Durante trinta e tantos anos trabalhando nas áreas de Comunicação uma especialidade sempre me fascinou: o talento dos profissionais para resumir um conceito, um alerta, um apelo em um mínimo de palavras. Essa rara qualidade é materializada nos slogans, nos bons títulos, nos encerramentos de comerciais criativos.
Na política, essa arte ganha um peso especial. Um só frase bem bolada pode conter uma tonelada de argumentos para conquistar o público, mobilizá-lo e até vencer uma eleição. Mas, cuidado: como são apenas palavras, portam o risco das construções frágeis, sujeitas a chuvas, trovoadas e desabamentos. Muda-se um tempo verbal, troca-se a posição de uma vírgula e pronto: virou zoação do adversário. De carona no insistente “Lula-Livre”, por exemplo, um gaiato inventou a réplica “Lula-Deus-Me-Livre”.
Porém, nem sempre essa síntese rápida e rasteira é possível. Há casos em que só um raciocínio mais elaborado pode levar a mensagem pelo caminho ideal entre o emissor e o receptor. Quem saiu às ruas nas últimas manifestações brandia faixas, gritava frases em coro e botava para fora sua indignação e esperanças. Alguns recados foram claros; outros exigiram mais calma para entendê-los. De ouvidos e olhos atentos, arrisquei algumas interpretações que divido aqui com vocês.
Recado 1: “olhem aí, deputados e senadores! Tomem vergonha na cara, seus folgados! Vocês ganham uma fortuna para não fazerem nada, pô? Reformas importantíssimas paradas nessas mesas e vocês só enrolando, só pensando na próxima eleição, só ocupando o tempo com picuinhas? Trabalhem pelo futuro do país e honrem seus cargos, cambada.” Certamente não caberia tudo numa faixa, mas tem destinatário e formato de carapuça.
Recado 2: “e esses 11 de uniformes pretos? Afinal, de que lado esse time joga? Dentro das regras ou na grande área da impunidade? Tá pegando mal fraudar a partida, fingir não ver mão na bola e dinheiro no bolso; perdoar impedimentos claros, pênaltis escandalosos e gols roubados. Pensam que a torcida é boba?” Difícil sintetizar tanta coisa numa cartolina rabiscada com pincel atômico, mas tá falado. Teve muitos, muitos recados sutis.
Melhor foi perceber que o brasileiro está perdendo seu complexo de vira-lata obediente e começa a cobrar, com firmeza, decisões das chamadas instâncias superiores – mesmo sabendo que várias militam descaradamente nas instâncias inferiores do oportunismo, da politicagem e da corrupção.
Inacreditável, também, a cara de pau do ex-presidente-ex-presidiário num discurso proferido no Dia do Trabalho. Usando a costumeira lábia e fingindo preocupação com o país, atribuiu ao governo federal as mortes pela pandemia até agora. Destaco duas coisas na verborragia falaciosa do indivíduo. Primeiro, o fato dele valer-se de um problema universal que afeta todas as nações para tentar iludir a plateia, fiel à narrativa furada da oposição desorientada e não-propositiva. Depois, desfaçatez elevada ao cubo: aquele que aponta o dedo e inventa “culpados” para fins midiáticos é o mesmo “inocente” que busca sem sucesso apagar sua imagem negativa, seu passado desastroso e seu governo quadrilheiro.
Como disse o ministro Paulo Guedes com finíssima ironia, a esquerda no Brasil de hoje é como uma cartomante com Alzheimer: sabe tudo do futuro mas se esquece dos últimos 16 anos.
Sorte nossa é que – excluída a “bolha” - cada vez menos pessoas se deixam levar por essas mentiras. Nas ruas e nas cabeças do povo, o cenário do Brasil está mudando. Mas esteja certo que tem gente com medo dos recados e detestando tudo isso. Ah, como tem.