Câmara Municipal

Vereador acusado de 'rachadinha' perde mandato por faltar a sessões em Nova Lima

Tiago Tito (PSD) foi preso em maio deste ano sob acusação de ameaçar uma servidora que se recusou a participar do esquema de corrupção

Por José Vítor Camilo e Franco Malheiro
Publicado em 14 de setembro de 2021 | 22:37
 
 
 
normal

O vereador Tiago Tito (PSD), preso em maio sob acusação de praticar o crime chamado de "rachadinha", perdeu o seu mandato na Câmara Municipal de Nova Lima, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, por ter deixado de comparecer a um terço das sessões ordinárias da Casa em 2021. A decisão contou com a unanimidade dos parlamentares durante a sessão plenária realizada na noite desta terça-feira (14). 

O anúncio foi feito nas redes sociais da Câmara do município. "A Câmara Municipal de Nova Lima aprovou por unanimidade o Projeto de Decreto Legislativo 392/2021 que declara a perda de mandato do vereador Tiago Tito por ter deixado de comparecer à terça parte das sessões ordinárias da Câmara em 2021", diz a publicação. 

Mais cedo, o relatório da Comissão Especial já tinha sido aprovado também por unanimidade, concluindo que o vereador deveria perder o mandado com base nos termos do artigo 43, inciso III do Regimento Interno da Câmara Municipal de Nova Lima e do artigo 39, inciso III, da Lei Orgânica do Município de Nova Lima.

Com a perda do mandato, quem assume a vaga é o suplente de Tito, do mesmo partido do parlamentar, Silvânio Aguiar (PSD). A reportagem tentou ouvir Aguiar mas ele não respondeu as mensagens.  

Processo por quebra de decoro

Paralelamente à Comissão Especial criada para deliberar sobre o Projeto de Decreto Legislativo 392/2021 que cassou o mandato do parlamentar por falta, foi instaurada na Câmara de Nova Lima uma comissão processante para analisar um processo de cassação por quebra de decoro baseado na prisão do vereador, em maio deste ano, em que ele é supeito de participar de um esquema de rachadinha. 

De acordo com a vereadora Juliana Salles, que presidiu as duas comissões, o projeto de decreto foi enviado pela Mesa Diretora, quando completou o prazo limite de faltas, já que ele, por estar preso, não participava das reuniões ordinárias. Mas ela acusa o vereador de tentativa de obstrução dos trabalhos da comissão processante. 

"A postura do vereador durante as oitivas foi lamentável. Em várias oportunidades ele tentou me deslegitimar na condição de presidente e mulher e também zombou de testemunhas. Um verdadeiro show de horror.  Além disso, ele tentou em duas oportunidades impedir o prosseguimento dos trabalhos judicializando a demanda", afirmou a vereadora.

Segundo ela, na primeira tentativa de judiciliazação, Tito alegou que a comissão não garatiu a ampla defesa e contraditório, no entanto, a Jutiça indeferiu o pedido de suspensão. Na segunda, a defesa do veredor entrou com pedido alegando que a formação da comissão não respeitou o crítério de proporcionalidade partidária - que é manter a igualdade de representação de cada partido na comissão -, e, dessa vez, a Jutiça acatou solicitou a paralização.

"Ele conseguiu a suspensão dos trabalhos da comissão bem no dia em que estava marcado para que pudéssemos inquiri-lo e assim ouvir a sua versão dos fatos. A oitiva seria dia 13 de agosto a liminar saiu no dia 12", relembra.

A Câmara recorreu na Justiça por não concordar com o entendimento do Juiz. No entanto, com a cassação de Tito por meio do projeto de decreto, a ação perde objeto. 

Segundo a vereadora, a coposição atual da Câmara de Nova Lima, formada por 10 parlamentares, é atípica, uma vez que pelo dois vereadores não poderiam participar por estarem envolvidos direta ou indiretamente na investigação que prendeu Tito, além do presidente que não pode participar e do próprio vereador investigado.

"Entendemos que o critério legal para composição da comissão processante é o sorteio por disposição expressa em lei. Existe, inclusive, precedentes do STF nesse sentido. Mas o judiciário entendeu diferente pelo fato de dois dos membros serem do mesmo partido", explicou a parlamentar. 

De acordo com ela, todo o conteúdo colhido durante os trabalhos da comissão processante, como documentos, áudios e a transcrição da oitivas de testemunhas será entregue ao MP que investiga o caso no âmbito da Operação Contrato Leonino. 

"O vereador foi preso por suspeita de “prática de rachadinha” além de ameaça a funcionária que fez a denúncia do suposto esquema. Os fatos são muito sérios, inclusive, encaminharei ao ministério público todas as provas coletadas durante o processo", garantiu. 

Rachadinha

O vereador Tiago Tito e o chefe do gabinete dele foram presos no dia 11 de maio deste ano sob a suspeita de ameaçar uma assessora parlamentar que se negou a participar de um esquema de “rachadinha” (devolução de parte da remuneração de servidores públicos a políticos) organizado por eles. Segundo o Ministério Público, a ex-funcionária relata que chegou a ter o carro queimado a mando de Tito.

O vereador e o chefe de gabinete são investigados na Operação Contrato Leonino, que apura crimes cometidos dentro da Câmara Municipal da cidade, incluindo rachadinhas. A operação é realizada pela Polícia Civil em parceria com o Ministério Público de Minas Gerais.

Ao MPMG, a assessora ameaçada detalhou o esquema. Ela recebia, em um primeiro momento, salário de cerca de R $3 mil, repassava quase R $2 mil e ficava com o restante. De acordo com o depoimento da vítima, as ameaças começaram quando ela recebeu um aumento e decidiu não mais participar do esquema.  “Ele passou a receber quase R $9 mil, continuaria recebendo R $2 mil e repassaria cerca de R $7 mil  para o parlamentar”, explicou o promotor Fabrício Fonseca

Com o aumento do salário, a ex-assessora teve benefícios cortados. Por isso ela deixou de repassar ao vereador parte do seu salário. Ainda de acordo com Fonseca, as ameaças teriam se intensificado quando em um rede social surgiu o rumor que a assessora iria denunciar o caso. 

Segundo o promotor, o valor desviado e a maneira como o dinheiro das rachadinhas era lavado ainda não foram descobertos. 

Além do crime de ameaça e rachadinha, os investigados são suspeitos de praticar os crimes de associação criminosa, corrupção ativa e passiva, falsidade ideológica, dispensa irregular de licitação e lavagem de dinheiro. Se condenados, podem cumprir de 2 a 12 anos de prisão.

Nota da defesa de Tiago Tito:

"Após conseguirmos suspender judicialmente o procedimento de cassação, por suposta quebra de decoro parlamentar, devido ao reconhecimento de várias ilegalidades praticadas pela comissão processante (decisão anexa), a Câmara de Nova Lima instaurou, há menos de 15 dias, outro procedimento visando a perda do mandato do vereador Tiago Tito. Desta vez, por suposta ausência de comparecimento à terça parte das sessões ordinárias anual. 

Em 01 de setembro de 2021, o vereador Tiago Tito recebeu uma intimação, para apresentar defesa no prazo de cinco dias, desacompanhada da ata da sessão do dia 31/8, na qual foi lido o projeto de decreto legislativo que declarou a perda de seu mandato. 

No dia 10 de setembro de 2021, antes de apresentar qualquer defesa, protocolamos um requerimento denominado “chamamento do feito a ordem”, pugnando pela concessão do prazo legal de 10 dias, para apresentação de defesa, em observância ao disposto no art 49, do regimento interno da Câmara, que prevê a adoção do rito insculpido no decreto 201/67, que não dispõe em nenhum dos seus art's. um prazo tão exíguo de 5 dias. O único prazo previsto no decreto para defesa era de 10 dias. Ressaltamos que, o regimento interno e lei orgânica também não fixa nenhum prazo de 5 dias. 

Pedimos então a apresentação da ata da reunião, que aconteceu no dia 31 de agosto de 2021, para analisar a regularidade formal dos atos praticados pela presidência da casa legislativa em relação ao procedimento instaurado e também em relação a comissão constituída. 

É importante frisar que, o vereador não foi intimado a comparecer na sessão em 31 de agosto, nem na sessão do dia 14 de setembro de 2021, o que seria possível virtualmente. 

Para surpresa de Tiago e equipe jurídica, na última terça-feira (14/9), enquanto aguardávamos receber o requerido acima, fomos surpreendidos com a decisão declarando a perda do seu mandato, sem que pudéssemos apresentar qualquer defesa.

Para tanto, na sede de declarar a perda do mandato, transformaram o requerimento mencionado citado anteriormente, em uma defesa. Passaram um trator sobre o devido processo legal, o contraditório e a ampla defesa previstos no art. 5 da CF.

Um verdadeiro absurdo jurídico. Ainda consideraram outro requerimento que elaboramos no dia 31/8, antes mesmo de ser intimado formalmente sobre o presente procedimento, onde foi solicitado a participação do vereador nas sessões plenárias de forma virtual dentro do presídio, como outra defesa. 

Em relação às faltas as sessões, esclarecemos que, mais de 90% foram justificadas, sendo que nas respectivas atas constam “ausente justificadamente” o vereador Tiago Tito. 
Tal fato demonstra um comportamento desleal, arbitrário e contraditório em relação ao vereador, ao utilizar como motivo para a perda do seu mandato faltas que foram devidamente justificadas e aceitas pela presidência da Casa Legislativa de Nova Lima, conforme comprovam as atas das sessões.

Não houve justa causa sequer para a instauração do procedimento, pois Tito está impossibilitado de comparecer presencialmente as sessões, em razão de estar custodiado pelo estado, não deixando de comparecer por ato de voluntariedade, mas sim por estar privado de participar das sessões presencialmente. 

Por fim, informamos que, serão tomadas todas as providências jurídicas contra essa forma de arbítrio praticada na sessão de ontem (14/09), no intuito de que os princípios existentes no estado democrático de direito sejam respeitados.

Em tempo, cabe esclarecer que toda esta situação só está acontecendo devido a uma denúncia infundada de uma ex assessora do vereador, que admitiu em áudio gravado, em dezembro de 2020, que sua versão dos fatos contadas anteriormente, eram mentirosas. Seguem os áudios que já foram encaminhados à Justiça.

Atenciosamente, 

Equipe Jurídica do Vereador Tiago Tito"

Notícias exclusivas e ilimitadas

O TEMPO reforça o compromisso com o jornalismo profissional e de qualidade.

Nossa redação produz diariamente informação responsável e que você pode confiar. Fique bem informado!