Leis no Brasil costumam ser muito malfeitas e a que regulamentou a delação premiada não escapa à regra. Não por acaso, deu brechas para uma discussão processual que está agora no Supremo Tribunal Federal (STF), que retoma hoje um julgamento a respeito.  Em questão está a reclamação de advogados de que um réu deveria ter o direito de fazer suas alegações finais necessariamente depois daquele que é colaborador da Justiça. 

Para que as pessoas entendam, a lei determina que a defesa é sempre a última a falar no processo. Portanto, na fase das alegações finais, quando os dois lados fazem os últimos apelos ao juiz antes deste decidir o caso, primeiro fala o Ministério Público e, depois, a defesa do réu. A lógica disso é a de que aquele que é acusado tem direito de se manifestar sobre cada pequena questão apontada pela acusação, o que faz todo sentido. Nunca houve dúvidas sobre isso.

Com o uso frequente da delação premiada, porém, surgiu esse novo debate, já que advogados alegam que, ao se tornar colaborador, um réu passa quase a ser sócio da acusação. Assim, os outros réus deveriam, por consequência, ter o direito de falar depois deles.

Embora seja uma tese criativa, carece de consistência. Alegações finais de réus, colaboradores ou não, são usadas para defender o direito a menor penalização possível. Não se inova, nem se apresenta acusação qualquer. Além do mais, é fora de propósito querer mudar a regra do jogo sem que haja qualquer previsão legal ou mesmo que tenha havido controvérsia  doutrinária razoável a qualquer tempo a esse respeito. Parece realmente um argumento de última hora manejado para virar a mesa na Lava Jato e anular processos.

Se tese prosperar, a maior parte dos processos da operação será afetada, o que seria um desserviço ao combate à corrupção no país. Não sou dos que considera a Lava Jato imaculada. Vejo erros, excessos, mas não são esses. Não há dúvida de que a operação levou a outro patamar o combate à corrupção no Brasil. Um revés nesse julgamento seria, sem dúvida alguma, um incentivo aos que pouco se importam com a lei.