Acílio Lara Resende

Estado de direito

Isolamento e democracia


Publicado em 23 de abril de 2020 | 03:00
 
 
 
normal

Desde ontem, por decreto do prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil, tornou-se “obrigatório o uso de máscaras ou cobertura sobre o nariz e a boca em todos os espaços públicos, equipamentos de transporte coletivo, estabelecimentos comerciais, industriais e de serviços”. Outras regras complementam o decreto. O que o prefeito deseja é tornar BH a campeã da flexibilização do isolamento social. Alvíssaras, pois, é o que tenho a dizer aos que não têm nem juízo, nem consciência.

Como ando, de fato, apavorado (ou bem mais do que isso?) com o que se passa no país e no mundo, mas também por ser disciplinado e obediente às regras de convivência social, acolhi sem discussão a decisão municipal. Continuo fazendo o que já vinha fazendo há mais de um mês – o uso permanente (e desconfortável) da máscara, que ajuda no combate ao vírus.

Além dessa preocupação, que às vezes me consome horas de reflexão, ando mais preocupado ainda com o que tem feito o presidente em inúmeras ocasiões: em vez de procurar apaziguar os brasileiros, “põe fogo” contra as regras postas em prática pelo seu dedicado ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta – e que, certamente, não serão, substancialmente, alteradas pelo seu substituto.

No discurso que fez quando demitiu o ministro, que já vinha sendo fritado e conquistado a aprovação de 76% da população, Bolsonaro demonstrou que não tem conseguido controlar a tensão natural decorrente do exercício do cargo para o qual foi eleito. Sai à rua sem máscara e cumprimenta sua dileta grei sempre disposta a aplaudir o que diz e faz, na suposição de que o “mito” veio para salvar o Brasil…

Na semana passada, todavia, o presidente ultrapassou todos os limites admissíveis numa República democrática. Isso se deu ao desafiar, em discurso, de uma caminhonete, em frente ao quartel general do Exército, como se estivesse em período eleitoral, o Estado de direito conquistado há mais de 30 anos. Lá estavam manifestantes que pediam intervenção militar e fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal (STF) e, de lambuja, ainda gritavam a favor da reedição do AI-5.

O presidente, ao comparecer à manifestação que pregava o fim do atual regime e, na realidade, o início de uma ditadura, e mesmo que tenha depois tentado explicar que é defensor intransigente da democracia, obteve unanimidade entre os que prezam a liberdade: vários ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), parlamentares e governadores de Estados repudiaram a presença do presidente ao ato ocorrido em Brasília, que foi transmitido em suas próprias redes sociais.

Minha geração, leitor, sente engulhos ao ouvir falar em AI-5. Somente a democracia será capaz de construir o futuro do Brasil.

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!