Os diferentes períodos do ano em que torneios internacionais de caratê estavam marcados mostram como a pandemia acertou em cheio o calendário da modalidade em 2020. Enquanto a etapa de Marrocos da Premier League e o Campeonato Europeu estavam agendadas para março, o Mundial tinha previsão de acontecer em novembro. O coronavírus forçou o adiamento dos eventos, deixando os atletas, que brigam por vaga no Mundial e Olimpíada de Tóquio, sem mais nenhum torneio oficial até a virada para 2021.
O peso do próximo ano promete ser maior, visto a proximidade da Olimpíada de Tóquio. O gaúcho Douglas Brose, de 34 anos, precisa ter 'um olho no peixe e outro no gato' para que siga com boa pontuação nos rankings que dão vaga no Mundial e nos Jogos Olímpicos. Isso porque ele terá foco em duas categorias para estar presente nos dois torneios.
Ele ainda busca confirmar presença nas duas competições e não pode se dar ao luxo de priorizar uma ou outra.
Originalmente, ele compete na categoria 60kg, que já lhe rendeu dois títulos do Mundial. No entanto, a restrição desta categorias na Olimpíada pode forçá-lo a competir na categoria até 75kg, o que certamente vai lhe exigir mais, principalmente da parte técnica e tática. "Não me decidi ainda sobre em qual delas vou focar, o treino é bem parecido e não dá pra mudar a composição corporal. O que vou precisar mudar será a estratégia, manter uma distância maior. Por eu ter uma estatura mais baixa, vou precisar chegar e sair rápido dos ataques. Não posso querer mudar a minha característica de luta, até porque não tenho envergadura pra isso, estarei diante de atletas maiores. A questão será reforçar essa técnica de chegar rápido para os golpes, aplicá-los e já me afastar para evitar um perigo maior", conta.
Enquanto considera a possibilidade de atuar em uma categoria mais pesada, Douglas sabe que não pode se esquecer da sua especialidade, que ainda estará em jogo, pensando na participação no Mundial. "É difícil dizer agora em qual focar, o treino é o mesmo. Tenho que esperar pelo calendário, são duas categorias importantes, uma me dá o ranking para participar do Mundial e a outra pode me classificar para a Olimpíada. A ideia é tentar me manter na média para estar dentro nestas duas pontuações. Sem calendário, fica complicado dizer onde focar neste meio tempo", admite.
Apesar de lamentar o cancelamento dos torneios, ele viu o lado positivo, já que tinha presença garantida no Pré-Olímpico após vencer seletiva em território nacional na categoria até 75kg. "Pra mim, fez pouca diferença, ganhei tempo para treinar mais e manter o ritmo", sinaliza.
Sonhos vivos
Ter o feito de conquistar duas medalhas de ouro para o Brasil em Mundiais não tira o gás de Brose para momentos que garante que serão históricos na sua carreira. "São dois objetivos que faltam na minha carreira: o tri do Mundial e ser campeão olímpico. É o que quero antes de me aposentar. um ouro em cada uma destas competições é tudo que quero para encerrar minha trajetória profissional como pretendo", projeta. Douglas tem, até hoje na lembrança, a luta da final do primeiro Mundial conquistado, em 2010, na Sérvia, que lhe serve de combustível.
"Ali foi o momento mais marcante da minha vida no caratê. Foi um feito histórico, há anos que o Brasil não tinha um campeão mundial no masculino. Até então, nosso país não era tão conhecido no cenário internacional, foi uma conquista marcante", afirma. O segundo ouro veio em 2014. Além disso, ele soma, no Mundial, uma prata em 2012 e um bronze em 2008.
Privilégio
Apesar da pandemia, Douglas mantém os treinamentos nos fundos da casa dos pais em Florianópolis (SC). Ele teve algumas vantagens nas suas atividades, começando não só pelo espaço para treinar, como por ser casado com uma ex-atleta e atual treinadora da modalidade, que lhe dá todo o suporte profissional para estar no melhor nível possível.
Ele ainda aproveita a proximidade de casa para treinar com Vinicius Figueira, brasileiro que também briga por vaga em Tóquio. "O espaço é reduzido, mas montamos um tatame e conseguimos fazer uma boa adaptação. É um privilégio treinar com o Vinicius e o auxílio da minha esposa, que também treina comigo, é bastante benéfico. Ela me orienta e faz as correções, sempre me ajudando bastante", agradece.
Curso online
Douglas teve a iniciativa, nas últimas semanas, de realizar um treinamento online, que teve muitos inscritos interessados em absorver o conhecimento de um dos maiores nomes do caratê brasileiro em todos os tempos. "Foi muito legal ver a participação de todos, foram quase 30 inscritos. A interação foi positiva, o pessoal aprovou e pretendo dar continuidade. Espero que isso se torne presencial quando a pandemia passar", aponta.
O tempo sem competições e viagens permitiu que ele se dedicasse, ainda mais, a Arazawa, sua empresa de material esportivo.
"Menos mal que ela sempre funcionou por meio de e-commerce, mas agora deu pra dedicar a outros aspectos que eram necessários, fizemos algumas melhorias. Mas a pandemia também nos prejudicou, o fluxo de vendas diminuiu em 90%. O jeito foi adaptar e aproveitar o momento para corrigir estes detalhes e voltar ainda mais forte", diz.