Opinião

Peculiaridades do Brasil

Suas influências no comportamento da pandemia

Por Fillipe Loures (*)
Publicado em 21 de maio de 2020 | 03:00
 
 
 
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O Brasil é um país singular, se comparado às demais nações do planeta. Vários fatores contribuem para essa peculiaridade: dos geográficos aos culturais, dos demográficos aos econômicos.

Começando pelo clima, muito tem se falado que o calor pode reduzir a transmissão do vírus, o que ainda não foi completamente comprovado. A evolução da pandemia em estados como Ceará e Amazonas, sabidamente marcados por clima quente na maior parte do ano, nos mostra que a disseminação do vírus pode não respeitar a suposta proteção conferida por elevadas temperaturas. Ademais, estamos nos aproximando do inverno, época de maior incidência de infecções respiratórias, o que pode dificultar a diferenciação entre casos de Covid-19 e outras doenças.

O território brasileiro possui dimensões continentais, sendo o 5° maior país do mundo, com a 6ª maior população. Já ao analisar a densidade populacional, o Brasil encontra-se nas últimas posições. Porém, apesar de ter uma proporção relativamente baixa de pessoas por território, grande parte da população encontra-se concentrada em alguns centros urbanos, como São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Brasília, Fortaleza e Belo Horizonte.

Se por um lado estamos relativamente protegidos contra uma rápida disseminação do coronavírus, em razão da distância entre as cidades, por outro observamos o risco de uma forte escalada no número de casos nos grandes centros urbanos, semelhante ao que foi observado na Itália e em Nova York, por exemplo.

Outro fator importante a se observar é a constituição da população por faixa etária. O Brasil encontra-se em transição demográfica, com aumento do percentual de idosos em todas as regiões do país. Sabendo que a população idosa é a mais vulnerável às formas graves de Covid-19, poderemos nos deparar com um cenário de muitas internações hospitalares com elevada taxa de permanência em enfermaria e CTI. Porém, o percentual de idosos na população brasileira é significantemente menor que a de países que sofreram com alto número de óbitos pela doença, como Itália e Espanha.

Do ponto de vista social e econômico, o Brasil é considerado o 7° país mais desigual do mundo, atrás apenas de nações africanas, o que quer dizer que uma pequena parcela da população detém grande parte dos recursos econômicos disponíveis. Isso pode se refletir em distorções de políticas públicas de combate à pandemia, resultando em decisões que privilegiam interesses econômicos de poucos em detrimento da necessidade de muitos.

Além disso, o elevado número de pessoas vivendo em lares diminutos, aglomerados e pouco ventilados contribui para que a disseminação do vírus ocorra de forma mais rápida nessa população, que é justamente a que tem mais dificuldade em acessar os serviços de saúde.

Diante de fatores tanto contrários quanto favoráveis, a evolução da pandemia no Brasil é uma incógnita. A melhor solução continua sendo o isolamento social e as práticas de prevenção; assim conseguimos anular os fatores contrários e potencializar os favoráveis, caminhando rumo a um cenário de menor circulação do vírus, evitando o temido colapso do sistema de saúde.

(*) Fillipe Loures é médico de família e comunidades

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