Era madrugada de sexta-feira quando um colega do trabalho entrou no meu Instagram e viu um rosto desconhecido na foto do perfil. Ele tentou acessar a conta com meu login e senha, sem sucesso. Achando aquilo estranho, tentou acessar a minha conta no Twitter, mas também não conseguiu. Quando abriu o meu e-mail, viu dezenas de mensagens serem apagadas. Não havia dúvidas: eu estava sofrendo um ciberataque.
No dia seguinte, já estávamos sem o domínio de quase todas as minhas redes sociais. Meu perfil no Twitter tinha sido invadido, e meu perfil no Instagram, com todas as fotos, vídeos, textos e stories, apagado. Mais de 60 mil e-mails pessoais e de trabalho foram para a lixeira. Horas depois, recebi um pedido de “resgate” pelo WhatsApp no valor de US$ 500.
Nossa primeira medida foi entrar em contato com as plataformas para recuperar os perfis. Em seguida, conversamos com algumas autoridades da Delegacia Especializada de Investigações de Crimes Cibernéticos, aonde fui pessoalmente fazer um boletim de ocorrência.
O ataque que eu sofri se soma a uma triste estatística: em Minas Gerais, os crimes virtuais aumentaram quase 50% durante o período de pandemia da Covid-19. Foram 24 mil ocorrências apenas nos primeiros seis meses deste ano, segundo dados da Polícia Civil.
Grande parte desses ataques é sofrida por mulheres, que têm suas fotos vazadas e informações caluniosas divulgadas por grupos que alimentam uma masculinidade tóxica. A consequência dos ciberataques pode causar ansiedade, depressão e diversos transtornos nas vítimas. Os motivos que levam a crimes como esse são vários e, no meu caso, indícios apontam para o caráter político da ação, como o fato de que a primeira postagem apagada ter sido aquela em que apresentava meu nome como pré-candidata à vereança.
Os crimes virtuais são tema central do debate sobre a fragilidade da democracia em um contexto em que a esfera pública é cada vez mais intermediada por empresas de redes sociais e canais que facilitam a propagação de ataques cibernéticos como a invasão de contas pessoais, as fake news e a operação de perfis falsos que tentam condicionar o debate e dar a visibilidade a determinadas posições políticas. Recentemente, foi instaurada no Congresso Nacional a CPMI das Fake News, que debate os crimes virtuais que atentam contra a democracia.
O ataque serviu para aprimorar a nossa proteção nas redes. Temos realizado debates sobre segurança digital e colocado em prática uma série de medidas. Também passamos a refletir com mais intensidade sobre quem somos e por que incomodamos. Em um ano e meio de mandato, já fui agredida e ameaçada de prisão ao tentar mediar a relação entre policiais e manifestantes, já tive minha intimidade exposta enquanto mulher lésbica e quase tive o mandato cassado devido à luta contra atitudes e projetos conservadores.
Esse momento também mostrou que estamos juntas e fortes como nunca. Durante o período em que estive sem acesso ao meu Instagram, compartilhei meus conteúdos no perfil da companheira Cida Falabella, que mudou o nome da sua rede para “Cida e Bella”, em um gesto de parceria que, como sempre soubemos, não se encerra na esfera política. A camarada Andréia de Jesus me convidou para realizar publicações coletivas na sua conta do Twitter, para fortalecer a campanha nacional pelo Despejo Zero, lançada naquela semana. A querida Áurea Carolina colocou sua equipe à disposição para o contato com a mídia, a fim de dar visibilidade para o caso.
Cerca de dez dias depois, todas as contas foram recuperadas, e a maior parte das publicações apagadas voltaram ao perfil. Os e-mails, infelizmente, foram perdidos. Mas sigo mais forte do que antes, graças às muitas mãos que seguram as minhas. O processo de investigação segue em curso.