"Palavras gentis são favos de mel: doçura para a alma e saúde para o corpo”. Já no “Antigo Testamento”, o povo hebreu deixou registrado no livro de “Provérbios” o fascínio que o principal produto das abelhas sempre exerceu sobre o homem. Seja na “Bíblia” ou em outros registros históricos, o mel é quase sempre relacionado a prazer, amor e riqueza. E o versículo que inicia este texto também indica que há milênios já se sabia que, mais do que sabor, o mel também tem boas propriedades nutricionais.
Consumido largamente em todo o mundo, o mel é versátil: vai bem desde o café da manhã, ingerido puro (ou com iogurte, em uma das combinações mais usadas), até em refeições – e não só em pratos doces. Acompanha bem saladas – em variações de molhos, por exemplo, com mostarda ou shoyu –, combina com peixes e carnes que pedem sabores adocicados, como costela suína e magret de pato – entre tantas outras receitas, como provam as criativas misturas encontradas em restaurantes de Belo Horizonte.
Comandada pelo chef Caetano Sobrinho, A Favorita tem entre seus pratos mais icônicos o salmão ao mel e soja, servido com shiitake e arroz selvagem. A receita está na carta desde a abertura da casa, antes mesmo de o chef chegar, e nela ninguém mexe.
“Vários dos meus clientes mais fiéis vêm aqui só para comer esse prato. Acho que faz tanto sucesso porque tem um toque oriental e os sabores são bem equilibrados. O mel dá uma graça ao salmão, sai do comum”, afirma Caetano, que usa na receita um mel tradicional, mas de boa procedência – neste caso, o município de Santa Bárbara, um dos maiores produtores de Minas. (O restaurante A Favorita sofreu um incêndio, no último domingo, e está temporariamente fechado para reformas).
Gourmets. Como acontece com tantos ingredientes naturais, os meles também já ganharam sua versão gourmet – inspirados nos vinhos, são chamados de “grand crus” pela Mel Mandala, da cidade mineira de Pouso Alto. Essas variedades especiais são produzidas a partir de um único tipo de florada – há opções como o mel feito a partir das flores de café, marmelo e cipó-uva, por exemplo.
Pouco usual no Brasil, a prática de produzir mel com apenas um tipo de flor é bem comum na Itália, como explica o napolitano Domenico Cardamuro. Por lá, segundo ele, são muitas opções disponíveis no mercado, ao gosto de quem vai experimentar, seja puro ou incorporado a algum prato.
Entre tantas opções, porém, ele prefere o millefiore, feito de várias espécies de flores, mas com uma particularidade: importado da região de Alba, o mel tem na composição o aroma das famosas trufas italianas. Ele afirma que a combinação das notas aromáticas do cogumelo típico da região com a doçura do mel é um clássico absoluto na gastronomia da Itália. “O mel é uma das cinco formas mais tradicionais de consumir a trufa, ao lado do ovo, do risoto parmegiano, da polenta e do talharim na manteiga”, diz ele.
À frente da casa que leva seu nome, Domenico serve essa mistura no risoto Alba, que além do mel e da trufa, ainda tem como trunfo na receita queijos como parmesão e brie. Para finalizar, sementes de gergelim. “Por ser uma coisa muito italiana, tinha usado o mel trufado em uma pizza, e a sugestão de transformá-la em um risoto foi de um cliente. Depois que preparei pela primeira vez, fiquei me perguntando por que não tinha pensado nisso antes. Hoje, é um dos pratos que mais saem no restaurante”, afirma.
A iguaria é estrela ainda de outra receita da Domenico, o semifredo de mel e macadâmia. Feita artesanalmente na casa, a sobremesa tem sabor suave, que alia o dulçor do mel à crocância da castanha.
No Jack’s Burger & Grill, o mel também aparece como sobremesa. Daniela Campolino, uma das sócias, criou o bolo de mel, que na casa foi batizado de Sarah Candy. “É uma versão bem mais fofinha e aerada que o “massudinho” pão de mel. Tem feito um grande sucesso. Um dos diferenciais é que uso produtos verdadeiros, e não essência artificial. Para o bolo, o mel é temperado com cravo, canela e açúcar mascavo orgânico, e a cobertura é de chocolate belga”, afirma ela.
O bolo é oferecido com duas harmonizações: uma, com doce de leite, sorvete de cappuccino e pinceladas de ganache de chocolate, e outra, com sorvete de frutas vermelhas e de calda de morango.
Histórico. Não é de hoje que o mel faz sucesso à mesa. Há registros pré-históricos que garantem que nossos ancestrais já conheciam seu doce sabor há pelo menos 5.000 anos. Desde então, ao longo da história ele acompanhou civilizações como os egípcios, gregos, romanos. O grande filósofo grego Aristóteles foi um dos primeiros a registrar que a iguaria poderia ser usada também para fins terapêuticos.
Mas, por mais que o mel tenha propriedades cicatrizantes e bactericidas, segundo a nutricionista Scheherazade Paes de Abreu, é melhor não abusar. “O mel também é um tipo de açúcar, e, pela alta densidade energética, sua ingestão não pode ser excessiva”, diz ela.