Ser o único sobrevivente de um desastre aéreo pode ser comparado a nascer de novo, como costumam dizer aqueles que saem com vida de algum evento traumático. Para Mauro Menezes, personagem vivido pelo ator Wellington Braga no filme “Sobrevida”, que estreia nesta quinta-feira (26) e tem única exibição no MIS Cine Santa Tereza, tal condição torna-se também uma espécie de oportunidade para reinventar-se.
Dirigida pelo cineasta, jornalista e escritor mineiro João Lobato, a ficção centra-se na virada pessoal do protagonista, que passa a expressar-se de maneira completamente diferente após o acidente. Ele deixa o passado como anônimo ao começar a circular pelos programas de TV, vendendo a imagem de guru com um discurso de autoajuda, baseado na sua experiência, que é frisada como fruto de um milagre.
“Ele se submete a uma transformação. De alguém que tem uma vida pacata, tranquila e até mesmo frustrada, ele passa a usufruir de maior visibilidade. Isso acontece, principalmente, depois de conhecer um publicitário que o influencia a ver uma oportunidade nessa situação. Mauro gosta do que ouve, mas isso requer dele uma profunda mudança”, afirma Braga.
Se antes tinha dificuldade em falar em público, Mauro desenvolve uma eloquência admirável. Este, contudo, é apenas um dos traços da persona que assume em um processo com altos custos emocionais.
“Ele segue por um caminho que parece ser irreversível, porque ele teve que se desconstruir para tornar-se essa figura que criou para ele mesmo”, diz Braga. “As pessoas perguntam para ele como é sobreviver a tamanha fatalidade e ele demonstra uma visão sempre positiva, mas, em alguns momentos, ele preferiria não ter sobrevivido. Então, isso acaba tornando-se um peso para ele”, completa Braga.
Lobato reforça que o mote do filme é justamente explorar essa dimensão psicológica em torno do personagem. Para ele, a narrativa também traz à tona outras questões, como a disputa pela verdade. “Esse é um tema que está muito na moda, principalmente a partir do impacto das fake news. No filme, é lançada a pergunta sobre o que é verdade individual ou coletiva, e como, às vezes, é possível manipular a verdade. É um filme mais psicológico e menos de ação”, observa o diretor.
Independente. Toda a produção foi rodada em Belo Horizonte, entre 2014 e 2015, com orçamento baixíssimo. E para concluir o projeto, que não conseguiu alcançar mais do que 20% dos recursos iniciais previstos, Lobato conta ter buscado vários parceiros, entre eles o Centro de Estudos Cinematográficos de Minas Gerais, responsável por mediar a exibição do trabalho no MIS Cine Santa Tereza.
“Outros ajudaram com a locação, com o empréstimo de limusine, entre outros. Nós conseguimos filmar dentro do avião por meio de parceria e também contamos com uma agência de modelos que nos concedeu mais de cem figurantes. Ninguém da equipe recebeu, e as pessoas se envolveram com o projeto de forma voluntária. Mas, se tivermos algum rendimento com o filme, tudo será dividido”, relata Lobato.
Com roteiro também assinado por ele, o cineasta diz que essa história surgiu durante um voo “tenebroso” em Myanmar, onde residiu entre 2012 e 2016. “Ali, dentro do avião, eu fiquei pensando o que aconteceria se uma pessoa sobrevivesse a um desastre aéreo. Então, eu comecei a escrever o roteiro no aeroporto mesmo. Depois, cheguei a cogitar a inscrição do projeto na Lei Rouanet, mas captar é sempre uma batalha. Então, acabei conseguindo tocar tudo isso a partir da contribuição de diversas pessoas”, afirma Lobato.
“Sobrevida” já circulou por alguns festivais internacionais, como o Global Golden Frames Film Fest, o Caribbean Film Festival & Market e o Youth Arlington International Film Festival. Além deste média, Lobato dirigiu também o curta-metragem “Doutrinação” (2005) e o documentário “Made in Myanmar”, finalizado recentemente. Após o lançamento, nesta quinta-feira, “Sobrevida” vai estar disponível no Vimeo e YouTube.
Agenda
O quê. Estreia de “Sobrevida”
Quando. Quinta (26), às 18h
Onde. MIS Cine Santa Tereza (rua Estrela do Sul, 89, Santa Tereza)
Quanto. Entrada gratuita