Uma tarde diferente para 65 crianças e adolescentes de abrigos da região metropolitana de Belo Horizonte. Foi o que aconteceu nesta terça-feira (26), no Pampulha Mall, na região da Pampulha, na capital. Elas foram assistir Tarzan, na versão 3 D. A novidade para alguns era o cinema, para outros era justamente descobrir o que é um filme em terceira dimensão. "Me falaram que os personagens ficam perto da gente", disse a empolgada Luísa*, de 7 anos. Luísa, que estava no cinema com a irmã Ana*, 5, conta que já foi ao cinema antes, mas que nunca viu um filme em 3D.
Diferente da algazarra de outras crianças que vieram com os pais assistir outros filmes no shopping, elas estavam comportadas e ao mesmo tempo felizes com a possibilidade rara no dia a dia. "Eu já fui ao cinema, não é a primeira vez. A última não lembro direito. Acho que tem mais ou menos um ano", conta Fernanda*, 13, que sonha um dia ser médica.
Além do filme, as crianças e adolescentes de cinco a sete anos ganharam pipoca e refrigerante, tudo pago com doações, conta a presidente da organização não-governamental (ONG) Instituto Adotar, Mônica Rodrigues, 48. "Algumas pessoas vieram acompanhar as crianças, outras ajudaram financeiramente nos custos que envolvem, o ingresso, refrigerante, pipoca e mais a van. Para trazer as crianças precisamos de quatro vans", diz.
Na tarde desta terça, estavam presentes 40 voluntários. A aposentada Fátima Laranjeira, 61, era uma das pessoas que veio passar parte da tarde com as crianças. "Foi a primeira vez que sai com elas. É um trabalho que recomendo a todos. Afinal, você ocupa o seu tempo servindo. O sorriso delas paga tudo", diz. Ela conta que está participando das ações da ONG há um mês. "Fiquei sabendo do trabalho do Instituto Adotar na Igreja que frequento",conta.
A adolescente Paula*, 17, também faz parte do grupo que foi hoje ao cinema pela primeira vez. "Acho que vai ser maravilhoso", disse antes de começar a sessão. A empolgação ainda infantil contrasta com as preocupações de mãe. Ela conta que tem dois filhos. "Tenho um menino de dois anos e nove meses, que está com uma tia. E também uma menina de um ano e quatro meses que ficou com o pai", diz.
Paula foi parar no abrigo por falta de opção para morar. "A minha mãe não tinha condições de ficar comigo. Estou há três meses no abrigo. Só que não é a primeira vez que vou para lá. Isso acontece desde os meus três anos. Eu ia e voltava até os 11. Aos 12 anos eu fugi do abrigo", relata.
A jovem tem cinco irmãos, um deles tem quase a idade de seus filhos, 1 ano e cinco meses. E a figura paterna é ausente. "Meu pai não está nem aí para mim", reclama.
O sonho de Paula é sair do abrigo. Só que para isso, ela deseja trabalhar para poder sustentar seus filhos. "No momento, estou estudando, terminando o fundamental. Queria trabalhar de auxiliar administrativo", diz.
*O nome das crianças e adolescentes foram alterados para preservar suas identidades
O Instituto Adotar é um centro de apoio a adoção que também atua com atividades internas e externas em abrigos de Belo Horizonte e cidades da região metropolitana. A presidente do instituto, Mônica Rodrigues, conta que o centro de apoio a adoção realiza diversas ações. "Há passeios externos em shoppings, parques, cinemas, além do Dia da Beleza. Também temos parcerias com médicos e dentistas", diz.
Ela conta que no próximo sábado irá contar com lazer, com brinquedos infláveis, como pula-pula. A ONG atua em 51 abrigos da capital, além das cidades de Lagoa Santa, Florestal, Contagem e Sabará. "Fazemos um rodízio", explica.
A ideia, segundo a advogada, é levar mais dignidade e carinho para as crianças e adolescentes de abrigos. Ela conta que começou a entender o que essas crianças sentiam ao frequentar os abrigos e adotar gêmeas, que hoje têm 15 anos. "Essas crianças enfrentam preconceito e descaso da sociedade e do Estado. Depois que adotei minhas filhas, acabei engravidando sete meses após a adoção. Hoje, o menino tem 14 anos", conta. (JG)