Copa do Mundo encerrada, mas, daqui a quatro anos, a Rússia, com sua cultura, hábitos, história, povo e, claro, gastronomia, será o assunto da vez. Quem viajar para ver a Copa não terá mais motivos para fazer coro com Zeca Pagodinho, que canta não saber o que é caviar (“nunca vi, nem comi. Eu só ouço falar”).
Até meados dos anos 80 era normal encontrar pratos russos nos restaurantes brasileiros. Na verdade, nada tinham de russo, mas, na época da Guerra Fria, o imaginário sobre o país era forte, alimentado pelos filmes sobre espiões (ou espiãs irresistíveis) que moravam depois da “cortina de ferro”. Até a queda do muro de Berlim, era chic ter no cardápio pratos como frango à kiev ou steak siberiana (quem se lembra?).
Antes do comunismo, a cozinha da Rússia era associada à sofisticação pela influência francesa na corte czarista (o francês era a língua da elite imperial) e vice-versa (a cozinha russa foi moda na Paris da Belle Époque). Tradições russas com seus arenques, blinis, salmão defumado, crème moscovite e, principalmente, caviar, acrescentavam um sofisticado exotismo à base trazida por chefs franceses (como o célebre Carême).
Caviar, de verdade, são ovas de esturjão do mar Cáspio, com variações de sabor e preço segundo os tipos ossetra, sevruga e beluga. O preço é estratosférico, e o produto é um dos principais itens (assim como as trufas brancas de Alba) da cozinha que celebra o luxo e a decadência (é o termo usado na gastronomia, sem conotações negativas). Não é coincidência o fato de a casa Prunier – ainda uma grande referência – ser vizinha da Maison de Truffes, na Place Madeleine, um dos endereços mais decadentes de Paris.
Prato típico
Sofisticação decadente, contudo, é combinar caro e raro com comum e barato, numa escala em que a explosão de sabores vem quando os extremos se tocam. Exemplos clássicos são trufas brancas sobre ovo frito e caviar com ovo cozido de gema mole, ou servido sobre um blini (panqueca) com creme de leite batido com toques de limão e vinagre (como no Blinis Demidoff).
Na Rússia, é obrigatório provar o zakuska – uma espécie de brunch – com caviar, ovas de salmão, arenques, borscht, peixes defumados, batatas com maioneses (a famosa salada russa) – cogumelos e sobremesas com nomes decadentes, como Charlotte (sobremesa criada por Carême, usando um nome francês para uma rainha inglesa, mas, na verdade, homenageando a Rússia, que era moda no Segundo Império).
Mas tudo isso foi antes de o comunismo obrigar príncipes russos a se tornarem taxistas em Paris, como bem escreveu Scott Fitzgerald. Embora hoje na Rússia globalizada – ketchup e Coca Cola não são mais vistos como ingredientes capitalistas decadentes –, o caviar degustado com champanhe ou vodca continua celebrando a boa decadência no seu melhor estilo.
Receita
GRAVLAX CÍTRICO
Primeira parte: Em uma vasilha pequena misture:1 xícara de sal, 1/2 xícara de açúcar com 3 especiarias amassadas, (1/2 colher (sopa) de sementes de coentro, 1/2 colher (sopa) de sementes de erva-doce, 1/2 colher (sopa) de anis-estrelado) e as cascas raladas de 1 limão, 1 lima e 1 laranja. Abra um plástico filme onde caiba uma peça de filé salmão de cerca de 1 kg e salpique a metade dessa mistura sobre o plástico. Coloque o salmão por cima e cubra-o com o restante da mistura de temperos. Feche bem o plástico, dando duas voltas com ele e leve à geladeira por 6h ou em temperatura ambiente por 4h.
Segunda parte: Retire da geladeira, retire o salmão do plástico e, usando uma faca, retire todo o tempero. Fatie o salmão em pedaços finos. Em um pequeno pote, bata 100 ml de creme de leite fresco com 1/2 colher (chá) de vinagre de vinho branco e 1 colher (chá) de suco de limão. Coloque fatias de pão preto em uma torradeira ou leve-as ao forno com um fio de azeite para aquecer e deixá-las crocantes.
Terceira parte:Em pratos individuais, sirva o salmão curado fatiado com o creme azedo e o pão preto.