Completando um mês à frente da presidência da Rede Minas de Televisão, Jordana Souza Cruz de Almeida aponta os rumos que a emissora deve tomar em sua gestão. Após a saída de seu antecessor, o jornalista Israel do Vale, Jordana assume a emissora em um período de transição, com a criação da Empresa Mineira de Comunicação (EMC), projeto que pretende unificar a Rede Minas e a Rádio Inconfidência em um mesmo espaço físico e sob o mesmo teto jurídico.
Além disso, Jordana, que está há sete anos na emissora, se vê diante de desafios, entre eles a renovação do maquinário e a falta de recursos financeiros e humanos.
Uma questão que a Rede Minas parece carregar historicamente é certa fama de “patinho feio” em relação à hierarquia de importância que ela tem nos quadros dos governos. Isso faz sentido?
Não posso responder pelo governo passado, mas neste projeto de governo, e inclusive o (governador) Fernando Pimentel foi eleito por ele, a questão da comunicação pública, de investir em uma TV pública, foi dos melhores cenários que a Rede Minas poderia ter tido.
No sentido do plano, da pretensão?
Olha só, nós temos uma sede nova, que está acabando de ser construída. Dentro dela, há um investimento do governo liberado para a Rede Minas em torno de R$ 13,5 milhões. Então, estamos em processo de aquisição de equipamentos, porque o que temos estava há 30 anos na TV. Assim, falando da “casca” Rede Minas, o governo investiu e está investindo. Agora, quando você me fala que era uma espécie de ‘patinho feio’, era mesmo.
Propostas que se concretizam na nova sede e na Empresa Mineira de Comunicação, certo?
Eu tiraria a sede nova. Quando a gente pensa em proposta, pensa em conteúdo. Quando se fala na sede, se fala em estrutura. E o que o governo colocou pra dentro é o fortalecimento da comunicação pública. É realmente trazer para a população o real sentido de uma TV pública. E aí você me pergunta: ‘Como ele vai fazer isso?’ Não vai ser de um dia pro outro. Mas como isso será consolidado, com a produção de um melhor produto para a sociedade? Com a criação da Empresa Mineira de Comunicação (EMC).
E o que seria, em linhas gerais, a EMC?
Vamos ter um trabalho de rádio e TV dentro de uma mesma empresa. O que temos em termos de TV no Estado? A fundação (TV Minas Cultural e Educativa), que é o regime jurídico, o direito público. E temos uma rádio que é uma empresa. Por que não colocar isso numa empresa que, ao unir as duas casas, vai levar para a sociedade um produto melhor?
Assim sendo, a fundação permanece ou acaba?
Nós temos a Fundação TV Minas e a Rádio Inconfidência. A fundação tem outorgas que lhe permitem fazer todo esse trabalho de geradora e retransmissora de conteúdos. Quando foi criada a EMC, via projeto de lei do Estado, foi pegando o CNPJ da rádio, que já era uma empresa e alterou o nome. Assim, ela se tornou a EMC. A fundação, não posso extinguir, porque são dela as outorgas, que são os alicerces que a sustentam. Eu teria que transferir para a EMC, ou seja, conceder à empresa o trabalho da fundação. A Fundação TV Minas só vai ser extinta na forma do direito quando todos os processos forem protocolizados frente ao Ministério das Comunicações e com a autorização do presidente da República.
O caminho, então, é esse, tudo se transformar em uma empresa única?
Sim, e enquanto isso a EMC existe por causa da rádio. Sendo “grosseira”: a EMC produz rádio, e a fundação vai produzir TV dentro do guarda-chuva da EMC.
Pensando assim, fica uma questão no ar: a EMC já tem um presidente (o músico Flávio Henrique de Oliveira), o mesmo da Rádio Inconfidência. Existe uma tendência, então, de ele assumir os dois lugares, a presidência da TV e a da rádio? Como fica seu futuro?
Meu futuro só ao governador pertence, sobre isso é melhor falar com o Pimentel. Sobre o Flávio, é melhor falar com o Flávio. Ele é o presidente da rádio, consequentemente, da EMC. O projeto do governo, a questão pró forma, é ser a integração entre rádio e TV, até mesmo porque vamos para um espaço único, não tem sentido a rádio disparar para um lado e a TV para outro. Como estamos no mesmo guarda-chuva, a proposta do governo é ter um presidente da EMC. E a gente teria uma presidência mais executiva da Rede Minas, que vai pegar as diretrizes do que pode ser feito e vai fazer.
Que é seu papel hoje?
O mesmo que eu fazia como diretora executiva, e muito bem-feito, graças a Deus. A tendência é o Flávio, como presidente da EMC, ser o cara com mais conteúdo, formado em comunicação, e eu fazer a parte executiva na fundação, o “braço” Rede Minas. A Rede Minas continua, com seus diretores, servidores, programação. O projeto é esse, temos dois anos a partir dessa transição – até o fim do mandato.
É uma meta do governo?
Vou ser bem “grossa” agora num sentido positivo. É uma meta voltar com a Rede Minas para os eixos, porque estava fora dos eixos. Totalmente sem gestão, literalmente um Franken-stein…
Por favor, me descreva isso melhor?
Exemplificando: quando falamos em falta de gestão, é a questão de não saber delegar, e, sim, centralizar. É, de fato, não conseguir colocar o que você tem de projeto na tela do espectador. Quando falo em Frankenstein é um pouco assim: todo mundo vê o braço, mas não está vendo a cabeça, o outro braço, uma coisa meio perdida. Os próprios servidores da TV, nesses dois anos iniciais, não tinham conhecimento de projeto de gestão. Então, você estava lá embaixo produzindo alguma coisa e não sabia o que a gestão estava querendo com aquilo, o propósito não ficou claro. Se uma coisa não é clara para você, você vai querer participar, ser um braço na construção desse projeto? Lógico que não. As pessoas não te procuram, não integram. É uma gestão que deixou os servidores perdidos.
Entrevista
“O foco é ‘abrir’ a casa”
Presidente da Rede Minas explica quais os rumos que a emissora pretende tomar de agora em diante
FOTO: Reprodução / Street View |
Rede Minas. Emissora passa por momento de transição com a mudança da presidência, há um mês |
Jordana, qual você acredita ser o lugar da Rede Minas?
O topo.
O que seria esse topo?
Ela tem que continuar conquistando seu espaço na comunicação pública. E ela vem mais incisivamente agora, com essa abertura para os movimentos sociais. Eu acredito que ela está próxima de ser a TV pública em rede nacional.
Este é um dilema clássico da TV pública: ser uma TV pública e não ser uma TV estatal. Como lidar com isso?
Acho que isso é simples: o arroz e o feijão são a comida básica de todo mundo, não é? E eu sinto essa leitura dos próprios funcionários da casa. Isso não estava sendo feito. Como vou desmistificar essa questão, “ah, a Rede Minas virou estatal”. É lógico que não é isso. A gente sabe que não é verdade. A questão é abrir a casa para a sociedade, para os movimentos.
Mas isso já estava visível na gestão anterior essa tentativa, com programas como “Mulhere-se” e “Sou 60”, não?
São programas e projetos muito bons. Não penso em acabar com eles. Mas temos o dever agora de aprimorar, de fazer um programa mais estruturado, tentar mais parcerias. Esses são programas de interesse público. O “Sou 60” tem a pauta da melhor idade, e vou acabar com isso? Como terminar um programa que tem uma pauta feminista e está realmente quebrando paradigmas, abordando a questão de gêneros. Como não fortalecer isso com uma mulher na presidência da Rede Minas? O que vou tentar fazer aqui é o que falei desde o início: colocar a Rede Minas no topo mesmo. De que forma? Com um conteúdo jornalístico mais justo, contribuindo e olhando as duas partes, não indo só de um lado, sendo equilibrado. Colocar mais programas dentro das condições que temos. Não adianta pensar numa coisa que só vou conseguir executar daqui a quatro anos… E o hoje? Vou continuar com reprises, exibindo programas da TV Brasil, da TV Cultura? Não, quero inverter isso, quero a Rede Minas no cenário nacional. Não quero usar a Rede Minas como meio de circulação da TV Cultura e da TV Brasil.
Uma busca por independência...
É para isso que eu trabalho aqui.
Talvez possamos pensar que cada gestão quer deixar uma marca. Algum plano nesse sentido?
A primeira coisa que pensei quando entrei é que queria muito trazer uma alma – estou sendo repetitiva, mas é porque gosto da questão humanística. Vi que não ia conseguir trabalhar sozinha, quis trazer os servidores e fazer com que eles voltassem a acreditar no potencial que a TV poderia ter. E eles estão vindo de novo, querendo fazer parte desse projeto. Isso é um ponto. E segundo, temos, sim, alguns planos para a TV, fortalecer e melhorar o que já temos, porque foram 30 anos de muita luta, e acho que tem de colocar para funcionar, valorizar. Não ficar parado. Estamos com uma grande expectativa, temos um projeto voltado para a juventude, uma ideia bem legal em relação a um programa. Acho que tem uma falha grande, por esse lado. Conquistamos as mulheres, a faixa acima dos 60, e falta agora uma proximidade com os jovens. É um embrião que vamos conseguir colocar em pauta.
Existe a possibilidade de um novo concurso?
Nenhuma. Existe a lei de responsabilidade fiscal, e ainda estamos atrelados a ela, devido aos gastos. Enquanto estivermos assim, uma das proibições é a de não fazer o concurso. Mas aí te falo: tenho uma expectativa ótima, do próprio governo, para agora. E aí tenho que investir nas pessoas.
Sob as condições que existem hoje?
Sim, é o que tem, é que sempre teve: não é um bicho de sete cabeças, não. E o pessoal já está acostumado a isso, tem sangue nos olhos.