Deputados e senadores articulam no Congresso a volta do financiamento empresarial de campanha. A ideia é aproveitar a dificuldade de arrecadação nesta eleição, quando empresas estão oficialmente proibidas de doar a candidatos pela primeira vez desde 1994, para trazer a discussão à tona e tentar aprovar ainda este ano a volta da doação de empresas.
O movimento começou no início da campanha deste ano, em agosto, quando parlamentares perceberam que as doações de pessoas físicas nas eleições municipais foram bem menores do que o esperado. A duas semanas da votação, 28% dos 16.356 políticos que disputam as 5.568 prefeituras do País não arrecadaram nem um centavo sequer.
O levantamento, feito pelo jornal "O Estado de S. Paulo", com base em informações disponíveis no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na quinta-feira (15), mostra que na conta dos demais candidatos entraram, somados, R$ 469 milhões, o que representa uma queda de 61% em relação ao total arrecadado em 2012, faltando as mesmas duas semanas para o primeiro turno (R$ 1,2 bilhão).
Na Câmara, a articulação para debater o financiamento de campanha tem sido feita principalmente por deputados do Centrão - grupo de 13 partidos liderados por PP, PSD, PTB e SD. No Senado, a costura tem apoio do PP, grande parte do PSDB e do PMDB e até de alguns parlamentares do PT.
"O Congresso, após a experiência desta eleição, vai ter que decidir sobre isso. Não dá para tirar o financiamento empresarial sem colocar algo no lugar", disse o líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), favorável à doação de empresas.
Como o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do financiamento de pessoas jurídicas a partidos e candidatos, a estratégia é aprovar a volta da doação empresarial por meio de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). Uma PEC sobre o tema foi aprovada pela Câmara em setembro do ano passado e, desde então, está parada no Senado.
Modelo 'misto'
O texto da proposta prevê que o sistema seria misto, com dinheiro público do Fundo Partidário e horário eleitoral gratuito, mas também doações privadas, de pessoas físicas e empresas. A PEC, porém, estabelece que apenas os partidos possam receber doações empresariais. Os candidatos continuariam só podendo aceitar doações de pessoas físicas.
"Se for PEC, não tem como o Supremo proibir", afirmou o senador Ciro Nogueira (PI), presidente do PP e a favor do financiamento empresarial.
Quando o STF declarou a inconstitucionalidade do financiamento empresarial, em setembro de 2015, a decisão foi tomada sobre um projeto de lei aprovado no Congresso permitindo doações empresariais até o limite de R$ 20 milhões.
Na época, a maioria dos ministros da Corte votou pelo fim desse tipo de financiamento, sob o argumento de que doações empresariais podem favorecer a corrupção. Levantamento do Estadão Dados, de março, mostrou que o grupo de empreiteiras investigadas na Operação Lava Jato foi responsável, em média, pela doação de 40% dos recursos privados arrecadados pelos três principais partidos do País - PT, PMDB e PSDB - entre 2007 e 2013. No período, eles receberam, juntos, ao menos R$ 557 milhões de 21 empreiteiras.
Segundo um dos articuladores do movimento, o líder do governo na Câmara, deputado André Moura (PSC-SE), a reclamação sobre o fim das doações empresariais é "generalizada". "Quem disser que é contra está mentindo. Não tem como fazer política assim", disse.
Outro articulador, o deputado Paulinho da Força (SP), presidente do SD, foi escalado para procurar o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), para tratar da PEC. "O Renan considerou a situação gravíssima. Disse até que estava fugindo de Alagoas, porque não aguentava mais a pressão dos candidatos pedindo dinheiro."
O senador Paulo Rocha (PT-PA) defendeu a discussão do assunto após a eleição. "Há espaço para costurar uma proposta de volta do financiamento empresarial para 2018 e, depois, se pensa em uma reforma mais profunda." Ele afirmou que, embora essa não seja a posição oficial da bancada, há petistas favoráveis à doação de empresas.
Votação por lista fechada
Caso a volta do financiamento empresarial não seja aprovada pelo Congresso, líderes partidários pretendem defender o sistema de votação por lista fechada para eleições proporcionais.
Pelo modelo, os eleitores votam apenas em partidos, que apresentam uma lista de candidatos ordenados crescentemente. O total de vagas de cada legenda será proporcional ao número de votos obtidos. Hoje, a votação é feita por lista aberta: os eleitores votam no candidato.
Para o líder do DEM no Senado, Ronaldo Caiado (GO), o sistema de lista fechada fortalece os partidos e torna a campanha mais barata. "O modelo anterior (empresarial) é tão ruim ou pior do que o atual. Agora os candidatos trabalham com caixa 2, só que o cidadão pensa duas vezes antes de doar. Naquele modelo, era caixa 2 maquiado."
Na avaliação de Caiado, não há espaço para aprovar a volta das doações de empresa diante dos atos corrupção investigados pela operação Lava Jato. "O modelo anterior só produz escândalo e CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito)." Ele disse, porém, que a legislação atual limitou mais as campanhas e favoreceu candidatos mais ricos. "O problema é que oscilamos de um extremo a outro."
Relator da PEC que retoma o financiamento empresarial, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é favorável à doação de pessoas jurídicas, mas não vê espaço para aprovar a proposta agora. "Minha opinião é lista fechada", disse ele, tem conversado sobre reforma eleitoral com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes.
O líder do PMDB no Senado, Eunício Oliveira (CE), defendeu a discussão sobre doação de campanha. Para ele, o financiamento pode ser mantido como é hoje, desde que o sistema de votação seja por meio de lista fechada. O assunto, no entanto, ainda não foi tratado na bancada. "Se vai haver a discussão, não tenho dúvida disso. Vamos ter que arranjar uma solução", afirmou o líder.
Também favorável ao financiamento de empresa com lista fechada, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) disse que o modelo esbarra na necessidade de prever uma forma para garantir a democracia interna nos partidos. "Tem que haver algum mecanismo para evitar que apenas os caciques da sigla sejam indicados na lista."
Reforma
O líder do governo no Senado, Aloysio Nunes (SP), se diz contra discutir financiamento de campanha este ano. Para ele, é preciso focar na PEC que ele relata no Senado que estabelece o fim das coligações em eleições proporcionais e a criação da cláusula de desempenho - norma que exige que uma sigla alcance determinado porcentual de votos para poder ter funcionamento parlamentar. "Não é viável politicamente discutir financiamento agora, porque não há consenso."