Política em Análise

A previsível derrota dos liberais

Saídas de Salim Mattar e Paulo Uebel reforçam que equipe econômica tem sido minada pelas vontades do Palácio do Planalto e de seus aliados

Por Ricardo Corrêa
Publicado em 12 de agosto de 2020 | 09:36
 
 
 
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As saídas de Salim Mattar e Paulo Uebel do Ministério da Economia deixam ainda mais clara a derrota dos liberais na batalha que se dá dentro do governo federal. Eles se juntam a outros nomes que já haviam entregado os pontos, como o então presidente do Banco do Brasil, Rubem Novaes, o então secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, e o assessor especial do ministério Caio Megale. Todos, ainda que dando motivações oficiais diferentes, renderam-se às pressões de militares, conservadores fervorosos e os integrantes do centrão que têm olhos nas eleições que se avizinham.

Qualquer pressão, porém, ficaria limitada se o presidente fosse de fato um convicto liberal, o que não é o caso. Ainda que o próprio Paulo Guedes tenha feito constar na campanha que Jair Bolsonaro tinha compromisso com essa agenda, isso nunca foi verdadeiro. Por isso, absolutamente nada de relevante saiu do papel, exceto a reforma da Previdência, que já havia sido colocada no governo do presidente Michel Temer e que, por isso, já tinha um debate maduro na sociedade. De resto, o que temos é um ministério da Economia tentando emplacar sua agenda e sendo sabotado pelo presidente, assim como já se deu com o ministério da Saúde na época de Luiz Henrique Mandetta e o da Justiça e Segurança Pública, com Sergio Moro.

A diferença é que Paulo Guedes optou por resistir e tentar virar o jogo. Mas ontem, na coletiva em que confirmou a saída dos secretários especiais, ele deixou clara sua insatisfação. Não teve pudores em responsabilizar o presidente, além do Congresso, pela demora na implantação de sua agenda. Enfatizou que, por ele, privatizaria tudo, e que a reforma administrativa também já estaria colocada. Ou seja: deu razão aos que estavam saindo.

O ponto de maior insatisfação por parte de Guedes foi a tentativa de alguns conselheiros do presidente de convencê-lo a apostar em uma flexibilização do teto de gastos. O ministro da Economia deixou claro que isso poderia levar a um impeachment. Disse que Bolsonaro já percebeu isso mas, na realidade, estava ali dando um recado claro ao presidente. Apostaria eu que, caso seja vencido nessa discussão, Guedes pedirá o boné. Mas nesse caso ele não está sozinho. Mesmo o presidente da Câmara, que estava ao seu lado na coletiva, também acha que não é hora de derrubar o teto. Como é ele quem pauta, por mais que parcela relevante do centrão e do bolsonarismo esperneie, o tema dificilmente será pautado por enquanto. Para a sorte de Bolsonaro.

Mas o presidente está com olhos em 2022. Não pensa em outra coisa. Por isso, agora, só pensa em sua versão do Bolsa Família, em pautas populares e que não desagradem a ninguém, principalmente às corporações, da qual sempre fez parte como representante dos policiais. Militar e ‘sindicalista de farda’, Bolsonaro está sendo o Bolsonaro que sempre foi. Ninguém deveria estar surpreso.

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