Num regime de exceção, ou de quem tem espírito totalitário, o risco fica com o guarda de esquina, que se sente com poderes para fazer o que entende da ordem ou das leis – o que ele entende, não necessariamente o que elas determinam. É uma verdade que Pedro Aleixo – um dos mais sérios e competentes políticos mineiros, que infelizmente igual não se vê mais – procurou mostrar ao presidente Costa e Silva pouco antes da edição do Ato Institucional 5, que, em 1968, jogou o país na ditadura militar. Ele era vice-presidente e teve a coragem de votar contra o ato. Acabou isolado pelo regime e impedido de assumir a Presidência quando do afastamento do presidente. Ato dos guardas da esquina, gente de alta e baixa patentes, mas de pouca expressão.
Mas por que lembrar isso agora se não estamos numa ditadura? Ainda vivemos numa democracia, embora muitos desconheçam isso e busquem radicalizar, criando inimigos a serem abatidos nas próximas eleições. Estabelecem diferenças que na prática não existem ou, pior, estimulam o uso da força em nome do Estado. São situações que fogem inteiramente do controle de quem as estimula. Controlar o guarda de esquina que pratica as maiores barbaridades – ou não foi uma barbaridade o que aconteceu numa escola militarizada de Goiás, onde meninos e meninas foram submetidos a revistas íntimas que, supostamente, buscavam drogas? – se sentindo protegido pela lei ou pela vontade do governante.
Foram guardas de esquina que, sentindo-se protegidos pelas opiniões do presidente Bolsonaro, tocaram fogo na Amazônia para mostrar quem manda. São os guardas de esquina de que falava Pedro Aleixo que, protegidos pelas falas do governador Witzel de que bandido bom é bandido morto, abrem fogo contra qualquer um que julgam suspeito, matando trabalhadores e crianças na certeza da impunidade.
Agiram como guardas de esquina os agentes da Receita que quebraram sigilos de cidadãos, sem autorização judicial, seguindo a lógica vesga da Lava Jato. Tão perigosos quanto eles são os que compõem um novo batalhão de “guardas de esquina”. Os que agem nas redes sociais, estimulados e ajudados por gente íntima do poder – quando não gente que é o poder –, que colocam a estabilidade do país em risco pelo desejo de demonstrar poder. Um poder que sabem não ter, mas que precisa ser apresentado aos seus incautos guardas de esquina, facilmente manipuláveis e extremamente agressivos.
É hora de o país despertar para a realidade. Não existe estabilidade com instituições fracas e desmoralizadas. Estamos numa fase de mediocridade. Faltam-nos, além de líderes, governantes capazes, gente com visão real de Brasil e de mundo. Nossa sociedade ainda continua omissa, embora se sinta o desejo de alguns de se engajarem na luta por um país melhor. É disso que precisamos. De uma sociedade comprometida, sem medo de mostrar-se, de cobrar. Uma sociedade que deixe o conforto e que, por não querer se envolver, aplaude um crescimento ridículo do PIB.
É preciso que cada um de nós assuma o seu papel. Quem governa, governa em nosso nome e tem, sim, que dar satisfação do que anda fazendo e, até mais, do que não tem feito. Menos bravata e mais qualidade na gestão. É o que pedimos, senhores.