O tropeiro da Lia, a salada do seu Nozim e o tempero da dona Amélia ganharam um sabor especial ontem. O Museu dos Quilombos e Favelas Urbanos (Muquifu), no beco Santa Inês, foi palco da exposição “Mapa Gastronômico do Morro do Papagaio”, que pretende mostrar à comunidade da região Centro-Sul os seus dotes culinários e divulgá-los para Belo Horizonte, sem tornar a favela um espaço de “turismo exótico”.
“O projeto reconhece os costumes passados de pais para filhos, e evidencia o talento. Afinal, o morro fornece mão de obra para grandes restaurantes”, lembra o morador e membro do programa Polos de Cidadania, da UFMG, Cristiano Pereira da Silva, 30.
Filho de uma baiana com um mineiro do interior, Cristiano cultivou o hábito de plantar temperos. Já Maria da Consolação de Souza, 46, a Lia, é cozinheira profissional. Mas ela gosta mesmo é de cozinhar para os seus. “É mais prazeroso fazer aquilo que as pessoas ao meu redor querem”, confessa ela, que não abre mão de preparar o seu tropeiro e um franguinho com quiabo. “Nós mantivemos os hábitos antigos, porque gostamos do sabor do que fazemos”.
Moradoras do morro e idealizadoras do projeto, Bianca de Sá e Mariana Zande ressaltam que o mapa – feito com recursos do programa Oi Kabum – foi uma forma de registrar o patrimônio cultural da região. “Com o mapa materializamos o imaterial. Pudemos mostrar à comunidade o tamanho da riqueza existente nos quintais e nas cozinhas do morro”, ressalta Mariana.
RETRANCA
Comida pode ser opção de turismo
Enquanto o “Mapa Gastronômico do Morro do Papagaio” guarda as memórias da comida da favela nas paredes do Muquifo, um trator joga outras no chão e começa o processo de reurbanização de cinco vilas do aglomerado. Uma das formas de manter esse patrimônio ativo é pelo turismo, mas o morador Cristiano Pereira da Silva, 30, alerta que o processo será desenvolvido com cuidado.
“Se as pessoas saem, o conhecimento vai embora. (O turismo) seria bom pelo incremento de renda. Mas não podemos fazer do aglomerado um safári urbano”.
A saída, para as organizadoras do mapa, é transformar as memórias em uma exposição itinerante. (LA)
PEÇA
O projeto do Mapa Gastronômico faz parte da Semana Nacional de Museus, e nasceu da intenção das moradoras do Morro do Papagaio, Bianca de Sá e Mariana Zande, de registrar a culinária da comunidade, assim como aconteceu em Heliópolis, favela de São Paulo.