Em qualquer churrasco no Rio Grande do Sul, o anfitrião vai informar os seus convidados, no dia seguinte, da fatura da farra: quantos engradados foram consumidos.
Não estará cobrando nada, apenas noticiando a dimensão do encontro.
Ele se vangloria do excesso, como se estivesse batendo um recorde em relação ao churrasco anterior. Quanto mais cervejas, mais acredita que a festa tenha sido boa.
Tanto que costuma lamentar se pouca gente comparece a um almoço ou jantar dizendo: “Sobrou cerveja na geladeira”.
Sobrar é fracasso. Faltar é a glória da convivência.
Já o mineiro é muito diferente. Ele não soma as cervejas que tomou, simplesmente some com as provas. Você não verá cascos em cima da mesa, entregando o quanto aquela turma emborcou. As garrafas desaparecem da vista.
O mineiro é muito mais esperto, previne-se do sermão escondendo o jogo.
Sabe que, se mostrar seu desempenho, alguém falará que está na hora de parar. Evita o risco de ser visto como bêbado ou sofrer reprimendas familiares. Assim, jamais denuncia a capacidade de seu fígado.
É o legítimo bebe-quieto.
O mineiro bebe como adulto, para se satisfazer, não como criança, para aparecer.
Bebe por gosto, não permite que nenhum desgosto prejudique o seu paladar.
Bebe para matar a fome, não a sede, servindo-se de intermináveis petiscos.
Bebe acompanhado, para dividir o estrago. E bebe, acima de tudo, para esquecer o que já bebeu.
Não quer ter noção de que passou dos limites, muito menos do tamanho da conta.
Seu objetivo é combinar pessoas quentes e cervejas geladas.
Sonega os seus feitos para garantir a tranquilidade de seu momento – não deseja fiscais por perto.
Defende a sua privacidade em vez de ficar alimentando a vaidade. Guarda o discernimento de que será patrulhado se confessar a verdade. Colegas o recriminarão pelo seu exagero. O trago perderá a graça com o bafômetro caseiro. Não poderá fazer mais as suas piadas sem que todo mundo o enxergue a partir do filtro do estigma e do preconceito.
O que o mineiro não descobriu é que ele vem sendo trapaceado pela mineira, que é ainda mais silenciosa do que ele.
As mulheres bebem muito mais do que os homens em Minas Gerais. Colocam os marmanjos debaixo do chinelinho.
Pois a mineira, além da cerveja, vale-se dos drinks. É uma coqueteleira de plantão. Acumula duas vidas etílicas ao mesmo tempo. Disfarça a maratona com intervalos da garrafinha d’água. Vive criando saudáveis recreios para aumentar a resistência e retomar os trabalhos com maior avidez. Ela planeja sua performance como uma pilota de Fórmula 1, que cronometra as suas passagens no pit-stop para recuperar a desvantagem logo em seguida, voando com os pneus certos.
Eu desvendei esse fato ao perceber que a mineira brinda a cada nova rodada com as amigas. Não é só quando surge no evento, é sempre. Brindará infinitamente, fingindo começos.
Você pensa que ela acabou de chegar, mas ela já está ali desde o início da celebração.