Política em Análise

A candidatura de Bolsonaro

Comando da máquina, base sólida e palanques definidos ajudam, mas rejeição alta, discurso de confronto e projeto limitado atrapalham o presidente

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 04 de agosto de 2022 | 11:01
 
 

Na série que analisa trunfos e desafios de cada uma das candidaturas à Presidência da República, hoje é dia de falar da chapa do atual chefe do Executivo e candidato à reeleição, Jair Bolsonaro (PL). Em sua busca por mais quatro anos de mandato, ele tem a favor o controle da máquina pública, uma base forte, disposta a apoiá-lo incondicionalmente, e uma aliança relevante com bons palanques regionais. Como desafios, uma rejeição alta, fruto de um governo controverso, uma pauta negativa nos embates com o TSE e um projeto ideológico limitado para atingir o eleitor médio.

É inegável que o fato de ter o controle do governo e também da pauta da Câmara - nas mãos do aliado Arthur Lira - permite ao presidente ajustar os humores no país a um cenário mais favorável. O aumento do Auxílio Brasil, a criação do voucher caminhoneiro e do auxílio a taxistas e a elevação do valor do vale-gás são exemplos nítidos do que a máquina é capaz de fazer. As pesquisas começam a demonstrar melhoria ainda antes do pagamento, com a contribuição de outra medida de impacto: a redução forçada do preço dos combustíveis. Embora a queda tenha se dado com uma mordida nos cofres estaduais, o fato é que a batalha foi encampada pelo presidente que, agora, tende a colher dividendos dessa redução temporária. Com o cheque em branco dado pelo Congresso com a criação de um estado de emergência, o que mais Bolsonaro pode fazer até lá para melhorar o ambiente econômico e fortalecer sua candidatura?

Outro ativo importante do presidente é ter uma base eleitoral forte e coesa, disposta a defendê-lo até nos piores momentos. As pesquisas mostram que Bolsonaro tem um piso de votos na casa de 25% a 30% que não cede e que torna improvável que um outro candidato o tire do segundo turno. E, mais que isso, é uma base mobilizada, disposta a ir para rua quando ele conclama, tal como veremos novamente no 7 de Setembro.

Bolsonaro tem também uma aliança relevante com partidos do centrão e manejou melhor os palanques regionais. A definição se deu rapidamente na maioria dos estados e, mesmo onde há conflito, a fidelidade ao presidente fala mais alto. Nos maiores colégios eleitorais, o presidente tem um candidato competitivo em São Paulo, o apoio do governador do Rio de Janeiro e uma aliança com Romeu Zema que, mesmo que não seja formal no primeiro turno, se dará inevitavelmente no segundo, quando o chefe do Executivo mineiro espera inclusive já estar eleito.

Mas os desafios, naturalmente, são grandes, e o resultado das pesquisas de intenções de voto mostram isso muito bem. Bolsonaro é fortemente rejeitado após fazer um governo controverso e cheio de polêmicas em diversas áreas. É duramente criticado na área ambiental, enfrenta períodos de inflação nas alturas, crescimento tímido e traz consigo a marca de uma gestão muito criticada na pandemia. O presidente será sempre lembrado por ter minimizado a doença, incentivado aglomerações, ridicularizado e feito campanha contra a vacina - só comprada depois de muita pressão da sociedade e de governadores - e de não ter sido empático com aqueles que perderam antes ou têm sequelas até hoje.

Também joga contra o presidente o discurso que ele próprio construiu para manter a base e buscar uma saída em caso de derrota, atacando instituições do Judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal (STF) e o Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Esse clima de animosidade afasta o eleitor médio, que morre de medo das consequências que isso pode ter para o país, sobretudo com o presidente sinalizando nas entrelinhas que pode de alguma forma impedir as eleições ou aplicar um golpe para continuar no poder. E também pode afastar seus próprios eleitores mais fiéis das urnas. Afinal, se o próprio presidente está apontando haver fraude e dizendo que os votos bolsonaristas podem não ser considerados nas urnas eletrônicas, por qual motivo esse eleitor iria lá votar? Nesse ponto, Bolsonaro joga contra sua própria reeleição.

Por fim, ainda sobre essa dificuldade de atrair o eleitor médio, o presidente até agora não apresentou um projeto de união do país, um tema que gere pleno consenso social e que possa contribuir para reforçar o apoio ao seu nome. Enquanto o principal adversário, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), surfa na pauta da defesa da democracia encampada por setores da sociedade civil organizada, Bolsonaro prega para convertidos com uma pauta ideológica e ‘anticomunista’, o que não tem o menor apelo fora da bolha da discussão política. Se o piso do presidente é sólido, enquanto seu projeto for limitado a esse ponto, o teto também vai ser.