FERNANDO FABBRINI

Choveu champanhe

Uma dose de romantismo para amenizar a clausura


Publicado em 01 de julho de 2020 | 14:33
 
 
 
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O cara era apaixonado pela moça. Porém, como se diz por aí, a garota estava noutra. Namorando firme? Noiva? Casamento marcado? O estado civil não importa na nossa história. Certo dia, o rapaz teve a ideia: convidou a turma para uma balada na casa dele. (O evento ocorreu bem antes da Covid-19, quando encontros com amigos eram frequentes e permitidos, sem risco de intervenção da polícia acionada pelos vizinhos).

A tal moça também fazia parte da turma e apareceu, especialmente linda naquela noite. Aliás, era isto que o cara queria; inventou a festinha só para ver seu grande amor mais uma vez. Não tirava os olhos da moça enquanto o resto da turma dançava, conversava, bebia. E ele lá, maravilhado com os cabelos dela, os sorrisos dela, o jeitinho dela ao ritmo do rock. Lá pelas tantas uns foram embora, outros cochilaram nas poltronas, alguns ajudavam recolhendo copos e garrafas vazias. Quando a moça veio se despedir o rapaz apaixonado tomou coragem e jogou aquele papo:

- Se quiser, posso te acompanhar até em casa...

Ela sorriu, aceitou. E lá se foram, olhando estrelas e conversando abobrinhas. Ele, coração disparado, boca seca. Ela, fazendo charminho, fingindo não perceber que o cara estava super a fim. Nesse ponto da história surge uma dúvida. Como se tratava de um amor proibido, não se sabe se os dois se beijaram, se ficaram juntos ou algo assim. Só uma certeza: se rolou um clima e etecetera, foi pela primeira e última vez. No fim da noite, o rapaz foi visto num bar. Chamou o garçom e, com seus últimos trocados, pediu champanhe e brindou sozinho – que doido! - o final daquele amor impossível.

O caso assim recontado traz o enredo de uma das músicas mais marcantes dos anos 70. Ela correu mundo na voz inconfundível e meio fanhosa do cantor napolitano Giuseppe Faiella, de nome artístico Peppino di Capri. Lançada em 1973, com letra de Mimmo di Francia, “Champanhe” virou sucesso e até hoje mexe com as emoções da geração que dançou-a de rosto colado.

Às sextas-feiras, como de hábito, distraio-me no Facebook postando links de músicas de nossa juventude. Ponho Beatles, Eric Clapton, MPB, artistas italianos, latinos, franceses, norte-americanos. Outro dia, sem maiores expectativas, repliquei uma versão recente do “Champanhe” onde Peppino di Capri, simpático e firme aos surpreendentes 80 anos, faz dueto improvisado com Sabrina Ferilli. Ela é uma atriz, e não cantora – o que se nota pelas atravessadas de ritmo que ela comete e pela voz um tanto limitada. Porém, nada demais e absolutamente perdoável diante do encanto de Sabrina, muito bonita aos 57 anos recém-completados.

A postagem disparou no Facebook e Instagram. Frequentador eventual da nuvem, foi espantoso constatar a eficiência dos algoritmos. Ontem, quarta-feira, ao escrever esta coluna, chequei de novo. Na minha página Peppino e Sabrina já ganharam 20 mil compartilhamentos, além de milhares de curtidas e comentários.

Pois é: lá da Itália, num modesto clip meia-boca, os dois ressuscitaram memoráveis dores-de-cotovelo e respectivos pileques (não de champanhe, mas de caipirinha ou cerveja); vestígios de paixões secretas ou proibidas das quais restaram suspiros, silêncios e lembranças para se jogar fora, como diz a letra da música.

Aqui, por um instante, ouvindo Peppino e Sabrina via internet, mulheres e homens enclausurados sonharam nos sofás de suas casas, nas mesas improvisadas dos home-offices, nas cozinhas, na solidão dos quartos, nas janelas dos apartamentos.

Brindemos, portanto, ao sistema imunológico romântico que nos aproxima e nos salva nesses tempos difíceis. Felizmente, não há vírus que o derrube, secura que o mate nem pandemia que o afete.

Segue o link da música https://youtu.be/izD6hP5DBss

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