Há 20 dias, Tereza*, 27 anos, saiu de casa, no bairro Laranjeiras, apenas com a roupa do corpo. Após discutir com o marido porque o café estaria sem açúcar, ela foi agredida com socos e chutes e decidiu dar um basta na relação. Sem lugar para se abrigar, ela decidiu ir para a casa da avó, em Contagem, na região metropolitana de BH. “Essa foi a segunda vez que ele me bateu. Da primeira, no fim do ano passado, estava alcoolizado e acreditei na promessa de que isso nunca mais fosse acontecer. Mas, nas primeiras semanas do isolamento social, ele começou a ficar muito agressivo por coisas pequenas”, revelou.
Assim como Tereza, milhares de outras mulheres no Brasil e no mundo, estão ainda mais vulneráveis nesse momento de pandemia, uma vez que, com o isolamento social, a convivência com seus potenciais agressores está ainda mais em evidência.
Em Betim, dados da Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp) apontam que, de janeiro a março deste ano, 720 denúncias de violência doméstica foram registradas, o que representa um aumento de 10% em relação à 2019, quando, no mesmo período, foram registradas 653 denúncias.
De acordo com o órgão, ainda não foi possível realizar uma análise específica quanto ao período de quarentena, uma vez que será necessário avaliar os dados do mês de abril.
Porém, no início deste mês, a Organização das Nações Unidas (ONU) pediu medidas para combater o aumento global da violência doméstica dirigida a mulheres e meninas, que está sendo registrado em meio à quarentena imposta pelos governos.
Idealizado pela Secretaria de Estado de Justiça e Segurança Pública de Minas Gerais (Sejusp-MG), o aplicativo MG Mulher foi criado para dar apoio a mulheres em situação de vulnerabilidade e já disponível para download gratuito.
Embora tenha sido lançada em março, antes do isolamento social, a plataforma é uma grande aliada das vítimas de violência neste momento, uma vez que permite que as mulheres façam denúncias e peçam ajuda sem precisar sair de casa e se expor.
Além disso, o app disponibiliza os endereços e telefones mais próximos de órgãos que podem auxiliá-la em caso de emergência, como unidades da Polícia Militar, delegacias da Polícia Civil e centros de prevenção à criminalidade.
A vítima também pode criar uma rede colaborativa com contatos de pessoas confiáveis para serem acionadas de forma rápida, via SMS. As mulheres também podem acionar a Polícia Civil pelos telefones 197 e disque 180, caso sintam que estão em situação de perigo.
(*Nome fictício)
Mulheres ficam ainda mais expostas
De acordo com a delegada responsável pela Delegacia Especializada de Atendimento a Mulher de Betim, Ariadne Elloise Coelho, embora não existam dados que possam comprovar um aumento nos casos na cidade durante a pandemia da Covid-19, é preciso buscar maneiras para proteger as vítimas, especialmente neste momento. “O distanciamento social pode sim intensificar esses casos, uma vez que os vínculos já costumam ser mais frágeis e essas mulheres estão ainda mais distantes de familiares e amigos, que poderiam oferecer algum suporte”, pontuou.
Ainda segundo a delegada, um estudo publicado recente confirma que o consumo de bebidas alcoólicas aumentou durante o isolamento social – o que pode ser considerado um fator de risco a mais. “Embora a gente saiba que a violência contra mulher é decorrente do machismo estrutural, é fato que o consumo de álcool e de outras drogas potencializa essas ações”, pontuou.