Ricardo Corrêa

Editor de Política de O TEMPO e escreve neste espaço diariamente

Sinais de fraqueza

Publicado em: Sáb, 18/05/19 - 03h00

Bastam algumas gotas de sangue na água para que um tubarão, a quilômetros de distância, sinta o cheiro e perceba a fragilidade de uma presa em um enorme oceano. Por isso, é inusual que um governante tome a iniciativa de demonstrar para todos que enfrenta uma situação difícil. Quando o faz, denota certo desespero.

Nos últimos dias, Jair Bolsonaro e seus filhos foram os maiores promotores da fragilidade do governo. Um dos rebentos, o vereador carioca Carlos, apontou que o que estava por vir poderia derrubar o capitão. Outro, Eduardo, disse que tem ouvido das pessoas que estão rezando por eles. Ontem, o próprio presidente compartilhou um texto dizendo que o país é “ingovernável”. Esse tipo de postura tem consequências.

Foi exatamente o que fez Dilma Rousseff (PT), nos primeiros sinais de agravamento da crise com o Congresso, em 2015. Foi ela quem colocou o assunto “impeachment” na mídia. Também se deu assim com Fernando Collor, em 1992, quando pediu que as pessoas saíssem às ruas de verde e amarelo para defender as ameaças contra o seu governo. Nos dois casos anteriores, vimos no que deu.

Não existe vácuo de poder, e há sempre muito sonho de tê-lo nas mãos. No Congresso, quem estava em dúvida se embarcava ou não na canoa do governo começa a dar um passo para trás. O centrão, que extorquiu o Executivo por cargos, agora já fala em esnobar espaços que forem oferecidos. Se não querem cargos com Bolsonaro é por acharem que não vale a pena entrar nessa agora. Podem já estar de olho em uma alternativa. Isso é perigoso para o governo.

Paralelamente a isso, muita gente no mercado financeiro que fechou com Bolsonaro o fez por acreditar que ele seria um indutor das reformas promovidas por seu ministro da Fazenda. O comando da Câmara, nas mãos de Rodrigo Maia, quer mostrar que não é preciso Bolsonaro para isso. Ao defender textos da reforma da Previdência de Temer e da reforma tributária construída na Casa, buscam enfraquecer ainda mais o presidente.

Em Brasília, é quase um consenso na Câmara dos Deputados que um novo impeachment seria um passo trágico para o país. Ninguém quer um solavanco desse tamanho em um período tão curto. Foi o que ajudou a segurar a barra do ex-presidente Michel Temer, que, mesmo bombardeado por denúncias, foi mantido no cargo com o apoio do Congresso. Mas agora, com o próprio presidente admitindo suas dificuldades, parlamentares e outras autoridades andam discutindo o que fazer.

Já disse aqui, nesta coluna, que uma alternativa aventada por muitos nos bastidores é tirar poder do presidente. Isso pode se dar de maneira informal, como tem sido feito, com o Congresso tomando as rédeas da condução do que é prioritário ou não para o país, ou pode se dar formalmente, com a discussão de uma proposta de semipresidencialismo. O tema é debatido de forma séria.

O pior que pode acontecer é nada ser feito. Uma fonte deste colunista nas Forças Armadas mostrava preocupação com o risco de as coisas piorarem. Questionado sobre a crise permanente vivida pelo país nos últimos anos, o oficial temeu pelo pior: “Risco é sairmos dessa crise entrando em uma maior ainda”, reconheceu.

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