Uma aula de física sobre motor de combustão interna, a princípio chata, deu origem nesse sábado (6) a uma audiência pública sobre mobilidade urbana e transporte coletivo que lotou o auditório do Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais (Cefet-MG), no Campus 1, no bairro Nova Suíça, na região Oeste de Belo Horizonte. A discussão partiu dessa tecnologia que move veículos sob rodas nas cidades, mas foi uma lição de cidadania e um “protesto” claro da sociedade civil contra um sistema que estimula o uso intensivo do carro, ao mesmo tempo em que oferece um serviço de ônibus caro e precário. Cálculos simples mostram que um automóvel particular transportando duas pessoas emite cinco vezes mais gás carbônico que um ônibus com 44.
“Por que prevalece esse modelo? Por que nossa cidade não dispõe de diferentes modalidades de transporte coletivo que incentivem as pessoas a deixarem os carros nas garagens? Por que as passagens são tão caras e a maior parte dos ônibus é desconfortável e circula com excesso de passageiros?”. Foram essas perguntas feitas pelo professor Adelson Fernandes Moreira, que provocaram, logo de cara, a mesa de discussão formada por vereadores e representantes da prefeitura, da Empresa de Transportes e Trânsito de Belo Horizonte (BHTrans), do Tarifa Zero e da sociedade acadêmica.
O número de passageiros no transporte coletivo vem caindo ano a ano na capital, ao mesmo tempo em que o preço da passagem aumenta (atualmente R$ 4,05, uma das mais caros entre as capitais do Brasil) e o volume de carros nas ruas também. A gerente de Planejamento de Mobilidade da BHTrans, Elizabeth Gomes, disse que a redução de usuários não tem relação exclusiva com a qualidade do transporte coletivo. “A vontade de ter um carro vai além disso. O uso do automóvel aumentou muito no Brasil todo, foram vários incentivos para isso”, comentou a gerente.
Para reverter esse quadro, ela disse que a BHTrans prioriza as faixas exclusivas para ônibus. “Já temos estudos, mas o problema é que tem que ter recurso para implantar. Estamos esperando, desde a outra administração, recursos do Programa de Aceleração para o Crescimento (PAC). A gente está vendo como resolve isso”, completou Elizabeth.
Elétrico. Ao público de cerca de 300 alunos, ela disse que a BHTrans tem estudo para o uso de ônibus elétrico na capital “em curto prazo”, em parceria com a empresa BYD (Build Your Dreams). O modelo já foi testado na capital em 2016, mas, segundo ela, “houve problemas de potência”. À reportagem, ela disse que a empresa analisa a melhor forma de implantação da tecnologia, mas que ainda não há nada de concreto definido, como linhas e datas.
Outra alternativa é o incentivo ao táxi híbrido, que também utiliza a energia elétrica. “O uso de novas tecnologias, por si só, não vai resolver o problema que é um transporte coletivo de baixa qualidade, pouco acessível, que faz tantas pessoas optarem pelo uso do carro”, concluiu o professor Moreira.
Auditoria. Sobre a auditoria nas contas das empresas de ônibus, a BHTrans informou que está analisando as sugestões feitas na consulta pública e que lançará edital de licitação em breve.
Várias perguntas ficaram sem resposta
A audiência no Cefet-MG começou por volta das 9h e só terminou às 14h, duas horas após o previsto. Depois que a mesa de palestrantes se apresentou, foi dada palavra aos alunos, e não paravam de chegar perguntas. Muitos usuários de ônibus, ao trazer seus problemas pontuais do dia a dia, eram apoiados em conjunto por pessoas com a mesma indignação.
Eles formaram fila para fazer questionamentos. “Por que não integram a tarifa na região metropolitana? Para onde vai o dinheiro do transporte? Por que o contrato de concessão dura 20 anos? Quem de vocês na mesa usa ônibus? Se não, por quê?” As questões foram variadas, já as respostas, pouco objetivas, segundo a plateia.
Os vereadores foram cobrados a fazer uma CPI do transporte coletivo. “É preciso ter uma autocrítica dos órgãos de mobilidade porque ela é trágica. Vivemos uma guerra civil no trânsito”, disse o arquiteto e professor da UFMG, Roberto Andrés.