A Câmara dos Deputados acelerou as discussões sobre mudanças no sistema eleitoral e criou uma comissão para analisar a possibilidade de trocar do modelo proporcional pelo distritão. Como qualquer mudança, traz vantagens e desvantagens, mas o que está em debate entre os atuais deputados, na prática, é o quanto esse sistema, utilizado em pouquíssimos países do mundo, pode contribuir para que eles não percam as vagas conquistadas na corrida eleitoral de 2018.
Do ponto de vista das vantagens da mudança de sistema, temos como ponto central a simplicidade do modelo. É muito mais fácil para o eleitor entender uma regra em que os mais votados em cada Estado levam as vagas de deputados estaduais e federais, sem que seja necessário fazer qualquer outro cálculo. Assim, cada um escolhe seu candidato e não corre o risco de ajudar outro parlamentar, com o qual não concorda, a se eleger. O distritão, assim, acaba com o chamado “efeito Tiririca”, que faz hoje com que um parlamentar com muitos votos consiga levar outros com votações bem menos expressivas, já que as vagas são distribuídas de acordo com a votação total em nomes de uma legenda.
Defensores do distritão afirmam, também, que ele pode ajudar a diminuir o número de candidatos, facilitando a escolha do eleitor. Como há concorrência direta mesmo dentro das legendas, lançar muitos candidatos pode prejudicar a todos daquele grupo, em vez de ajudar a aumentar o número de vagas. Além disso, os defensores do distritão acham que, como consequência, isso diminuiria também o total gasto nas campanhas.
Dependendo do ponto de vista, pode-se valorizar também a liberdade dada aos candidatos e, como a adoção do sistema acabaria com a cláusula de barreira, poderia salvar as legendas pequenas da extinção.
A lista de pontos negativos, porém, parece bem maior atualmente. Não por acaso, apenas quatro países no mundo usam o sistema do distritão tal como está sendo discutido no Brasil. Os dois maiores países a utilizar o modelo são o Afeganistão e a Jordânia. Pelo mundo, prefere-se muito mais o sistema proporcional (América do Sul quase toda e parte da Europa), o distrital misto (países como a Alemanha e o México) e o distrital puro (Estados Unidos e Canadá).
A principal desvantagem do distritão é a possibilidade de que os mesmos parlamentares perpetuem-se no poder ao impedir o surgimento e a candidatura de novas lideranças. Como vão todos competir com todos, os atuais detentores de mandatos farão de tudo para impedir que novos nomes concorram por seus partidos. Com isso, quem quiser entrar na política só conseguirá fazê-lo praticamente comprando a vaga. Isso tende também a enfraquecer a representação de minorias em detrimento de candidatos fortes em uma determinada região independentemente de suas ideias.
Além dos detentores de mandatos, os mais ricos e as celebridades teriam muito mais chance na eleição. Há o risco de que dominem quase que a totalidade das vagas disponíveis no Parlamento. Haveria menos pluralidade no perfil dos eleitos.
A personalização das campanhas faria com que os partidos perdessem ainda mais relevância. O foco seria todo na pessoa do candidato e menos nos ideais que podem conduzir a uma melhor organização das bases aliadas dos eleitos. Assim, a negociação de um governo seria mais difícil e ainda mais baseada em benefícios ofertados a um parlamentar. Não haveria acordo com partidos para sustentar um governo, mas uma negociação no varejo, o que gera risco de aumento do fisiologismo.
Haveria também um incentivo à fragmentação partidária, o que buscou-se reduzir nas últimas reformas eleitorais. Não haveria cláusula de barreira ou coisa do tipo e, como os atuais detentores de cargos dificultariam a entrada de novas lideranças na corrida eleitoral, muitos buscariam formar seus próprios partidos.
Um último ponto que eu gostaria de destacar é o desperdício do voto. Hoje, por mais que você não tenha votado em alguém que se elegeu, seu voto de alguma forma ajuda a levar alguém daquele mesmo campo político, daquela mesma legenda, ao poder. Com a mudança do sistema, a maior parte dos votos seria jogada fora. Se você não tiver votado um dos 513 eleitos no Brasil, seu voto de nada valeu para o Parlamento. É quase uma eleição majoritária em turno único e sem pesquisa eleitoral para que você possa calibrar seu voto.
Defensores do distritão argumentam que esse seria um caminho importante para adotar um sistema considerado mais adequado pelos especialistas, o do distrital misto, que combina a maior votação em distritos (regiões de um Estado) com um sistema proporcional para corrigir distorções e permitir uma maior pluralidade e representação. Sabe-se que, uma vez adotado o distritão e beneficiados os parlamentares atuais, porém, dificilmente eles vão dar mais esse passo.