O último capítulo do futebol brasileiro envolvendo justiça desportiva, liminares, autorizações e incertezas deixa claro como o cenário nacional tem a insegurança jurídica como companheira. Foi faltando 10 minutos para o horário marcado que Palmeiras e Flamengo tiveram a confirmação de que jogariam no último domingo pelo Campeonato Brasileiro. “Este fato, por si só, já é surreal. O estatuto do torcedor, por exemplo, foi completamente ignorado", resume Felipe Mourão, advogado especialista em direito esportivo.
Os 19 casos de Covid-19 no elenco do Flamengo foram o motivo apontado pela Sindiclubes (Sindicato dos Funcionários de Clubes do Rio), para o adiamento da partida, alegando risco para a segurança dos atletas. Depois de ter seu pedido aceito pelo Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RJ), por meio de liminar, a decisão foi desfeita pelo Tribunal Superior do Trabalho. Antes disso, o Flamengo já havia procurado CBF e o STJD para tentar o adiamento da partida, sem sucesso.
O detalhe que chama atenção é a Justiça Comum ter sido acionada, algo que vai contra as diretrizes elaboradas pela CBF e até pela FIFA, que indicam que somente as esferas desportivas deveriam ter a missão de fazer parte de todo o processo de resolução de problemas. Uma punição pode ocorrer para o Flamengo se ficar comprovada algum tipo de ligação com a tentativa de adiamento.
Nesta segunda-feira, o Sindiclubes emitiu nota informando que desistiu da ação, que pedia que treinos, viagens e jogos do Flamengo não acontecessem durante 15 dias para que o clube tivesse tempo hábil de recuperação dos atletas infectados. Caso o pedido na Justiça fosse mantido e considerado, o Flamengo corria risco de não ter autorização para entrar em campo nos próximos dias, incluindo partidas pela Libertadores e Brasileirão.
Entre idas e vindas, decisões de um lado e de outro, clubes, jogadores, torcida e imprensa ficaram nesse 'vai-não-vai', tendo uma definição faltando poucos minutos pra bola rolar. "Em um período em que falamos de clube-empresa e profissionalização, de nada vai adiantar cada um olhar para o seu umbigo com tamanha insegurança jurídica. O 'macro' não está na rota de visão, não se vê o futebol como um produto. Essa situação de sequência de liminares não deve acontecer. Como você explica para um dono de fundo estrangeiro, que gostaria de aplicar seu dinheiro no Brasil, todo este contexto? Lembro do presidente do Orlando City afirmando que nunca investiria no futebol brasileiro justamente pela organização que não existe por aqui. Mesmo sem nunca ter se classificado para os play-offs da MLS, o clube teve uma grande valorização pois faz parte de um torneio que dá lucro. É preciso mudar a mentalidade estrutural e o pensamento dos clubes e das organizações do futebol brasileiro", comenta Gustavo Pires de Souza, professor especialista em Direito Desportivo.
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