O proletariado do século XXI é outro. Cada vez mais informal. Sem direito a férias, 13º, à assistência de saúde ou à aposentadoria. A paralisação de entregadores e entregadoras de aplicativos nas grandes cidades brasileiras emocionou o país. Um perfil de trabalhador chamado de empreendedor, mas tratado como semiescravo. São prestadores de serviços sem direito a qualquer nível de proteção social, explorados por empresas estrangeiras que mal pagam impostos.
Na maioria, são jovens antecipando a entrada no mercado de trabalho antes mesmo de se qualificarem para ele. Digo com a tranquilidade de quem começou a trabalhar muito cedo como padeiro e que tem muito orgulho de toda a trajetória percorrida até aqui.
Esses jovens têm reivindicações objetivas. Pedem aumento do valor pago por quilômetro rodado, aumento do valor mínimo a ser recebido e o fim do sistema de pontuação, além de seguro de vida, acidente e roubo e do auxílio pandemia. Pautas justas de profissionais superexplorados, que sequer receberam um equipamento de proteção individual das empresas durante a pandemia.
O Legislativo pode e deve atuar para resguardar os direitos básicos a todas as categorias de trabalhadores. Por isso, já estou trabalhando em um projeto para a Câmara dos Deputados que pretende regrar o modelo de contribuição social das empresas de aplicativo, de forma que parte dos seus lucros seja revertida a um fundo financeiro para a seguridade social ou mesmo para a saúde de entregadoras e entregadores.
Defendo a tese de que devemos trabalhar por uma legislação que garanta que os trabalhadores dessa atividade entrem na CLT e possam ter inclusive uma aposentadoria especial, equivalente à dos trabalhadores e trabalhadoras rurais, de 55 para mulheres e de 60 anos para os homens.
Não podemos aceitar tamanha precarização do trabalho. O Congresso, que vem regulamentando interesses de tantos super-ricos, ainda não olhou para esses profissionais, tampouco indicou que iria agir para regulamentar de maneira justa as empresas de aplicativos.
Vale lembrar que não são apenas os profissionais de entrega que estão reclamando, seja pelas taxas abusivas cobradas, pela oferta de cupons que, simplesmente, tiram a margem de lucro dos estabelecimentos ou outros motivos que não param de surgir e só afetam o elo mais frágil dessa cadeia.
O mundo mudou e ele nunca precisou tanto de um pensamento progressista voltado para atender as demandas das novas classes trabalhadoras que vão surgir. O conceito de transformação digital, que transporta a operação de boa parte das atividades de grandes organizações para a internet, não pode ser feito à base da precarização trabalhista.
Já vimos que não podemos contar com um partido dito como “novo” para reformar o capitalismo, dando-lhe um caráter mais humano. Diante da mentalidade escravocrata da elite brasileira, cabe à esquerda fazer o possível para resguardar direitos e salvar vidas, seja na saúde pública durante a pandemia, seja em nome de um projeto generoso de nação.
Basta nos guiarmos pelos postulados do papa Francisco, maior líder humanista global na atualidade, e reconhecer que este modelo de ultraliberalismo predatório é insustentável, tanto do ponto de vista do meio ambiente como do ponto de vista dos direitos mais elementares da convivência democrática.