Especialistas de diversas áreas se uniram nessa sexta-feira (2), em Belo Horizonte, para rebater a proposta do governo federal de limitar gastos públicos pelos próximos 20 anos como única saída para a crise. Os acadêmicos defendem corte de juros e amortizações da dívida como soluções para o equilíbrio das contas. A chamada “PEC do Teto”, medida elaborada pelo núcleo econômico do governo do presidente Michel Temer (PMDB), deve ser aprovada em breve pelo Senado, mas encontra forte resistência na sociedade e foi classificada como “ditadura econômica” pela comunidade acadêmica.
“Pelas próximas duas décadas, o eleitorado perderá a capacidade de escolher o plano econômico que quer para o governo seguinte. A medida incorrerá em sérias consequências à população que depende dos serviços públicos, principalmente nas áreas de saúde e educação”, alertou o professor da Unicamp Fernando Nogueira da Costa, especialista em macroeconomia e teorias monetária e financeira.
O professor também sugere que seja incluída no ajuste fiscal uma alteração na estrutura tributária brasileira, começando pelo retorno da taxação de lucros e dividendos.
O diagnóstico do governo para conter o rombo financeiro é condenável, segundo o economista, que considera os altos juros o grande problema do Brasil, responsável por encarecer a dívida pública, que já chega a 70% do Produto Interno Bruto (PIB). “Devemos atacar o déficit nominal, que incorpora os juros da dívida”, afirmou durante seminário na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Dados do Banco Central apresentados por Nogueira mostram que os gastos do governo com juros ficaram em R$ 295 bilhões de janeiro a setembro deste ano. No mesmo período de 2015, as despesas com juros foram de R$ 408 bilhões. Nos 12 meses até setembro, o déficit nominal foi de 9,4% do PIB, enquanto o déficit primário foi de 3,08%. “A solução é baixar os juros, senão não resolve o problema. Pode cortar gastos à vontade, mas, com juros tão elevados, o problema continuará. Então, o diagnóstico está errado e, portanto, a terapia é a errada”, pontuou.
A Proposta de Emenda à Constituição 55, se aprovada, prevê que os gastos públicos com saúde, educação, transporte, segurança, entre outros, só poderão aumentar de acordo com a inflação do ano anterior. As classes menos favorecidas, segundo os críticos da PEC do Teto, serão atingidas em cheio pelo congelamento nos investimentos sociais.
Tecnologia. Estimativa da Pró-Reitoria de Planejamento e Desenvolvimento (Proplan) da UFMG aponta que, se a PEC 55 estivesse em vigor nos últimos dez anos, a universidade já teria perdido R$ 774,8 milhões em investimentos. Esse é o temor da classe científica, que define a proposta como “grave e irreversível” para o desenvolvimento do país.
Para o diretor de Ciência, Tecnologia e Inovação da Fapemig, Paulo Beirão, a PEC do Teto condenará o país a ser produtor de bens primários e commodities. “Vão arrasar com o esforço de gerações para criar uma ciência e tecnologia no Brasil. Países em crise, como a Coreia, fizeram justamente o inverso”, lamentou.
Performance
Professores, alunos e servidores simulam os efeitos da PEC 55
Cerca de 200 professores, servidores técnico-administrativos e alunos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) fizeram na manhã dessa sexta-feira (2), às margens da avenida Antônio Carlos, na região da Pampulha, um ato performático contra a PEC do Teto dos Gastos, uma das prioridades do governo de Michel Temer para equilibrar as contas públicas do governo.
Vestidos de preto e com vendas nos olhos, os manifestantes simularam os efeitos negativos da medida para a população, que terá, segundo o grupo, menos investimentos em saúde, educação e segurança. Também foi feito um abraço coletivo no entorno da universidade. Com cartazes, panfletos e tambores, a comunidade acadêmica alertou a população para o que chama de “retrocesso na saúde, educação e ciência do país”.
Segundo a organizadora do ato, Rosângela Costa, membro do comando de greve dos técnicos-administrativos da UFMG, o movimento quis chamar a atenção das pessoas para o retrocesso que a proposta trará para o país nos próximos 20 anos em que vai vigorar, caso seja aprovada pelo Senado. (AD)
“Queremos chamar a atenção das pessoas para o retrocesso que a PEC 55 vai impor ao país por 20 anos”. Rosângela Costa, servidora da UFMG