Bem-vindo a vida

O buraco negro das relações afetivas

Redação O Tempo


Publicado em 24 de agosto de 2014 | 03:00
 
 
 
normal

Que me perdoem os bem amados e as famílias acolhedoras, felizes e entrosadas. Que me desculpem os educadores idolatrados por alunos ou ainda os casais enamorados. Pois, hoje, esta coluna tem uma temática que não os contempla. 
 
Convoco, então, os carentes, os insatisfeitos com seu estilo de vida, os mal amados, os pais frustrados com seus filhos e a prole que vive reclamando de seus genitores. 

Desejaria abrir o coração aos que andam em busca de um ombro amigo e aos que sonham um cafuné de alma. Aceito, ainda, partilhar todo o conteúdo destas linhas, com os frustrados desse indefectível mundo das redes sociais. Sim, hoje, homenageio o solitário afetivo, esse ser que está sempre fantasiando que numa dessas baladas etílicas e promíscuas, numa das esquinas da vida,numa tela de chat ou site de relacionamento, um príncipe ou princesa siliconada ou com abdômen de tanquinho, se encantará com sua beleza interior, emoldurado num corpo com físico de sobre-peso, pneuzinho saliente, estrias e celulites generosas.

Hoje, convoco os mal resolvidos e os que se tornaram dependentes afetivos, aliás, a pior e mais impactante das dependência. Afinal, bebida, drogas e cigarro ainda nos dá a possibilidade de combater a abstinência, recaindo e adquirindo o objeto do vício. Mas depender de “outro” (filho, cônjuge, namorado e similares) para ser feliz é o fim, venhamos e convenhamos! Pois significa ter ansiedades, paranoias, humor instável e pior, transitar por jogos de ciúmes, culpas, chantagens emocionais, opressão, violência – sementes de relacionamentos doentios. 

É triste constatar a falência afetiva que nos rodeia. E alerto que essa “idade das trevas” emocional, essa inquisição de caça as bruxas aos sensíveis, essa desumanizacão tem devastado crianças, adolescentes, adultos jovens, maduros e idosos. Destruir as emoções humanas não nos aproxima da tão propalada eficiência e frieza das máquinas, ao contrário, nos regride e nivela com animais reptilianos.

Por isso gosto de usar uma analogia cósmica, ao tentar situar o perigo que nos ronda. Quero falar de um elemento chamado buraco negro, um ex-sol que após bilhões de anos de incansável trabalho de engolir hidrogênio e cuspir hélio – poderoso elemento que nos da calor e luz –, morre. 

E após explodir num espetáculo chamado supernova, se condensa numa ínfima quantidade de matéria emoldurada por fantasmagórica força gravitacional, que tritura e destrói tudo ao seu redor, incluindo a luz. É a treva da treva, da treva! O fim do fim de toda matéria e energia que cair lá dentro. 
Pois é assim que caminha a humanidade: nessa escuridão em que cada vez mais, sentimentos, emoções, são triturados pelo materialismo, pelo consumismo e pela tecnologia, em que somos números e nos tornamos descartáveis. 

Espectadores de um espetáculo onde é na tela virtual que a vida acontece, onde ídolos distantes nos abastecem de selfies e nós os seguimos cegos e bobos. E fazemos selfies nossas, enquanto o mundo real nos grita desesperado para que vivamos. Não o vemos, não o tocamos, não o beijamos, não o ouvimos. Mais um selfie estala e um flash se vai, sem memória, sem afeto e o que fizemos há um mês nunca mais será visto e o hoje, será esvaziado da memória no próximo mês. Agora, revejo meu álbum de fotografias e mostro aos que amo, momentos inesquecíveis de minha infância, conto casos do meu avô Zé Cocão e sua foto com o primeiro carro que rodou em Abaeté, e tiveram no caminho que “fazer xixi no radiador” para não ficar no caminho.

Emoção imortalizada de um tempo sem conforto, sem inovação galopante. Mas feliz, simples, em que ninguém tinha estresse, falta de tempo, indiferença, narcisismo. Ah! Já ia me esquecendo... Novas teorias dizem que esse cemitério de matéria e luz, chamado buraco negro, pode ser no fim um “ buraco de minhoca”, uma passagem para universos paralelos. Uau! O fim seria outro início e a morte uma nova vida! Me dá esperança que essa crise de humanismo, esse caos afetivo pode ser na verdade os sinais de um novo tempo se aproximando. Tempo de humanismo, fraternidade, altruísmo, serenidade e paz!

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!