A cada mês, várias exposições de artes visuais entram e saem de cartaz em Belo Horizonte, oferecendo ao público da cidade a oportunidade de conhecer incontáveis poéticas artísticas. Ao mesmo tempo, entretanto, um rico conjunto de trabalhos ocupa os espaços públicos da cidade, estabelecendo, em maior ou menor medida, relações com o próprio entorno e com seus frequentadores.
Amilcar de Castro, Mary Vieira, Franz Weissmann, José Pedrosa, Alfredo Ceschiatti, Ricardo Carvão Levy, Jorge dos Anjos e Léo Santana são apenas alguns dos artistas que, a partir de diferentes caminhos, oferecem suas criações a uma convivência irrestrita com moradores e visitantes da cidade.
A arte, seja ela qual for, é uma atividade de criação de um para muitos. E quando isso se concretiza, quando muitas pessoas conseguem o acesso, a convivência e a interação com a arte, conseguimos contribuir para o desenvolvimento e o amadurecimento cultural do país, afirma o artista Rodrigo de Castro, filho de Amilcar e um dos responsáveis pela divulgação da obra do pai.
Criador de trabalhos que habitam, por exemplo, as praças do Papa e da Liberdade, Ricardo Carvão Levy engrossa o mesmo coro. É extremamente gratificante ver que um trabalho está saindo do espaço fechado em direção à cidade, e que ele vai estar ali por muitas décadas, como um testemunho da nossa época. Mais do que isso, é bom saber que um trabalho está aberto à apreciação de qualquer pessoa, independente de classe social ou nível cultural, defende Carvão, que reconhece o limitado alcance dos ambientes institucionais da arte.
Já o artista Jorge dos Anjos, cuja obra é marcada por elementos da cultura africana, enxerga na arte pública a possibilidade de explorar questões como representatividade e identidades culturais.
Penso, por exemplo, em um sujeito negro, que vive na periferia da cidade e, de repente, ao chegar em certo lugar, vê um trabalho que valoriza a sua cultura e as suas raízes, reflete o artista, cujos trabalhos ocupam espaços como a lagoa da Pampulha e a praça de Santa Efigênia.
Desafios.Para além dos desafios inerentes a qualquer processo de criação artística, as obras de arte pública requerem de seus criadores esforços que, muitas vezes, ultrapassam o campo estético.
A instalação de uma obra de arte em um espaço público é uma questão sempre complexa. É preciso que haja uma curadoria cuidadosa, além de um diálogo intenso com o público que, dali em diante, vai conviver com o trabalho, pondera o curador e pesquisador Fernando Pedro da Silva.
Acostumado a criar obras de grandes dimensões, o artista Ricardo Carvão Levy ressalta outros aspectos que devem ser considerados ao longo do desenvolvimento de um trabalho. É preciso pensar na proporção da obra em relação ao espaço que ela vai ocupar, além de tomar cuidados relacionados à aterração do trabalho e à sustentação da sua estrutura. Além disso, ainda é preciso prever e lidar com a possibilidade de vandalismo, enumera.
Fernando Pedro, por sua vez, chama atenção para o papel da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) junto a essas obras. Boa parte dos trabalhos que existem na nossa cidade não é sinalizada adequadamente e não é bem tratada pelo poder público, diz.
Não há, por exemplo, um instrumento específico para a gestão desses trabalhos, o que poderia ser feito por meio de parcerias com empresas de conservação. Se você instala uma obra, você precisa mantê-la, completa.
Estímulo. Na visão do pesquisador, entretanto, algumas questões se impõem antes mesmo da instalação de uma escultura. Seria importante haver iniciativas mais sistematizadas para a implantação de novas obras, como já aconteceu em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Fortaleza, dentre outras. A estrutura da av. Paulista, por exemplo, é algo fantástico, em que o pedestre vai caminhando e se encontrando com trabalhos feitos por inúmeros artistas, exemplifica.O que se tem, atualmente, é o investimento do poder público por meio das leis de incentivo, que realmente deixa as portas abertas para esse tipo de trabalho. Por outro lado, é preciso que a prefeitura (PBH) dê mais atenção às iniciativas voltadas ao espaço urbano e, em alguns casos, torne os processos menos burocráticos, analisa Fernando Pedro.
Rodrigo de Castro, de igual maneira, lamenta a tratamento dispensado pela prefeitura em relação à questão da arte pública. Não vejo um planejamento para a seleção dos artistas e obras, com critérios coerentes de relevância cultural e histórica para a cidade. E com atitudes e medidas sérias e até simples, tudo isso poderia ser realizado, afirma.
O artista Jorge dos Anjos, por sua vez, acredita no surgimento de um novo cenário para a arte pública local. Vemos que a cidade está se desenvolvendo e criando novos espaços de convivência e passagem, como a Linha Verde, por exemplo. É, sem dúvida, um excelente momento para que as políticas relacionadas à instalação de obras de arte pública passem a funcionar melhor, aposta.