O ex-chefe de gabinete da Secretaria de Estado de Saúde (SES-MG), João Pinho, disse nesta segunda-feira (3) que não revisou a lista de servidores que seriam vacinados pela pasta e que isso foi feito pelas chefias de cada setor. Como chefe de gabinete, ele era o número 3 da pasta e tinha um cargo superior ao das chefias. Ele prestou depoimento à CPI dos Fura-Filas na condição de investigado.
Embora tenha reconhecido sua voz e que a reunião de fato aconteceu, João Pinho disse que não reconhece a legitimidade e a autenticidade do áudio pois não tem certeza se a gravação foi adulterada e se todo o conteúdo da reunião foi gravado. Segundo ele, o áudio foi descontextualizado.
João Pinho disse ainda que se sente injustiçado por ter sido demitido após a gravação vir à tona porque não cometeu nenhum crime na reunião.
Durante o depoimento, o ex-chefe de gabinete disse que ficou sabendo no dia da reunião que dois servidores da Assessoria de Comunicação que foram vacinados pela secretaria permaneceriam em home office. No entanto, ele diz que não sabe se os dois servidores estavam trabalhando de casa no momento em que foram vacinados.
“Eu tive conhecimento naquele dia [que a reunião aconteceu] da situação envolvendo os dois servidores. Não faço parte da unidade a que eles se vinculam, não sou chefe imediato dessas pessoas e não tenho conhecimento do enquadramento desses servidores e o regime de trabalho deles antes ou depois da vacinação”, afirmou João Pinho nesta segunda-feira (3).
Porém, no áudio, João Pinho diz que os dois foram incluídos pela então chefe da Ascom à época, Virginia Silva, como estando em regime de trabalho presencial.
"Vocês foram colocados na lista pela Virginia não como teletrabalho, vocês foram colocados como trabalho presencial. Essa é a forma como está estabelecido no email que a Ascom mandou para a subsecretaria de Vigilância. Então aqui tem um grau de exposição direto. Uma ligação direta que não se fecha”, disse aos servidores, na gravação.
De acordo com Pinho, a lista de servidores da secretaria que seriam vacinados foi elaborada pela chefia de cada setor.
Servidores em home office, por uma deliberação da própria SES, seriam os últimos a serem vacinados. Por isso a CPI trabalha com a possibilidade de ter ocorrido o “fura-fila do fura-fila”. Além de terem sido vacinados servidores administrativos antes da linha de frente, servidores administrativos em home office teriam sido vacinados antes de quem estava em trabalho presencial.
Embora diga que a responsabilidade da lista seja de cada chefia, como chefe de gabinete, João Pinho era superior hierárquico de todos esses setores. “O senhor é a chefia da chefia. O senhor não cobrava isso dos seus liderados, essas informações [sobre a lista]? Cada um tinha absoluta autonomia dentro do seu trabalho?”, questionou o presidente da CPI, João Vítor Xavier (Cidadania).
Como resposta, João Pinho disse que a chefia de cada setor tinha autonomia para enquadrar seus subordinados conforme os critérios de vacinação e que essa atividade foi descentralizada por um memorando. “Isso não foi revisado por mim. Se tivesse que ser feito, eu teria que revisar a lista de 4.500 servidores da secretaria”, explicou o ex-chefe de gabinete.
Em conversa com O TEMPO, o presidente da CPI, João Vítor Xavier, avalia que João Pinho se portou como se não tivesse nenhuma autoridade na SES.
"O que não é verdade. Ele era o chefe de gabinete, ele tinha muita autoridade e uma grande responsabilidade. Infelizmente, ele se esquivou de muitas perguntas, algumas muito importantes, talvez porque já não tivesse mais como respondê-las tamanha a materialidade do problema que a Secretaria de Estado de Saúde enfrenta nesse momento", disse o deputado.
"Em todo os momentos em que ele era questionado ou apertado de forma mais incisiva, ele tratava como se o problema não fosse com ele, como se a responsabilidade fosse de outras pessoas. No entanto, ele eram superiores hierárquicos a essas pessoas e elas respondiam a ele. O que nos parece é que tivemos um processo equivocado e ilegal na secretaria e que o chefe de gabinete tenta se esquivar, transferindo responsabilidades", completou João Vítor Xavier.
Prevaricação e falsidade ideológica
Com base no áudio da reunião que foi vazado, o presidente da CPI, João Vítor Xavier (Cidadania) suspeita que, além do fura-fila de servidores em home office, teria havido também o crime de falsidade ideológica, já que informações falsas teriam sido prestadas em documentos oficiais.
Isto é, que servidores que constavam como trabalho presencial na lista enviada à Assembleia Legislativa e ao Ministério Público na verdade estavam em home office quando foram vacinados. Neste caso, segundo os deputados, João Pinho poderia ter cometido o crime de prevaricação, ao não tomar providências quando soube das informações falsas.
“Não caberia a mim fazer uma apuração desse fato. O que coube à mim era ter certeza que essas informações que permitem essa apuração chegassem sem qualquer tipo de manipulação aos órgãos competentes. Ao Ministério Público nós mandamos exatamente essa apuração, que eles [os dois servidores] estavam em telebralho, junto com a lista”, se defendeu João Pinho em seu depoimento.
Segundo ele, coube à subsecretaria de Vigilância em Saúde organizar a vacinação. A CPI dos Fura-Filas ouviu a subsecretária da pasta, Janaína Passos no dia 22 de abril. Na ocasião, ela reconheceu que servidores em home office não deveriam ter sido vacinados antes dos trabalhadores da linha de frente.
Passos reforçou, porém, que coube às chefias organizarem as listas dos setores conforme os critérios de vacinação.“A gente orientou que fossem seguidos os critérios, mas, se houve algum equívoco no escalonamento dos trabalhadores, ficou a cargo das chefia”, disse, na ocasião.
A comissão vai ouvir a ex-chefe da assessoria de comunicação, Virgínia Silva, na terça-feira (4). Ela foi a responsável por elaborar a lista do setor. Também será ouvida a diretora de Vigilância em Agravos Transmissíveis, Janaína Fonseca Almeida.