Opinião

Mulheres e a várzea

Resistência na integração ao futebol

Por Fábio Cesar Marcelino
Publicado em 29 de fevereiro de 2020 | 03:00
 
 
 
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O futebol de várzea é uma prática essencialmente periférica em Belo Horizonte. Infelizmente, as periferias das grandes cidades são representadas como um espaço de carência e violência. Pressupõe-se que a chance de um árbitro ser pressionado e até ser vítima de agressão é maior em campo de várzea do que em outros lugares. Isso não é verdade. A violência permeia as nossas relações e, portanto, está em todo lugar.

Tive a alegria de presenciar, pela primeira vez, um jogo de futebol feminino. O time do Prointer, do bairro Santa Lúcia, recebeu a equipe do Santa Tereza, do bairro do mesmo nome. Além das jogadoras em campo, grande parte da torcida era do público feminino, bem como o trio de arbitragem.

Tive a oportunidade de conversar com as árbitras e elas me contaram sobre as dificuldades da profissão, pois o futebol, independentemente de ser amador ou profissional, é tido como um espaço exclusivo de homens, mesmo que as mulheres também estejam presentes.

Estar em um campo de futebol para uma mulher é um ato de resistência. Mas, segundo elas, o amor pelo futebol e o objetivo de trabalhar em partidas profissionais fazem com que todas as dificuldades sejam superadas.

Um dos relatos que mais me chocaram foi o de que uma delas foi agredida por um homem em uma partida de várzea. Fiquei perplexo. Elas me explicaram que também atuam em partidas de campeonatos masculinos.

O quadro de arbitragem da Federação Mineira de Futebol tem cerca de 375 árbitros, sendo 38 mulheres. A realização do sonho de apitar o profissional requer experiência em competições em várzea.

Um dia, resolvi descobrir um jogo em que haveria uma árbitra assistente que estaria em um trio composto por dois homens. Nesse dia percebi como é difícil para uma mulher estar presente em uma partida de futebol de várzea envolvendo times masculinos. Ouvi muitas coisas que me deram vergonha de ser homem.

Depois da partida, perguntei como era lidar com tudo aquilo. Ela disse que valia a pena, pois está em busca da realização dos sonhos e os objetivos que tem com a arbitragem. Indaguei como os pais, o parceiro e os amigos lidavam com essa opção de trabalho. Ela respondeu que todos apoiavam e que seu namorado, também árbitro, é um de seus maiores incentivadores.
Mas, ainda assim, para mim, foi muito impactante.

Depois disso, passei a acompanhar jogos de várzea e presenciei outras mulheres árbitras que ficavam constrangidas com o mesmo tratamento hostil. Mas elas seguem firme dentro de um propósito estabelecido em suas vidas. A resiliência e a superação fazem parte da carreira dos árbitros, e essas mulheres são exemplos de força e coragem.

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