Eu sempre disse que teria um segundo filho para dar um irmão ao João. Não que eu não quisesse ter mais filhos, mas me dava arrepio só de pensar no processo de gravidez, parto (após sofrer violência obstétrica) e pós-parto. Então, era como se eu estivesse fazendo um ‘sacrifício’ pelo meu filho. Se ele tivesse um irmão, estaria, teoricamente, mais protegido no futuro caso eu ou o pai lhe faltasse, ele teria um ‘companheiro’ para a vida.
Mas será que meu filho, a parte interessada em questão, gostaria de ter um irmão? Ele nunca tinha pedido (ok, mas isso não significa que não). Será que estava preparado para, de repente, ter que dividir tudo com outra pessoa, principalmente a atenção dos pais? Sem respostas para nada disso, engravidei. E, para a nossa surpresa, vieram dois bebês. Se o primogênito geralmente enfrenta uma crise de ciúme quando nasce um irmão, imagine quando nascem gêmeos.
Não foi fácil. A família tenta amenizar de todas as formas. Vem da maternidade com brinquedo (no meu caso, dois brinquedos) e diz que foram os irmãos que trouxeram. Põe o filho mais velho para ajudar em tudo para ele se sentir útil, importante. Tenta brincar, dar carinho, atenção. Mas a casa vira uma bagunça, e nosso emocional, então, mais ainda.
Quantas vezes João resolveu cantar alto bem na hora que os irmãos tinham acabado de dormir. Completamente exaustos como estávamos, nem uma monja budista teria paciência. Quantas vezes pediu para brincar, e eu não podia porque estava com bebê no colo. Quantas vezes acordou de madrugada assustado porque o pai e a mãe estavam ninando os irmãos, e não ao seu lado.
Pelo menos ele nunca disse que queria matar os irmãos (nem tentou fazer isso, graças a Deus) - como umas histórias que já me contaram. Acho, inclusive, que meu filho está dando show de amor e superação. Mas é preciso reconhecer que há uma batalha diária acontecendo dentro da gente e que, nesse processo, a gente ganha e perde um monte de coisa. E as perdas são legítimas.
João perdeu seu posto de filho único, sua zona de conforto, seus passeios matinais com a mamãe (parei no meio da gravidez e ainda não consegui retomar), suas noites de idas à tia com o papai. Perdeu o olhar sempre atento quando precisava e até quando não precisava; a atenção de muitas visitas. Perdeu o controle algumas vezes, gritou, chorou, se refez.
É uma ruptura mesmo entre o antes e o depois da chegada do irmão, e o que se vivia antes não volta mais. Temos que nos reinventar como mãe, como pai, e o primogênito, como filho. Um parto literalmente para todos. O nascimento de uma ‘nova’ família..
É claro que os ganhos são incontáveis também (e eu escreveria um livro sobre eles), especialmente pela oportunidade de crescer junto e de se conectar a alguém por um laço indissolúvel. Mas acredito que não devemos subestimar os sentimentos e a dificuldade de uma criança ao lidar com a chegada do irmão (ou dos irmãos) e com a permanência dele na vida dela. Se, para nós, mães, pais, o nascimento de um bebê provoca um turbilhão de emoções que nos transforma. Pense para os pequenos.
E na sua família, como foi?
* Jornalista, redatora dos jornais O Tempo e Super Notícia, mãe do João e dos gêmeos Raul e Gael e autora do perfil @joaoeosgemeos