Abrangência

Regularização fundiária pode ter novas regras em todo o país

Projeto prevê a utilização de satélites para regularizar terras com até seis módulos fiscais. Se aprovado, texto vai tornar legais 480 mil terrenos, sendo 300 mil na Amazônia

Por Marcelo da Fonseca
Publicado em 12 de março de 2021 | 06:00
 
 
Desmatamento Amazônia Foto: Imazon/divulgação

As mudanças nas regras de regularização fundiária, que se tornaram dor de cabeça para o governo federal em 2019, retornam neste semestre para a pauta do Congresso Nacional. Incluído na lista de prioridades para 2021 elaborada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e entregue no mês passado ao Poder Legislativo, o Projeto de Lei 2.633/2020 estabelece novos critérios para a regularização de imóveis da União, incluindo assentamentos. A maioria das propriedades está na Amazônia Legal. 

O texto que tramita na Câmara dos Deputados tem origem no projeto de lei de conversão apresentado pelo deputado mineiro Zé Silva (Solidariedade), que foi o relator da controversa Medida Provisória 910/2019. O parlamentar garante que seu projeto fez várias alterações na MP apresentada no primeiro ano do governo Bolsonaro e que recebeu críticas de entidades ambientalistas nacionais e internacionais, além de gerar embates entre as bancadas do agronegócio e ambientalista. 

Caso o texto seja aprovado pelo Parlamento e sancionado pelo presidente, poderão ser regularizadas mais de 480 mil propriedades, sendo 300 mil na região amazônica e o restante em vários lugares no Brasil. As regras tratam de áreas ocupadas até julho de 2008 e de propriedades com até seis módulos fiscais (unidade que varia de acordo com os municípios e pode ir de 5 a 110 hectares). 

No PL 2.633/2020, o deputado Zé Silva estabeleceu a possibilidade de regularização fundiária com dispensa de vistoria prévia pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) apenas para as áreas de até seis módulos fiscais, ante os 15 previstos na MP 910.

“Esse projeto vai permitir regularizar mais de 300 mil propriedades na região amazônica e 185 mil fora da Amazônia Legal. Ele tem várias diferenças da MP 910, isso precisa ficar claro. A MP só tratava da Amazônia Legal, meu projeto é para o país inteiro. Também estabelece um marco temporal. Porque a mensagem que o Brasil sempre passou é que você pode ocupar terras públicas, que o Congresso fará uma nova lei e o governo terá que cumprir para te regularizar. Ou seja, o Estado acabava incentivando a ocupação. Então, temos que implementar uma trava”, explica Zé Silva. 

Outra medida incluída é a possibilidade do uso de sensoriamento remoto para vistoria das áreas de até seis módulos fiscais. O deputado alertou para a redução no número de funcionários do Incra que trabalham na fiscalização e vistoria das propriedades, o que torna o processo presencial mais demorado.

De acordo com dados do Incra incluídos no projeto, o sensoriamento remoto poderá atender 92% das propriedades que precisam ser regularizadas. Essas terras ocupam 47% do território total que poderá ser regularizado. 

Já os 8% restantes, de imóveis com mais de seis módulos fiscais, representam 53% da terra a ser regularizada, e isso só poderá ser feito com vistoria local. 

MP criou polêmica sobre benefício

Antes de completar um ano de governo, o presidente Jair Bolsonaro editou a Medida Provisória (MP) 910, com novas regras para a regulamentação fundiária. 

A medida foi celebrada pela bancada ruralista no Congresso, mas, em abril do ano passado, recebeu críticas de várias ONGs nacionais e internacionais. Um documento assinado por mais de 50 entidades apontou a “discordância total” sobre a votação da MP. 

“Consideramos inaceitável que uma matéria tão complexa e polêmica seja objeto de decisão a partir de uma medida provisória”, diziam as entidades na carta. “Ao contrário do que se pretende aparentar, a MP cria procedimento simplificado, declaratório e sem vistoria para ocupantes de grandes áreas públicas. Em linhas gerais, estende a grileiros e grandes invasores de terras os mesmos benefícios que deveriam ser ofertados única e exclusivamente a pequenos proprietários rurais”, apontava trecho da carta. 

Já entidades de produtores rurais, como a Associação dos Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja) e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA) pressionaram pela aprovação da MP. “A medida beneficiará 1 milhão de famílias, que possuem, em sua maioria, pequenas e médias propriedades rurais. Muitas delas aguardam o título de suas terras há 40 anos”, ressaltou nota da Aprosoja.