Publicamente pode parecer impensável ou incoerente, mas nos bastidores de Brasília sabe-se que o presidente Jair Bolsonaro não se opõe em nada à possibilidade de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva saia da prisão, assim como o Partido dos Trabalhadores não faz qualquer esforço por um eventual impeachment do atual chefe do Executivo. Ambos os lados continuarão desancando publicamente um ao outro, mas no escurinho dos cálculos políticos as intenções são bem diferentes.

Ontem, o colunista Josias de Souza disse que um senador, em visita ao Palácio do Planalto, ouviu a tese, já aventada por diversas figuras da política, da própria boca de Bolsonaro. Corrobora esse entendimento o episódio do tuíte apagado sobre a prisão segunda instância na conta do presidente, na semana passada. Na ocasião, o filho de Bolsonaro, o vereador Carlos, admitiu ter publicado, sem a autorização do pai, o texto que defendia que o STF não mudasse a tese. Se precisou apagar, é porque Bolsonaro não concorda com ela. Além do mais, após o pacto anunciado entre Dias Toffoli e Bolsonaro, o fato de o presidente do Supremo ter pautado a rediscussão da segunda instância indica que não há qualquer pressão do Planalto contra isso.

Se a questão for apenas o cálculo político, Bolsonaro está certo. Com Lula livre, a tendência é que seja mais fácil para ele reunir sua tropa. A ameaça de volta ao poder da esquerda comandada pelo ex-presidente é o principal combustível que move o bolsonarismo. E no atual momento, trocar a briga com aliados por aquela feita contra adversário condenado pela Justiça é bem melhor para Bolsonaro.

No outro lado, o cálculo é o mesmo. Sabe-se que o ex-presidente Lula deu a ordem aos petistas que não encampem no momento qualquer tese de impeachment de Bolsonaro. Eles preferem ir para uma eleição contra o atual presidente após tê-lo desgastado por quatro anos. Não quer cometer o mesmo erro dos tucanos, por exemplo, que ajudaram a abreviar o mandato de Dilma e viram Bolsonaro atropelar suas pretensões na hora em que o Brasil foi às urnas. No frigir dos ovos, momentaneamente, Bolsonaro é Lula livre e o PT é “ele sim”.