Opinião

Maurino Araujo

Minas e a cultura perderam um mestre

Por Carlos Perktold*
Publicado em 07 de agosto de 2020 | 03:00
 
 
 
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Faleceu de leucemia em Belo Horizonte, no dia 30 de julho, aos 77 anos, o escultor e artista Maurino Araujo. Com o recolhimento de todos nesta época tão difícil, seu sepultamento foi privativo da família. Merecia uma multidão ao seu lado se tratássemos melhor nossos filhos ilustres e talentosos.

Nascido de família pobre e humilde viveu experiências amargas ao longo de uma vida dura à procura de sobrevivência até encontrar o caminho da escultura. De agricultor de subsistência familiar a servente de pedreiro e escultor de peças de barro e de madeira, ele fez de tudo. E que esculturas!

Começou a brilhar a partir da década de 1970, quando começou a esculpir objetos sacros, santos, Cristo e uma infinidade de imagens nas quais o sentimento dos seus personagens trazia em cada peça o registro de sua autobiografia, que ele julgava ser da própria humanidade, em especial das pessoas que vivem e viveram na sua mesma estratificação social. Seu domínio sobre os formões era tão grande que com três ou quatro cortes profundos na madeira, rápidos e seguros, fazia magicamente um rosto de um personagem cheio de emoções.

Maurino era conhecido como um artista barroco e expressionista ao mesmo tempo, designação que pode estranhar os conhecedores dos dois estilos. Imagino que isso seja privilégio de escultores mineiros que herdam toda a força e beleza do nosso barroco e o adiciona ao expressionismo do século XX.

Jovem ainda e vivendo alguns anos em seminário de São João del Rey, Maurino descobriu as esculturas de Aleijadinho, peças que o deixaram encantado. A partir daí parecia reviver com suas próprias obras o século XVIII em pleno século XX e XXI, criando peças que não tinham a riqueza de detalhes do velho mestre maior, mas cujos sentimentos estavam estampados para qualquer neófito em arte, tanto quanto daquele mestre de Vila Rica. Imagino que, se Antônio Francisco Lisboa vivesse nos dias de hoje, não somente o aplaudiria como o transformaria no seu discípulo favorito tão grandes eram seu talento, garra e determinação no que fazia.

Ele passava pelas ruas da cidade sem ser reconhecido pelo grande público, vinha a pé de longe ao centro da cidade, dançando “I dance, man, I dance”, dizia ele para este seu admirador. Quem o visse nessas ocasiões, daria um diagnóstico psicopatológico, mas era apenas uma forma de viver a vida e se exercitar. Durou pouco seu período de dança. Tragado pela doença, seus últimos meses foram de recolhimento e poucas visitas. Enterramos um gênio criador, e pouquíssimas pessoas perceberam.

Carlos Perktold é integrante da e integrante da Associação Brasileira de Críticos de Arte (ABCA) e Associação Internacional de Críticos de Arte (AICA)

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