BRASÍLIA. A Câmara dos Deputados chegou a avançar, em 2021, com um projeto de lei (PL 399/15) que libera o cultivo, para fins medicinais, veterinários, e industriais, da Cannabis sativa, planta que também é utilizada para produzir a maconha.

A proposta foi aprovada por uma comissão especial em caráter terminativo, ou seja, iria ao Senado sem ter de passar pelo plenário. Porém, o deputado Diego Garcia (Republicanos-PR) apresentou um requerimento para o plenário da Câmara decidir se o projeto passaria por nova votação antes de ir para a Casa Alta. Caberia ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), prosseguir com o processo, o que não aconteceu.

Desde então, o Congresso não voltou a tratar de matérias que tratam de flexibilizações da cannabis, seja para uso medicinal, industrial ou recreativo. Do contrário, caminha para inserir na Constituição a criminalização da posse e do porte de qualquer quantidade de droga, como resposta à decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que descriminaliza o uso pessoal.

O presidente da Associação Brasileira da Cannabis e do Cânhamo Industrial (ABCCI), Luís Maurício, baixista da banda Natiruts, afirma que é preciso separar os diferentes temas ligados à cannabis. Para ele, há uma “ignorância voluntária” de alguns parlamentares. 

“Para avançar, tem que saber separar as pautas. [...] O cânhamo industrial seria um ‘abre-alas’ para o Brasil avançar. Em um segundo momento, a cannabis medicinal, porque com a regulamentação, você consegue ter controle e rastreabilidade para evitar desvios de finalidade. A pauta do recreativo é a última a ser discutida, mas passa por um primeiro passo, que é descriminalizar o usuário”, afirma.

Relator do projeto aprovado pela comissão, o deputado Luciano Ducci (PSB-PR) disse à reportagem de O TEMPO que retomar a discussão seria a oportunidade de fazer um “contraponto” ao STF. “Para mostrar que o Congresso não tem nada contra o uso medicinal, só o recreativo. Porém, o momento ainda não é favorável”, pontuou.

A bancada evangélica tem posição contrária a qualquer projeto de flexibilização da lei atual. Muitos parlamentares afirmam não se opor ao uso de medicamentos à base de canabidiol, mas temem que liberar o plantio da cannabis para esse fim pode abrir caminho para desvios de finalidade e elevar o número de usuários de maconha no país.

Para o presidente da ABCCI, a maioria dos deputados e senadores ainda temem uma reação negativa do eleitorado ao eventualmente voltarem a favor do plantio de cannabis.

“O Legislativo tem muita preocupação com o eleitorado. Os legisladores têm medo do impacto que vai ter na população se, por exemplo, votar a favor, mesmo para fins medicinais. As pessoas têm que sair do armário, nesse sentido de colocar a cara, mostrar os números, os efeitos, as comprovações”, aponta.

Deputados acreditam que o ano de 2024 é pouco propício para a aprovação de projetos liberalizantes em relação à cannabis. Além do perfil conservador do Congresso, a meta de Arthur Lira é eleger o seu sucessor na eleição à presidência da Câmara, em fevereiro de 2025. Para isso, faz questão do apoio da bancada evangélica e não deve comprar grandes brigas com o grupo.