unidos que foi bem resumida no “I love you”, declarado ao encontrar Donald Trump na Assembleia da ONU.

A não indicação foi recebida com desalento pelo governo brasileiro, que acreditava na promessa de Trump de defender o Brasil. Se fizesse, seria apenas um primeiro passo, pois, para efetivar a incorporação, o país tem de estar de acordo com as regras cambiais, de movimento de capitais e de meio ambiente. Aí está um impeditivo, já que existe um comitê muito rígido na OCDE que trata de políticas ambientais. Nele, França e Alemanha devem apresentar restrição a um país que está colocando fogo na Amazônia e não respeita o Acordo do Clima de Paris.

Se para Bolsonaro a não indicação foi uma má notícia, para o Brasil foi o contrário. Não existe nenhuma vantagem em fazermos parte da OCDE, já que os benefícios genéricos e eventuais não compensam os prejuízos imediatos e concretos ao se perder o tratamento especial de país em desenvolvimento na Organização Mundial de Comércio (OMC). É graças a essa condição que podemos limitar as concessões tarifárias em manufaturas durante as negociações, aplicando porcentagens mais vantajosas que as das economias avançadas.

De acordo com as novas regras de ingresso na OCDE, assumidas por Bolsonaro, o país teria que abandonar o estatuto de economia em desenvolvimento e todas as vantagens que hoje nos possibilitam celebrar acordos, como os praticados no Mercosul e demais países latino-americanos. Ao abandonar esse estatuto, não poderíamos utilizar as normas aprovadas pela OMC para flexibilizar patentes de remédios, nem utilizar barreiras menores para importações de países em desenvolvimento.

Por tudo isso, sob os governos Lula, apesar de gozar de amplo apoio internacional, o Brasil não solicitou o ingresso na OCDE, mesmo sendo sondado pelo secretário geral da entidade. O presidente petista sabia a importância de manter os direitos que países em desenvolvimento detêm.

Outra notícia vinda dos EUA deve impactar nosso comércio exterior. O país fechou um acordo com a China para suspender os prometidos aumentos tarifários que seriam aplicados. Em troca, receberá algumas concessões chinesas, como medidas sobre propriedade intelectual, serviços financeiros e, principalmente, ampliação de compras agrícolas.

Os chineses negociaram a aquisição de US$ 50 bilhões em produtos como soja e carne suína, setores em que o Brasil é concorrente direto dos EUA. Mais uma vez, a política internacional do governo brasileiro vai colecionando prejuízos. Enquanto Bolsonaro faz juras de amor a Trump, os produtores brasileiros amargam retrocessos que devem implicar nossa balança comercial.

---

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo mineiro, profissional e de qualidade. Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar.

Siga O TEMPO no Facebook, no Twitter e no Instagram. Ajude a aumentar a nossa comunidade.