Em meio à pandemia global do novo coronavírus e aos pedidos de autoridades do próprio governo para que os brasileiros evitassem aglomerações, o presidente Jair Bolsonaro participou neste domingo (15), em Brasília, de manifestações convocadas por seus apoiadores. Na pauta dos atos que ocorreram em todo o Brasil, além do apoio ao governo, havia pedidos de fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF), além das quedas dos presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP).

Diante do Palácio do Planalto, o presidente cumprimentou manifestantes que estavam nas fileiras iniciais do protesto, tirou fotos com eles, inclusive utilizando aparelhos dos próprios apoiadores, operados pelo presidente, e balançou uma grande bandeira do Brasil.

O presidente subiu a rampa do Palácio do Planalto enquanto apoiadores gritavam pedindo por um novo “AI-5”, em referência ao Ato Institucional nº 5, decretado pela ditadura militar em 13 de dezembro de 1968. A medida inaugurou a fase mais dura do regime, ampliando a tortura e os assassinatos promovidos pelo governo, sufocando a oposição, ampliando a censura dos meios de comunicação, cassando mandatos e fechando o Congresso.

Jair Bolsonaro participou dos atos mesmo após defender, no último dia 12, usando uma máscara em uma transmissão oficial, que os protestos fossem “repensados”. Além disso, para participar das manifestações, ele rompeu uma quarentena a que estava sendo submetido desde que o secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, testou positivo para o coronavírus após a viagem em comitiva presidencial para os Estados Unidos. Do grupo que viajou e interagiu com Bolsonaro em voo e no território norte-americano, já são dez aqueles com infecção confirmada.

Por causa disso, o próprio Bolsonaro fez um teste para detectar se estava com o novo coronavírus. Ele anunciou nas redes sociais que seu teste deu negativo. No entanto, um novo exame será feito no início da semana.

Participação

Desde o início do domingo, o presidente da República utilizou suas redes sociais para divulgar atos – a maior parte organizada por deputados federais e senadores de seu grupo político. Ele foi publicando vídeos e informando locais nos quais os protestos aconteciam, não se preocupando nem mesmo com as faixas contra os demais Poderes constituídos presentes em algumas das imagens.

No final da manhã, Bolsonaro decidiu participar pessoalmente dos atos. Ele deixou o Palácio da Alvorada ao meio-dia, em um comboio com carros oficiais. Foi a senha para que a comitiva fosse seguida por simpatizantes que buzinavam e gritavam palavras de apoio a ele e contrárias a outros Poderes. Durante o trajeto, que percorreu diferentes pontos de Brasília, ele não desceu do carro. Só o fez ao chegar ao Palácio do Planalto, onde acenou aos gritos de “mito”, antes de descer para cumprimentar apoiadores e fazer vídeos. Em um deles, resumiu: “Isso não tem preço”.

Mesmo com faixas e gritos contrários ao Congresso e ao Supremo, o presidente enfatizou que o ato não era “contra Poder nenhum”. “É o que digo: tem quatro pessoas no Brasil, chefe de Poderes, que, havendo entendimento, entre nós e o povo, não é entre nós, é entre nós e o povo, o Brasil deslancha. Quero ter o prazer de um dia estar com todos os chefes de Poderes juntos e o povo aplaudindo a gente”, afirmou Bolsonaro.

Reflexos

A participação de Bolsonaro nos atos deve tornar a semana ainda mais tensa em Brasília. O clima já era ruim desde que o presidente começou a divulgar vídeos favoráveis aos atos.

Na noite deste domingo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, reagiu duramente. “O mundo está passando por uma crise sem precedentes. O Banco Central americano e o da Nova Zelândia acabam de baixar os juros; na Alemanha e na Espanha, os governos decretam o fechamento das fronteiras. Há um esforço global para conter o vírus e a crise. Por aqui, o presidente da República ignora e desautoriza o seu ministro da saúde e os técnicos do ministério, fazendo pouco caso da pandemia e encorajando as pessoas a sair às ruas. Isso é um atentado à saúde pública que contraria as orientações do seu próprio governo”, criticou.

“A economia mundial desacelera rapidamente; a economia brasileira sofrerá as consequências diretas. O presidente deveria estar no Palácio coordenando um gabinete de crise para dar respostas e soluções para o país. Mas, pelo visto, ele está mais preocupado em assistir às manifestações que atentam contra as instituições e a saúde da população”, completou o presidente da Câmara.

O fato é que os protestos serviram para mostrar que Bolsonaro tem apoiadores fiéis, dispostos até mesmo a arriscar a saúde e a vida por ele. Mas, junto disso, acabou por garantir que a governabilidade esteja comprometida no momento em que mais se precisa dela.