Previdência

Reforma amplia diferenças e gera debate entre policiais civis e militares em MG

Civis alegam que suas regras são mais duras, embora o serviço seja parecido, mas representante dos militares diz que batalha deveria ter ocorrido em Brasília

Por Pedro Augusto Figueiredo
Publicado em 03 de agosto de 2020 | 10:39
 
 
 
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A proposta de reforma da Previdência enviada pelo governador Romeu Zema (Novo) dá continuidade a um processo iniciado na reforma federal em 2019 e aumenta a diferença das regras previdenciárias entre as polícias civil e militar em Minas Gerais.

As duas categorias têm regimes jurídicos distintos. Apesar de subordinada ao governador, a Polícia Militar é regida, em alguns temas, por um estatuto ligado às Forças Armadas, pois é considerada força auxiliar do Exército. A Polícia Civil, por sua vez, tem seu estatuto estabelecido na Constituição Estadual e em leis estaduais.

Na prática, isso significa que, de forma geral, assuntos previdenciários dos policiais militares são tratados no Congresso Nacional, enquanto os dos policiais civis são discutidos nas respectivas assembleias legislativas.

Para a presidente do Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de Minas Gerais (Sindepominas), Maria de Lurdes Camilli, o governo federal excluiu a polícia judiciária da discussão da reforma aprovada em 2019 – a função é exercida pela Polícia Federal e pelas polícias civis. 

Em junho deste ano, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) assinou um parecer estendendo à Polícia Civil do Distrito Federal e à Polícia Federal, segundo Camilli, “quase as mesmas regras” da Polícia Militar, em uma tentativa de consertar, em sua avaliação, o que foi feito na reforma previdenciária federal.

“Só que nada impede que os Estados, até mesmo por força constitucional, façam o seu regramento. O governador poderia aplicar a mesma regra que o parecer da AGU, que foi chancelado pelo presidente da República, para a Polícia Civil em Minas Gerais”, afirma a presidente do Sindepominas.

Antes da reforma federal, tanto policiais civis como militares tinham que contribuir por 30 anos com a Previdência para conseguir a transferência para a reserva. A reforma sancionada por Bolsonaro aumentou o tempo dos militares de 30 para 35 anos. 

Já para os policiais civis, a proposta de reforma do governo de Minas Gerais propõe a criação de uma idade mínima de 55 anos para homens e mulheres. Além disso, a exigência é que dos 30 anos de tempo de serviço, 25 sejam no exercício da função. As regras propostas são as mesmas dos agentes penitenciários, dos agentes socioeducativos e da Polícia Legislativa, que atua na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG).

Há mudanças também na pensão por morte. A família dos militares tem direito ao benefício integral. Já a pensão proposta para o cônjuge do policial civil é de 60% do salário, com um dependente, mais 10% adicionais por cada dependente adicional. A regra é diferente no caso de morte em decorrência da atividade policial, quando será pago o valor integral.

Outra mudança deve ocorrer nas alíquotas de contribuição, historicamente uma pauta dos policiais civis que querem pagar o mesmo percentual que os militares. Até 2019, os militares pagavam 8%, percentual que passou para 9,5% neste ano e chegará a 10,5% em 2021.

Já os policiais civis, assim como o restante dos servidores, pagarão entre 13% a 19%, de acordo com a faixa salarial, se a reforma da Previdência estadual for aprovada na ALMG.

“A PM vai pagar 10,5%, e nós vamos para 14%. Se você olhar o sistema de saúde da PM é diferente do nosso. Eles têm hospitais e convênios com hospitais de ponta. Nós temos hospitais da previdência e ambulatório. Essa é a diferença que está tendo em nosso meio”, disse o presidente do Sindicato dos Servidores de Polícia Civil de Minas Gerais (Sindpol-MG), José Maria Cachimbinho, para quem “a mesma bala que mata o PM mata o policial civil”.

“O sindicato está lutando para fazer essa equiparação. Sabemos que a PM é regida por um estatuto militar ligado ao Exército, e a polícia civil é civil. Mas fazemos quase o mesmo trabalho que a PM faz”, afirma Cachimbinho. “Nós só não usamos farda. Mas o trabalho de investigação, de inteligência, identificação, todo o trabalho de assalto, roubo, sequestro, feminicídio. Tudo isso é trabalho de investigação da Polícia Civil. E eles não querem reconhecer a Polícia Civil do mesmo modo da PM”, conclui.

“Derrota deles se deu em Brasília”, diz presidente de associação militar

O presidente da Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares de Minas Gerais (Aspra-MG), Heder de Oliveira, considera que existe “um engano nisso tudo” ao comentar as diferenças das regras previdenciárias dos policiais civis em relação aos militares.

“Eu não rechaço o pedido deles, mas eu entendo que a derrota deles não vai se dar aqui em Minas Gerais. Ela já se deu em Brasília na reforma da Previdência que atingiu os servidores civis, e eles não se organizaram para que isso não ocorresse com a categoria deles, o que nós militares fizemos”, disse.

Oliveira aponta o que considera desvantagens em relação aos policiais civis, como a aposentadoria exclusivamente por tempo de serviço. Segundo ele, os policiais militares em Minas Gerais entram na corporação com 28 anos de idade, em média. Quando somados os 35 anos de tempo de serviço exigido, na prática os militares seriam transferidos para a reserva com 63 anos, idade superior à idade mínima de aposentadoria dos policiais civis proposta na reforma estadual. 

No entanto, a conta pode ser ligeiramente diferente, já que, dos 35 anos exigidos, apenas 30 têm que ser cumpridos na corporação, o que diminui a idade real apontada pelo presidente da Aspra-MG.

“O que eles estão discutindo de alíquota... a nossa alíquota já está sendo descontada desde abril de 2020. Nós já estamos pagando”, diz, ao comentar outra reivindicação.

“A mesma bala que mata o policial civil e o policial militar mata também o trabalhador, o operário na rua. A diferença é que a Polícia Militar não fecha delegacia ou quartel. As delegacias da Polícia Civil no Estado todo trabalham das 8h às 18h e fecham sábado, domingo e feriado. Após as 18h no sábado, domingo e feriado, só trabalham em regime de plantão, nas Ceflans. A Polícia Militar, não. O quartel não fecha. São 24 horas, 365 dias no ano. Tem essas diferenças basilares”, conclui.

A fala do presidente da Aspra gerou reação da Confederação Brasileira dos Policiais Civis (Cobrapol), que entrou em contato com a reportagem após a publicação da matéria.

“O policial civil tem dedicação exclusiva, assim como o militar: vinte e quatro horas. O militar quando não está no batalhão, está à paisana, está correndo risco da mesma forma que o civil quando ele não está na delegacia. A delegacia de plantão é 24 horas. Temos o Instituto Médico Legal, a perícia. Isso fecha? Não”, disse a diretora de comunicação da Cobrapol, Aline Risi.

“A diferença é que nós não usamos farda, usamos distintivo. No momento que a gente anda com a arma e com o distintivo, faz operação sem farda, estamos correndo o mesmo risco que os policiais militares. É por isso que nós precisamos dessa aposentadoria policial”, explica.

Ela também afirma que a categoria tentou, no Congresso Nacional, estender as mesmas regras dos militares para a Polícia Civil na reforma da Previdência. 

“Os militares e os policiais militares foram protegidos na lei de proteção social dos militares. A gente lutou muito lá. A bancada militar é muito grande e essa lei não passou nem no plenário, foi aprovada de forma sumária em uma comissão”, concluiu Risi.

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