A Filarmônica de Minas Gerais tem um orçamento para pagar: o corpo artístico, impostos, custos operacionais, a Sala Minas Gerais, que abriga a orquestra. Como ele está dividido?
Quando falamos de cultura no Brasil, os orçamentos são muito baixos, 0,2% do orçamento do Estado vai para a área cultural. Esse cobertor é sempre muito curto para abrigar tanta gente talentosa e tantos projetos bacanas na área da cultura. Ousamos fazer um projeto muito bonito na 13ª temporada, que é o sonho de dar aos mineiros uma grande orquestra. A gente não queria fazer mais uma orquestra, a gente queria que o Estado tivesse uma orquestra que se comparasse às grandes nacionais e internacionais, colocando Minas Gerais e Belo Horizonte no cenário internacional da música clássica. Temos a orquestra da série A, que é um grande time, é uma orquestra de 90 músicos campeões no grau de mestres e doutores em música.
Tem um preço para reter todos esses talentos?
Não são só talentos nacionais, são internacionais também. Montamos um time de muitos talentos, e isso exige um investimento substancial. Ele é da ordem de R$ 22 milhões para montar a orquestra que paga a folha dos 90 músicos. Todos são contratos celetistas. Montamos uma estrutura, que é o Instituto Cultural Filarmônica, para a gestão da orquestra, uma organização social que tem um conjunto de funcionários para fazer a orquestra funcionar, e isso custa outros R$ 2 milhões. Então, nossa folha é o principal custo, que é de R$ 24 milhões por ano, num total de 150 pessoas – 90 músicos, dez técnicos de orquestra e mais 50 funcionários nas áreas de administração e finanças, marketing, comunicação e produção. Precisamos de R$ 4 milhões para fazer uma programação artística anual para cobrir os custos dos artistas que vão tocar com a orquestra. E mais R$ 2 milhões para custos operacionais e administrativos. Trabalhamos com um orçamento anual de R$ 30 milhões.
Onde o Estado entra nesse custo?
O Estado entra com R$ 18 milhões (que cobrem músicos e funcionários). Infelizmente, isso vai diminuir para R$ 17 milhões em 2020. Quase 58% do custo é o que o Estado entra para eu pagar a orquestra. Dos R$ 30 milhões, R$ 18 milhões são cobertos pelo Tesouro do Estado, e R$ 12 milhões temos que fazer por meio do patrocínio e da bilheteria.
Você está mais otimista com o resultado da bilheteria em 2020?
Em 2019, 3.366 pessoas fizeram assinaturas antecipadas para os concertos; esse número pode crescer? Temos capacidade para ter muito mais que esse volume. Para 2020, temos 85% de renovação, nossos assinantes são fiéis, então os outros 15% serão os novos. A sala tem 1.470 lugares, e as pessoas assinam uma série determinada de concertos – de quinta, sexta ou sábado. Temos capacidade de ter muito mais assinantes.
A relação da Filarmônica com o governo Zema está equilibrada? Porque neste ano tivemos certos episódios e até uma ameaça de que não ia ser renovado o contrato da Secretaria de Estado de Cultura com a Filarmônica. Isso acabou, essas arestas estão devidamente aparadas ou não?
Estão. Foi um ano em que o governo chegou em janeiro, o próprio governador se referiu à Sala Minas Gerais de uma maneira indevida (durante a campanha eleitoral, Zema chamou a sede da Filarmônica de “monstruosidade para a elite”). Depois, ele viu que não era aquilo, que a sala é magnífica. O governo foi vendo o valor que a Filarmônica representa para o Estado, então isso foi mudando. É claro que, para uma situação financeira como o novo governo pegou o Estado, entendo que tem sido difícil cumprir com esse contato de gestão de R$ 18 milhões, que como eu me referi, é a parte do governo. Ainda que não tenha podido cumprir o cronograma de desembolso, o governo está realizando vários desembolsos com mais parcelas do que o previsto no contrato de gestão, de modo que estamos recebendo os recursos. Com isso, estamos mantendo a folha de pagamento em dia, não houve atraso. Por um lado, mantidos os desembolsos, por outro lado, o contrato de gestão será renovado no ano que vem. Não há nenhum problema com o governo Zema.
Existe expectativa de aumento das empresas patrocinadoras? São quantas atualmente?
Há um trabalho hercúleo de ir atrás dos patrocinadores. Temos conseguido. Temos cerca de 15 empresas que patrocinam a Filarmônica. É uma meta de pelo menos R$ 10 milhões que colocamos para captar. Temos uma classificação de acordo com o valor do patrocínio. Ela pode ser uma empresa apresentadora dos concertos, ela é uma patrocinadora master, ela é uma patrocinadora, ou ela é uma apoiadora. Então, isso significa que fazemos cotas de patrocínios. Eu convido os empresários a olhar nosso trabalho no site filarmonica.art.br.
Dá para saber se um dia a orquestra andará com as próprias pernas sem a participação do dinheiro público ou isso acontece no mundo inteiro e toda orquestra tem a participação do Estado?
Muitas vezes as pessoas falam sobre ser autossustentável, e eu digo que a autossustentabilidade não existe na cultura. A cultura, assim como a educação, são direitos universais. Nós precisamos delas para nos transformarmos em seres humanos melhores, então precisamos de investimento em educação e cultura. Não tem como fazer uma orquestra sem a participação do setor público. Não há na história da música clássica, em nenhum lugar do mundo, uma orquestra seja autossustentável. Se falarmos da orquestra de Viena, a mais famosa do mundo, e que tem mais de 200 anos, 35% do orçamento dela depende da prefeitura. O mesmo acontece em Berlim, onde a prefeitura participa com um percentual de 35% a 40%.
Às vezes ouvimos o discurso: “Ah, estão gastando dinheiro público com a elite, não é?”
As pessoas não entendem que cultura não é gasto, é investimento. O fato de falar que é para elite, esta é a nossa missão: é desmistificar isso. A música é pra todo mundo. Os preços são acessíveis nos concertos pagos, e fazemos toda uma programação gratuita para democratizar o acesso. Se o governo não investir, não tem jeito de fazer essa orquestra grandiosa como nós fizemos. O governo precisa investir para a gente correr atrás do recurso que complementa o dinheiro público. Não é tirar o recurso público. A orquestra é de todos os mineiros.