TRAGÉDIA DE MARIANA

‘Holocausto ambiental’: prefeitos pedem repactuação de Mariana com Lula e Zema

Prefeitos de cidades atingidas pela contaminação do Rio Doce chamaram o rompimento da barragem do Fundão, em 2015, de holocausto ambiental e pediram que presidente, governador e STF participem ativamente da negociação com as mineradoras

Por Mariana Cavalcanti
Publicado em 21 de fevereiro de 2024 | 13:57
 
 
 
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Prefeitos de municípios de Minas Gerais e do Espírito Santo afetados pelo rompimento da barragem de Fundão e contaminação do Rio Doce divulgaram uma carta aberta repudiando o posicionamento das mineradoras na repactuação do acordo pela tragédia de Mariana. O Fórum Permanente de Prefeitos da Bacia do Rio Doce, através do Consórcio Público de Defesa e Revitalização do Rio Doce (CORIDOCE), ainda pediu a participação ativa do presidente da República, dos governadores mineiro e capixaba e do presidente do STF nas negociações. 

Em dezembro de 2023, a Samarco e suas controladoras, Vale e BHP Billiton, fizeram uma proposta de indenização de R$ 42 bilhões, que seriam divididos em parcelas durante oito anos. A oferta, entretanto, foi considerada como “afrontosa” e “desrespeitosa” pelos prefeitos e representantes dos atingidos na tragédia de Mariana. Em coletiva de imprensa, José Roberto Guimarães, presidente do Coridoce e prefeito de São José do Goiabal, afirmou que a mesa de negociações “não chega mais a lugar nenhum” e pediu a participação dos presidentes das mineradoras:

“É frustrante depois de tudo, isso acontecer. Os governadores e a presidência da República devem se envolver diretamente com a direção das empresas responsáveis, e os CEO’s das empresas devem se sentar na mesa, uma vez que estamos convictos que os advogados que estão sentados à mesa de repactuação já fizeram o seu papel de discussão”, declarou.

José Roberto destacou, ainda, que o valor mínimo aceito pelas prefeituras de indenização é de R$ 126 bilhões, com um parcelamento de no máximo 5 anos. Ainda conforme ele, a mesa teria chegado a conclusão que este é um valor viável, tendo em vista que as mineradoras lucraram R$ 590 bilhões após o rompimento da barragem do Fundão.

“Essa proposta ridícula, absurda, desrespeitosa na casa de R$ 42 milhões. Não é possível levar essa situação por mais um ano sem solução. O holocausto ambiental aconteceu aqui em terras mineiras e capixabas. Precisamos do Rio Doce Limpo. Precisamos que os atingidos de todas as cidades sejam justamente indenizados. Precisamos das cidades afetadas integralmente compensadas”, reforçou José Roberto. 

A repactuação se encontra paralisada desde dezembro, após os atingidos recusarem a oferta de R$ 42 bilhões feita pelas mineradoras. Em carta aberta divulgada, os municípios integrantes do Coridoce ainda solicitam participar da mesa de negociação e declararam que “somente assinarão a Repactuação se conseguirem negociar os termos do acordo afetos aos seus direitos”.

O rompimento da barragem do Fundão afetou 39 cidades, sendo 36 em Minas Gerais e três no Espírito Santo. A tragédia contaminou as águas do Rio Doce, principal fonte de subsistência para as comunidades desses municípios, com 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério. 

Holocausto Ambiental

Duarte Junior, ex-prefeito de Mariana e secretário-executivo do Coridoce, reforçou o pedido para o presidente Lula, ao lado do advogado-geral da União, e o presidente do STF, Luís Roberto Barroso, se unissem a mesa da negociação. Em referência a fala polêmica do presidente sobre a guerra de Israel, Duarte ainda afirmou que Minas Gerais sofreu um “holocausto ambiental”. A fala foi reforçada pelos outros prefeitos presentes.

“O holocausto que tanto tem se dito é ambiental e é aqui no Brasil. É o que aconteceu aqui, o maior desastre ambiental do mundo, e não é possível que nós vamos continuar falando e não trazendo solução na mesa da repactuação. Depois de nove anos nunca foi falado o nome de um empresário. Quem está ali está sendo enganado pela Vale e pela BHP para ganhar prazo. Se o presidente Lula e o ministro Barroso não assumirem o protagonismo disso, não temos repactuação e estaremos discutindo isso daqui a 10 anos”, declarou. 

O consórcio de municípios afirmou que irá enviar um documento oficial à Advocacia Geral da União (AGU), à presidência da República, aos governadores de Minas Gerais e do Espírito Santo e ao presidente do STF, solicitando a presença deles na mesa de negociação. 

Posicionamento das mineradoras

A Samarco afirmou, por meio de nota, que “com o apoio de suas acionistas Vale e BHP Brasil, reforça o compromisso com a reparação integral dos danos causados pelo rompimento da barragem de Fundão, garantindo total suporte para que a Fundação Renova execute as ações previstas”.

Já BHP disse que “sempre esteve e segue comprometida com as ações de reparação e compensação relacionadas ao rompimento da barragem de Fundão, da Samarco, em 2015” e que “segue disposta a buscar, coletivamente, soluções que garantam uma reparação justa e integral às pessoas atingidas e ao meio ambiente”.

A Vale afirmou que "as negociações seguem em andamento, apesar da pausa de final de ano, conforme publicado no site do TRF-6 à época" que "confia que as partes chegarão a bons termos quanto ao texto que vem sendo conjuntamente construído antes de definir o valor global do acordo". Já a Fundação Renova ressaltou que "foram destinados cerca de R$ 1,58 bilhão em recursos compensatórios para serem aplicados como investimento público nos municípios" e que "ao todo, foram destinados R$ 35,08 bilhões às ações de reparação e compensação até janeiro de 2024". 

A AGU esclareceu, por meio de nota, que “já participa, desde 2022, da Mesa de Repactuação do rompimento da barragem em Mariana (MG)” e que “assim como os municípios da região, a União também considera a atual proposta financeira das mineradoras absolutamente insuficiente e seguirá atuando, com todas as medidas cabíveis, para que os recursos necessários à devida recuperação da Bacia do Rio Doce sejam disponibilizados. 

O TEMPO também procurou a presidência da República e o STF para saber se pretendem participar da mesa de negociação, mas não recebeu retorno. Nesta tarde, a secretária de Estado de Planejamento e Gestão, Luísa Barreto, recebeu os prefeitos em seu gabinete e concordou em levar a solicitação ao governador Zema. 

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