Os primeiros resultados do crescimento da economia brasileira neste início de 2018 são, efetivamente, inexpressivos face à dimensão dos sacrifícios a que a população foi submetida nos dois últimos anos, em termos de desemprego e de queda no padrão de vida. Coloca-se em questão, assim, o marketing político de que a atual administração é um caso de sucesso no campo econômico.
O crescimento econômico foi praticamente nulo no primeiro trimestre do ano, a taxa de desemprego ainda é dramática e o espaço das incertezas se ampliou por causa das indefinições no ambiente político e dos impactos adversos do crescente processo de protecionismo econômico da administração Trump.
Os economistas são ardilosos para justificar e racionalizar seus erros de análise e de previsão sobre o futuro da conjuntura econômica. Utilizam, sem cerimônia e sem rigor técnico, a teoria das expectativas racionais para alegar que o crescimento demora a chegar porque a crise foi profunda e ainda não se conseguiu promover a reversão das expectativas de quem investe, de quem produz e de quem consome.
Expectativa racional é, em economia, um conceito inovador e analiticamente poderoso para predizer eventos portadores de mudanças na realidade econômica. Mas pode também se transfigurar em conceito abstrato, não mensurável, propenso às armadilhas intelectuais e útil para racionalizar argumentos ad hoc para explicar equívocos imanentes da política econômica.
Os economistas adotam também, como comunicação social, atribuir à inépcia da classe política os atrasos e os percalços na implementação do programa de equilíbrio fiscal com expansão econômica. Afirmam que há um descompasso entre o tempo das decisões econômicas e o tempo das decisões políticas que aumenta o custo de oportunidade social da política econômica em torno do desemprego, da falta de investimentos e da concentração da renda e riqueza.
Ocorre, porém, que o tempo da política é mais acelerado, menos flexível, menos tolerante e mais propenso a rupturas e descontinuidades. Uma população altamente mobilizada pelas práticas recentes de ação coletiva, que vivenciou pelo menos uma década de progresso social com melhorias inquestionáveis na distribuição de renda, não está disposta a se conformar com seu empobrecimento e com sua decadência econômica e social. Particularmente, quando assiste à concentração da riqueza financeira induzida por medidas de austeridade socialmente assimétricas e pelo descortinamento de práticas inusitadas de corrupção sobre os recursos públicos.
Não se pode, pois, excluir o risco de uma nova, ainda que suave, recessão no país, tendo por origem a lenta cadência do Banco Central em promover a reestruturação do atual sistema financeiro através de ações reformistas contundentes que quebrem o oligopólio dos grandes bancos, que estimulem a concorrência no setor, que reduzam as margens de rentabilidade dos rentistas e que evitem a captura política de uma instituição que cuida do interesse público por outras instituições que cuidam diuturnamente da especulação financeira.
Enfim, a herança da crise passada está depositada no sistema financeiro. Esse sistema tem operado veladamente num cenário em que as experiências passadas formatam suas decisões sobre o presente e o futuro. Enquanto isso contribui para o desequilíbrio patrimonial de empresas e famílias, que se veem endividadas a taxas nominais de juros que constituem uma aberração numa economia com um bem-sucedido processo de desinflação e uma inequívoca restrição à retomada do crescimento econômico. As sementes de uma futura instabilidade econômica podem estar, pois, plantadas no sistema financeiro. Como afirmaria Gramsci, essa crise poderá emergir se o velho sistema financeiro não morreu e o novo ainda não nasceu.
- Portal O Tempo
- Opinião
- Paulo R. Haddad
- Artigo
O risco de um novo mergulho recessivo na economia brasileira
Clique e participe do nosso canal no WhatsApp
Participe do canal de O TEMPO no WhatsApp e receba as notícias do dia direto no seu celular
O portal O Tempo, utiliza cookies para armazenar ou recolher informações no seu navegador. A informação normalmente não o identifica diretamente, mas pode dar-lhe uma experiência web mais personalizada. Uma vez que respeitamos o seu direito à privacidade, pode optar por não permitir alguns tipos de cookies. Para mais informações, revise nossa Política de Cookies.
Cookies operacionais/técnicos: São usados para tornar a navegação no site possível, são essenciais e possibilitam a oferta de funcionalidades básicas.
Eles ajudam a registrar como as pessoas usam o nosso site, para que possamos melhorá-lo no futuro. Por exemplo, eles nos dizem quais são as páginas mais populares e como as pessoas navegam pelo nosso site. Usamos cookies analíticos próprios e também do Google Analytics para coletar dados agregados sobre o uso do site.
Os cookies comportamentais e de marketing ajudam a entender seus interesses baseados em como você navega em nosso site. Esses cookies podem ser ativados tanto no nosso website quanto nas plataformas dos nossos parceiros de publicidade, como Facebook, Google e LinkedIn.
Olá leitor, o portal O Tempo utiliza cookies para otimizar e aprimorar sua navegação no site. Todos os cookies, exceto os estritamente necessários, necessitam de seu consentimento para serem executados. Para saber mais acesse a nossa Política de Privacidade.