LGBT

Invisibilidade e abandono na velhice LGBT

Especialistas e militantes mobilizam-se para criar ações na busca de superar a lacuna da falta de políticas públicas


Publicado em 26 de março de 2017 | 03:00
 
 
 
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Cuidadores de idosos homofóbicos, asilos que não oferecem assistência e políticas públicas deficientes para os homossexuais idosos. Há pelo menos duas gestões, o militante gay e fundador da ONG Libertos Comunicação, Saúde e Cidadania, Osmar Resende, bate à porta da Prefeitura de Belo Horizonte para apresentar seu projeto. Sua luta é para que a cidade ofereça abrigos específicos para idosos LGBTs, como os que já existem em países como Alemanha, Espanha, Portugal, Suécia e Holanda. O documento também será apresentado à nova administração, garantiu Resende.

Ele, que se identifica como homossexual desde jovem, diz que vem percebendo que a luta de toda uma geração dedicada à garantia dos direitos LGBTs – e que a atual juventude está usufruindo – é esquecida quando o idoso entra em uma casa de repouso. “Teve um caso de uma travesti de 70 anos, em Porto Alegre (RS), que, ao procurar um asilo, foi enxotada a pontapés e chamada de ‘aberração’”, conta.

Indicado para representar os homossexuais na II Conferência Nacional dos Idosos, em Brasília, Resende lembra que, ao falar que os idosos LGBTs precisavam de profissionais capacitados de forma diferenciada, ouviu da presidente da mesa que “idoso é tudo igual”. Dois anos depois, ele visitou durante um mês uma instituição nos Estados Unidos que oferece serviços específicos ao público LGBT da terceira idade e constatou outra forma de atenção. “Eles estão séculos à frente”, diz.

Assim que voltou para Belo Horizonte, Resende chegou a oferecer para um curso de cuidador de idosos, uma espécie de capacitação sobre o universo homoafetivo. “Eles não se interessaram, não quiseram nem saber”, lamenta.

Outras ações. Neste mês, a psicanalista Dorli Kamkhagi começou a realizar encontros psicoterapêuticos para trabalhar questões da maturidade em pacientes homossexuais com idade acima de 50 anos. O atendimento será feito em grupos de dez pessoas, uma vez por semana, até novembro, no Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (IPQ-FMUSP).

“Muitos foram casados, mas não aguentaram e tiveram que romper. A proposta é ampliar esse conhecimento e trazer à luz um lugar de acolhimento psicológico e emocional para que as pessoas possam seguir mais tranquilas e confiantes e que legitimem seus desejos sem se sentirem culpadas e perseguidas pelo mundo, pela sociedade e pela família ou sem ter que ‘voltar para o armário’”, diz.

O deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) também apresentou o Projeto de Lei 7.524/2014, que busca alterar o Estatuto do Idoso para garantir a eles a dignidade plena.

Treinamento. Conforme pesquisa da ONG inglesa Stonewall em 2012, há um duplo sofrimento de abandono e preconceito entre os idosos LGBTs em asilos e em postos de atendimento médico. Os resultados indicam que a maioria dos profissionais não tem treinamento necessário para lidar com a diversidade. Há relatos de homossexuais que, após contarem a seus companheiros de casa sobre sua sexualidade, tiveram de ser colocados em outras alas, pois começaram a sofrer discriminação. Para evitar essa situação, outros tantos silenciam sua condição.

Assim, outra pesquisa feita na Inglaterra pela YouGov revelou que a maioria dos e das homossexuais e bissexuais envelhecem solteiros e sós.

Psicóloga especialista em gerontologia e membro da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG) Valmari Cristina Aranha diz que o problema é ainda maior entre as travestis. “Em alguns casos, são obrigadas a se vestirem como homens novamente, há também o problema de qual banheiro usar”, conta.

Aranha teme ainda que instituições específicas segreguem o público LGBT do resto da sociedade, mas reconhece que o preconceito muitas vezes começa dentro da família, que, quando o idoso se assume, acha que ele “esclerosou”. “As pessoas precisam aprender a lidar com a sexualidade do idoso nas suas diferentes formas, seja homo, hétero, bi, poli”, afirma.


Aplicativos e sites ajudam na paquera

A terceira idade ainda representa uma pequena parcela na internet – são apenas 8,1% dos 46 milhões de usuários. Porém, mais de 12% das pessoas com mais de 50 anos procuram por amor pela internet, segundo a pesquisa NetView, da Nielsen Ibope, de 2014.

O idealizador do Coroa Metade, site de relacionamento para pessoas com mais de 40 anos, Airton Gontow, conta que hoje a página tem entre 3% e 4% de homossexuais entre 200 mil usuários. “Estou construindo um novo site para o início de 2018 totalmente voltado para o público LGBT, ainda mais diferenciado, elegante e bonito”, adianta.

Outros aplicativos que podem facilitar o encontro são, Scruff, Hinge, Grindr e Hornet. (LM)


Ensaio gay apresenta homens ao longo de suas gerações

FOTO: Matthew Morrocco/Divulgação
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O fotógrafo norte-americano Matthew Morrocco fez registros de homens homossexuais ao longo de suas gerações. Em entrevista para publicação “Out Magazine”, Morrocco contou que encontra seus modelos em aplicativos de paquera gay, como Grindr e Scruff. Segundo ele, ao fotografar homens mais velhos para o ensaio, ele consegue transmitir a mensagem de empatia com relação às gerações mais velhas.

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