Não é exagero dizer que “o futuro é agora”. A ciência atual já pôs em prática muitas ideias antes pensadas pelos melhores autores de ficção científica. O ser humano já programa microrganismos para que eles fabriquem produtos de nosso interesse; criou um pedaço de cérebro virtual; e a primeira colônia de terráqueos em Marte está vindo aí. Para completar, a criopreservação – especialidade que conserva células e tecidos vivos em baixíssimas temperaturas – caminha a passos largos. O futuro só não chegou ainda para quem decide criopreservar corpos inteiros.
Nos Estados Unidos, cerca de 270 cadáveres estão em tanques de nitrogênio líquido, a uma temperatura de -196ºC, esperando o dia em que a ciência conseguirá trazê-los de volta.
O procedimento para congelar um corpo é relativamente simples: logo após a morte, todo o sangue é drenado do cadáver. No lugar dele, entra um líquido de criopreservação que, teoricamente, irá proteger as células e impedir que elas estourem durante o processo de congelamento. Então, o corpo é submetido à temperatura negativa e, pronto, pode ficar lá por toda a eternidade. Esse processo, capaz de congelar tecidos orgânicos em uma fração de segundo, é chamado de “vitrificação” .
O problema todo está no descongelamento, pois vários obstáculos de natureza tanto ética quanto técnica impedem a eficiência dessa parte do processo. A dificuldade está antes mesmo de o congelamento começar. “Para o procedimento ter chance de funcionar, o indivíduo tem que ser congelado ainda vivo. Não adianta pegar uma pessoa que já morreu, cujo sangue já coagulou todinho, e querer congelar”, explica o médico Carlos Alexandre Ayoub, CEO do Centro de Criogenia Brasil (CCB), clínica especializada nessa técnica.
No entanto, a legislação dos Estados Unidos, único país do mundo que realiza o congelamento de corpos, só permite que o procedimento de criopreservação seja iniciado depois de declarado o óbito. Aí é tarde, pois o sangue começa a coagular cerca de dez minutos depois que o coração para de bater, e as células cerebrais começam a morrer antes disso, com cinco minutos sem oxigenação.
“Mesmo se você conseguir, futuramente, trazer essa pessoa de volta à vida, ela será um vegetal”, constata Ayoub.
Ainda assim, em outubro de 2015, um casal tailandês apostou no congelamento do cérebro de sua filha de 2 anos logo após a morte da menina, que possuía um tipo raro de câncer. Com isso, eles esperam conseguir que, no futuro, a ciência encontre um jeito de curar o câncer, descongelar com eficiência o cérebro e fazê-lo viver normalmente em outro corpo.
Outro problema está na técnica em si de congelamento de um corpo inteiro. Como cada tipo de célula exige um criopreservante diferente e um cuidado específico, a ciência ainda não desenvolveu uma metodologia que seja válida para todo o organismo – que é formado, em média, por 100 trilhões de células. “Ainda não conseguimos fazer um processamento célula por célula em um indivíduo para que o congelamento seja viável”, diz o médico.
No fim de agosto de 2014, o corpo de Hal Finney, criador da moeda virtual Bitcoin, também foi criopreservado. Ele era portador de Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) e apostou que, no futuro, haverá um tratamento mais eficaz para a doença. A cura para a ELA já está mais próxima, agora que os pesquisadores da ALS Association descobriram a proteína TDP-43, que, em determinadas circunstâncias, está ligada à morte de células no cérebro e na medula espinhal dos pacientes. Agora, “só” falta o restante do processo para fazer Finney voltar à vida.
A vida imita a arte – pioneirismo em criopreservação é mérito no cinema
FOTO: Fox Filmes / Divulgacao |
“Star Wars”. No episódio V da saga, “O Império Contra-Ataca”, o personagem Han Solo é congelado vivo em carbonita
FOTO: Paramount Pictures / Divulgacao |
“Star Trek”. Em “Além da Escuridão”, o personagem Khan (esq.) é descongelado após passar 300 anos criopreservado
FOTO: Warner Bros / Divulgacao |
“Eternamente Jovem”.O personagem de Mel Gibson se congela, esperando a cura para uma doença